quarta-feira, 24 de setembro de 2025

Onde ancorar o nosso olhar?




Onde ancorar o nosso olhar?

Para todos aqueles que se encontram numa situação difícil: a morte de um familiar ou amigo; a dura luta contra uma doença oncológica... A vida não é fácil.

Com o passar dos anos tomamos consciência que a experiência da vida não é simples nem leve. Tal como os israelitas no livro dos Números. (Nm 21, 4b-9)

E isto vale para todos. Certamente, existem situações extremas. Gente que vive na primeira pessoa a doença, a guerra, a fome ou os desastres naturais. Mas mesmo para os poupados a tais desastres, as dificuldades da vida apresentam-se em toda a sua complexidade.

Por mais que nos sintamos financeiramente seguros, sabemos que o dinheiro não é tudo e, acima de tudo, não garante a serenidade e o verdadeiro bem-estar. Em última análise, todos nos vemos a ter de lidar com o fim da nossa existência, e ter ou não dinheiro resume-se a muito pouco.

Da dureza da vida, da qual ninguém está isento, emerge precisamente a fragilidade desta, onde simplesmente ter alimento não chega, onde, tal como as serpentes no deserto, tudo nos traz insegurança, vulnerabilidade e sofrimento. Para enfrentar os perigos do deserto, Moisés, a mando de Deus, constrói uma serpente de bronze e pendura-a num poste: olhar para esta serpente significa estar salvo das suas mordeduras.

É o sinal que Deus envia para que o povo cansado possa reaprender a confiar, a acreditar no Seu amor. E é interessante que Deus não elimina as serpentes, que continuam a morder o povo. Mas oferece um antídoto mais forte do que o veneno, com o poder de curar. O mal permanece, mas não conduz necessariamente à morte.

Paradoxalmente, o povo não deve lutar contra as serpentes, não deve tentar eliminá-las. Nunca o conseguirá, porque sozinhos não conseguimos derrotar o mal.

Jesus reinterpreta este sinal a partir daquele que será o seu destino enquanto homem crucificado: «E, assim como Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o Filho do Homem seja levantado, para que todo aquele que nele crê tenha a vida eterna.» (Jo 3, 14-15)

A sua vida e morte são como a serpente levantada, visível por todos, e quem olha para ela vê algo que o pode curar. Na cruz vemos o amor do Pai por cada um de nós: «Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigénito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna.» (Jo 3, 16).

O mal não desapareceu. Existe, e é um mal que gera a morte, um mal que procura perturbar o caminho para a liberdade, para a terra prometida, para a vida eterna. O mal que é, em última análise, falta de confiança, falta de amor.

Aqueles que levantam os olhos e contemplam o Senhor pendurado na cruz já não podem acreditar que Deus não os ama. A cruz é o antídoto que nos pode salvar. Só a cruz o pode fazer.

Caros amigos que sofreis, a fé, em última análise, é precisamente isto: crer, ser capaz de se abrir a uma dimensão que, embora não tire a dor e o sofrimento, atravessa-o, rasga-o e permite-nos apreender aquele vislumbre de luz que não conhece a morte e ancora o olhar naquele para além.



Resumindo: será verdade que a morte é o limite intransponível da vida, o fim de tudo? Se sim, então é bom olhar para baixo, cauteloso com as cobras que nos enredam os pés na esperança de que a sua mordedura nos apanhe o mais tarde possível. Se não, certamente tentaremos sempre evitar as cobras, mas acima de tudo, tentaremos manter o nosso olhar fixo nesta luz, permitindo que as nossas vidas se encham daquela esperança que dá sentido ao nosso fatigado viver.

Coragem!

Rezemos uns pelos outros.



Paulo Victória


terça-feira, 23 de setembro de 2025

Abrigo







Alguém que é abrigo.


Que não precisa de fazer grande ruído ou de muitas palavras.

Alguém que está, de verdade. E isso chega.

Que está nos dias bons e nos outros também. Quando o mundo é pesado, quando a alma se encolhe ou quando o coração aperta.


Alguém que é abraço.

Que se faz lugar seguro. Refúgio onde podes serenar, respirar, ser.

Que ampara todas as tuas dores, todos os teus anseios, todos os teus silêncios.

Que encosta a sua alma à tua só para te recordar que, mesmo nas noites mais escuras, ainda há estrelas a brilhar.

Com a ternura de quem sabe que ainda há abraços que salvam.


Alguém que é presença, companhia.

Que não se impõe, mas que se faz sempre sentir.

Como uma manta nos dias frios e uma chávena quentinha entre as mãos trémulas.

Que não promete resolver-te a vida, mas que permanece ao teu lado enquanto a vida acontece.

Como quem não deixa apagar a chama da esperança que te diz que vai correr tudo bem.


Alguém que te aparece nas pequenas coisas: numa mensagem que chega no momento certo, num abraço para ti, numa mão que te conforta, num olhar que te compreende sem perguntar, num sorriso do coração.

Que fica, mesmo quando o mundo tem pressa. Que espera, mesmo quando o tempo demora. Que acredita, mesmo quando tu duvidas.


Alguém que é mais do que sorte.

Que te segreda ao coração, com a delicadeza dos gestos que dispensam as palavras, a declaração de amor mais bonita: que, aconteça o que acontecer, vai estar sempre perto de ti.


A alguém assim: que saibas sempre agradecer.

Alguém assim: que nunca te falte. E que saibas sempre sê-lo para alguém, também.



Daniela Barreira


segunda-feira, 22 de setembro de 2025

«…que os homens rezem…»



Faz da Tua Vida uma constante oração


Quando tudo o que conhecemos não chega

e sentimos que a humanidade nos está a asfixiar…

O único caminho a seguir é a escuta da Tua Palavra, Senhor!


Quando até vendemos a nossa Alma,

ao escolhermos mais uma caminhada e dizemos “Não!” ao Teu saboroso Pão…

A única salvação é ansiar o Teu infinito Perdão, Senhor!


Quando gastamos o nosso tempo a debater futilidades

e a fazer da vida de um irmão um motivo de chacota…

A única redenção é colocar o joelho no chão perante o irmão,

porque Tu vives Nele, Senhor!


Quando os olhos servem para julgar

e nos afastam dos cenários de pobreza, injustiça e até violência extrema…

A única forma de vida é dar a Vida para Te servir, Senhor!


Quando vivemos na bolha de um paraíso, onde nada nos falta,

mas quem vive ao nosso lado é atormentado pela solidão e pela amargura…

O único sentido para a Vida é ser fiel ao Teu projeto de Amor, Senhor!


E… quando nos faltarem as forças e a determinação,

para levarmos Jesus a Todos e Todos a Jesus,

neste mundo vazio onde reina o dinheiro e o ter,

rezemos como Peregrinos de Esperança:


Louvamos-Te, Senhor, porque levantas os fracos e exaltas os humildes.



Liliana Dinis,

domingo, 21 de setembro de 2025

S. Mateus, apóstolo e evangelista

 

Um pecador que encontra Jesus   



Levi organizou um grande banquete para Jesus, que aceitou e participou com seus discípulos. Este gesto causou escândalo entre os Escrivas e Fariseus, porque participaram da festa também publicanos e pecadores. A resposta de Jesus impressionou Mateus. “Os sãos não precisam de médico, mas, sim, os doentes”, disse o Nazareno, acrescentando: “Eu não vim para chamar os justos, mas os pecadores”.

Mateus, que era pecador, deixou tudo e seguiu a Jesus, tornando-se um dos Doze. Seu nome, algumas vezes, foi citado nos Atos dos Apóstolos. O anúncio de Cristo foi a sua missão.

Segundo algumas fontes, Mateus teria morrido por causas naturais; no entanto, segundo algumas tradições, consideradas pouco críveis, a sua existência terminou na Etiópia.

Na descrição dos quatro seres do Apocalipse – águia, boi, leão, homem – São Mateus é associado àquele com aspecto de homem.

As suas relíquias encontram-se na cripta da Catedral de Salerno. Ali o Santo é festejado, em 21 de setembro, com uma solene procissão.

Autor do primeiro Evangelho, destinado aos Judeus

Mateus é autor do primeiro Evangelho, escrito não em grego, mas, quase que certamente, em aramaico. Os destinatários do Evangelho de Mateus são os cristãos de origem judaica: no texto ele coloca em realce o fato de que Jesus é o Messias, que cumpre as promessas do Antigo Testamento.

De Mateus ao Papa Francisco, através de Caravaggio

A figura do evangelista é muito requisitada pela iconografia. A famosa obra da “Vocação de São Mateus”, pintada por Caravaggio, entre 1599 e 1600, encontra-se na igreja de São Luís dos Franceses, em Roma. Trata-se de uma pintura sugestiva, na qual a luz tem um papel fundamental: como símbolo da graça, ela não provém da janela, mas de Jesus. É uma cena que atrai, sobretudo, pela sua ação dramática: o dedo de Jesus aponta para Mateus; ele, por sua vez, aponta para si mesmo, como que pedindo confirmação da sua chamada. A vocação de São Mateus e a pintura de Caravaggio marcaram a vida do Papa Francisco, que fala, sobre si mesmo, em uma entrevista ao Padre Antônio Spadaro, publicada na revista “La Civiltà Cattolica”; o Papa se autodefine “um pecador, ao qual o Senhor dirigiu o seu olhar”.

Vaticano

O Valor do Dinheiro

 



Que valores devem servir de base ao nosso projeto de vida? Que escolhas devemos fazer para que a nossa vida não seja desperdiçada? A liturgia deste vigésimo quinto domingo comum convida-nos a refletir sobre estas questões… Avisa-nos, logo à partida, que não pode ser o dinheiro a comandar a nossa vida; sugere-nos, em contrapartida, que escolhamos os valores duradouros e eternos, os valores do Reino, os valores de Deus.

A primeira leitura traz-nos a palavra de Amós, o profeta da justiça social. Dirigindo-se aos comerciantes sem escrúpulos, apostados em “espezinhar os pobres” e em “eliminar os humildes da terra”, Amós avisa: “Deus não esquecerá nenhuma das vossas obras”. A injustiça, a exploração dos pobres, a humilhação dos mais fracos, a subversão da verdade, a escravização dos irmãos, são a subversão completa do projeto que Deus tem para o mundo e para os homens. Os que escolhem esses caminhos, terão que dar contas a Deus das opções que fizeram.Amós diz uma coisa inquietante: “Deus nunca esquecerá” as obras daqueles que, dominados pela ganância, multiplicam as injustiças e deixam atrás de si um cortejo de vítimas. Talvez tenhamos ignorado demasiadas vezes este aviso; talvez achemos que Deus não se mete em questões de política social; talvez estejamos convencidos de que é possível acalmar a indignação de Deus repartindo com Ele alguns dos nossos lucros; talvez pensemos que, se cumprirmos as nossas “obrigações” religiosas, Deus não terá razões de queixa contra nós; talvez consideremos que há pecados mais graves, do ponto de vista de Deus, do que algumas “habilidades” que fazemos para engrossar a conta bancária; talvez achemos que Deus nos desculpa tudo por causa dos cargos importantes que temos na nossa comunidade paroquial… Mas, depois de todos esses “talvez”, fica a afirmação decisiva e arrepiante que o profeta Amós nos lança: “Deus nunca esquecerá nenhuma das obras” de quem defraudou os seus irmãos e atirou o pobre para a miséria. Não há desculpas nem meios termos, nem explicações razoáveis: “Deus nunca esquecerá”. Medimos bem o alcance de tudo isto?

No Evangelho, Jesus conta uma parábola sobre um administrador astuto, que percebeu quais eram os valores em que valia a pena apostar. Numa altura em que a sua vida tinha chegado a uma encruzilhada, propôs-se prescindir de um lucro imediato e precário, para garantir uma recompensa duradoura e consistente. Jesus avisa os seus discípulos para fazerem o mesmo. A aposta nos bens materiais nunca será, segundo Jesus, uma aposta que dê pleno sentido à vida do homem.O que é que dá sentido à nossa vida? Quais são as coisas das quais não podemos absolutamente prescindir? Quais são as apostas que priorizamos? Será boa ideia apostarmos todos os nossos esforços na procura de bens materiais? Há gente para quem o dinheiro é a prioridade fundamental; há gente que acredita que o dinheiro lhe pode proporcionar bem estar, segurança, poder, importância, influência; há gente que considera que o dinheiro lhe facilitará a vida e lhe assegurará uma felicidade sem estorvos. Jesus, no entanto, tem outra perspetiva das coisas. Ele considera que, quando se trata de dar sentido à vida, há valores mais seguros, mais importantes, mais duradouros do que o dinheiro. Jesus acha que “fazer amigos” é bem mais importante do que ter contas bancárias recheadas; estabelecer pontes de diálogo e entendimento é mais compensador do que viver fechado num mundo pessoal de bem estar e de autossuficiência; partilhar o que temos com os nossos irmãos necessitados traz-nos mais felicidade do que a acumulação egoísta da riqueza. Para Jesus, os valores do Reino de Deus – o amor, a fraternidade, a solidariedade, a generosidade, a partilha, o serviço, o cuidado, a simplicidade, a humildade – é que são os valores que nos completam, que nos realizam, e que devem sustentar o edifício da nossa vida. O que pensamos disto? Concordamos com Jesus?

Na segunda leitura, o autor da primeira Carta a Timóteo convida os crentes a sentirem-se irmãos de todos os homens, sem exceção. Todos temos por Pai o mesmo Deus, todos fomos redimidos pelo mesmo Cristo Jesus. Todos fazemos parte de uma única família; as dores e esperanças dos nossos irmãos dizem-nos respeito; somos chamados à fraternidade e à comunhão. Essa solidariedade que devemos ter uns com os outros deve, inclusive, transparecer no nosso diálogo com Deus, na nossa oração.

Para o autor da primeira Carta a Timóteo, a universalidade, a solidariedade, a fraternidade, a consciência da nossa responsabilidade por todos, também devem transparecer nos momentos em que dialogamos com Deus. A nossa oração será muito pobre e muito egoísta se for apenas o momento em que nós tentamos pôr Deus ao nosso serviço exclusivo e Lhe recomendamos que não se esqueça de cuidar dos nossos interesses, dos nossos projetos, das nossas carências, enfim, de tudo o que é “nosso”… Como é que Deus verá a oração de quem só fala de si e só quer saber de si próprio? No diálogo com o nosso Pai do céu não deveríamos mostrar que o nosso coração não está fechado aos outros, exclusivamente virado para nós próprios?


Deus ou o dinheiro? Amós e Lucas convidam-nos a um sério exame de consciência sobre a nossa maneira de praticar a justiça social e de utilizar o dinheiro. Quantos pobres, hoje no mundo, são explorados com meia dúzia de euros por alguns que enriquecem sobre a sua miséria? Não acusemos ninguém! Nesta semana, retomemos estes textos para fazer o ponto da situação em toda a verdade. A que mestre estamos amarrados: a Deus ou ao dinheiro?

sábado, 20 de setembro de 2025

Reflexão para o XXV Domingo do Tempo Comum

 

Quem quer rezar bem, deve ter um bom relacionamento com o outro, só assim poderá falar com o Outro.



Vatican News

Neste domingo nosso relacionamento com Deus é analisado para que possa crescer em maturidade e intensidade.

Com certeza interferirá de modo muito forte nosso relacionamento com o irmão. Deus, como o Pai, tem como muito importante para que nossa relação com Ele “vá de vento em popa” nossa relação com o irmão, principalmente com aquele que é carente de algum dom para que tenha uma vida feliz. Estar bem com Deus, supõe estar bem com o irmão. Egoísmo, egocentrismo não encontra espaço no relacionamento com o Senhor. Já quando os discípulos pediram a Jesus que os ensinasse a rezar, lhes deu como modelo a oração do Pai-Nosso. Portanto quem quer rezar bem, deve ter um bom relacionamento com o outro, só assim poderá falar com o Outro.

A leitura da Profecia de Amós critica severamente aquele que maltrata o irmão, que olha a vida com olhos oportunistas para tirar proveito da situação adversa em que está o carente.

O Evangelho mostra a esperteza de um administrador corrupto que ao soube agir de modo previdente quando foi informado da chegada do momento de prestação de contas ao proprietário. Ele não se desculpa com o patrão, mas age de modo inteligente para com os devedores. Na verdade, todos são devedores em relação ao patrão. Tanto as pessoas que haviam feito empréstimos, como o administrador que não correspondeu às promessas da contratação. Ele teve para com os devedores uma atitude amiga e envolvente que os tornassem gratos á sua ação.

Jesus o elogia porque ele soube agir de modo excelente com os bens materiais e não ficar na “rua da amargura” quando chegasse a hora de prestar contas.

Todos nós somos esse mau administrador, que não fomos fiéis às promessas batismais, especialmente ao amor a Deus e ao Próximo. Sabendo chegar nosso fim – mais cedo ou mais tarde nos encontraremos diante do Senhor e deveremos prestar contas de nossa vida, de tudo de bom que tivemos e nos foi proporcionado – tenhamos feito amigos com o que não nos pertence, ou seja, todos os bens são dons de Deus. Se usarmos esses bens em favor do carente, estaremos transformando aquilo que é material em espiritual e além da “gratidão” de Deus porque “fizemos o bem ao menor de seus irmãos”, teremos esses carentes, gratos, rogando ao Senhor que perdoe nossas faltas. E o primeiro a rogar a Deus por nós, para que nos perdoe, será o próprio Jesus, o Filho de Deus que se fez irmão de todos os homens, especialmente dos carentes.

sexta-feira, 19 de setembro de 2025

O PORQUÊ DE UMA CHAVE FEITA PORTA-CHAVES



Ofereceram-me em tempos uma chave feita porta-chaves. A delicadeza para com quem ma ofereceu levou-me a perguntar o porquê desse preparo e qual o seu significado. A resposta não se fez tardar. Se não me explicaram tudo, tintim por tintim, o que é certo é que não permitiram que a culpa morresse solteira, pois tempo não lhes faltou para atirar com todas as culpas para cima de Maria Domingas Mazzarello, fundadora que foi, com São João Bosco e sob o seu carisma, das Filhas de Maria Auxiliadora.
Ó feliz culpa!...
Porque sabia que os grandes obras não dependem apenas do mérito humano, mas precisam de ser impulsionadas e abençoadas por Deus, esta senhora Mazzarello, que sempre buscou servir a Deus na execução dos projetos que sonhava e servia, no fim de cada dia ia colocar a chave da Instituição aos pés da imagem de Maria Auxiliadora, como que a significar-lhe a sua gratidão pelo dia que acabava - com êxitos e menos êxitos, com certeza -, e a pedir-lhe auxílio para ultrapassar as dificuldades que, no dia seguinte, iria sentir no gerir da Instituição e no desempenho da sua missão em prol daquela juventude que era a menina dos seus olhos. Para fazer memória deste gesto tão simples quão significativo, e tornar presente a sua devoção a Maria Auxiliadora e a dedicação à juventude, as suas Irmãs de religião sonharam uma chave-porta-chaves, tendo, na cabeça da chave, de um lado a imagem de Maria Auxiliadora, do outro, Maria Mazzarello. Se esse não é, fielmente, o pleno significado, peço desculpa, mas foi assim que entendi a explicação que me foi dada pelas Irmãs salesianas da comunidade religiosa presente na Chainça, em Abrantes, uma grata presença entre nós, também ao serviço sobretudo das pessoas jovens.
Se incluir a proteção divina nos projetos ao serviço do bem comum é próprio de pessoas crentes e humildes que sentem a alegria de viver para Deus e para os outros, não por medo ou obrigação, mas por amor, também Deus se serve de pessoas assim para lhes inspirar e confiar grandes projetos. Este discernir a vontade de Deus e adaptar-se a essa vontade, move a vida com determinação e alegria, torna-se fundamental para o sucesso de qualquer projeto, sobretudo educativo.
Está a começar um novo ano letivo que se quer com qualidade. Tê-la-á se, de facto, existir nos professores/educadores uma dedicação apaixonada e total à promoção integral de cada pessoa jovem, semeando neles conhecimento, curiosidade em saber, alegria e esperança, mesmo perante as dificuldades que a vida lhes venha a oferecer. Fazer crer e sentir a cada pessoa jovem que é amada, que é excelente, que é admirável, que é única, só se pode fazer com afeto, com amizade, com calor humano e delicadeza espiritual, gerando empatia pela atenção que naturalmente se lhes dá e eles natural e gratamente reconhecem. Sabemos que a função do professor, sobretudo nas escolas públicas, é ensinar o que há a ensinar, academicamente falando, e bem, é a sua obrigação. No entanto, acho que há coisas inseparáveis. O professor também é educador/formador, não tanto pela palavra que até pode não ser devida, nem oportuna, nem conveniente. Se o fizer, até pode ser tido como alguém que está a meter o nariz onde não é chamado e a passar para além do que é o seu dever e missão. Mas é educador, sim. Educa quando o seu modo de ser e estar é testemunho e transmite valores, quando forma para o bem e para o cumprimento do dever, quando é feliz e transmite que a vida é bela, que deve ser vivida com alegria, em tom de festa. Como representante e colaborador dos pais, serve com amor de bom pai, amando e servindo com paciência e capacidade de persuasão, com compaixão no presente e esperança no futuro. Assim, nada de auto-banalidade da sua pessoa, “nada de agitação de ânimo, nada de desprezo no olhar, nada de injúrias nos lábios”, nada duma “tempestade de palavras, que só fazem mal a quem as ouve e de nenhum proveito servem para quem as merece”, nada que manifeste apenas autoridade, nada que possa dar aparência de dominador ou de que está a descarregar o seu mau humor, nada de ímpetos de emoção repentina. Sempre foi mais fácil “encolerizar-se do que ter paciência, ameaçar uma criança do que persuadi-la”. É “mais cómodo, para a nossa impaciência e para a nossa soberba, castigar os recalcitrantes do que corrigi-los, suportando-os com firmeza e benignidade”.
Como Jesus, que veio para servir e amar, devemos sentir-nos envergonhados de tudo quanto “possa dar a aparência de dominadores”, pois, “se algum domínio exercemos sobre eles (os jovens), há de ser apenas para os servir melhor. Assim fazia Jesus com os seus Apóstolos, tolerando-os na sua ignorância e rudeza, e inclusivamente na sua pouca fidelidade; era tal a familiaridade e afeição com que tratava os pecadores que a alguns causava espanto, a outros escândalo, e em muitos infundia a esperança de receber o perdão de Deus; por isso nos ordenou que aprendêssemos d’Ele a ser mansos e humildes de coração”.
A todos os professores/educadores desejamos um bom ano escolar, apreciamos a sua nobre missão. E, sobretudo aos crentes, aconselhamos a que não se esqueçam de colocar, se não uma chave, uma outra 'coisinha' aos pés da Senhora, a agradecer, todos os dias, o dia de hoje, nos seus êxitos e dificuldades, e a pedir a sabedoria do Espírito para o novo dia de amanhã entre os jovens e crianças, não esquecendo uma oração por eles, pelos seus alunos.
Tudo o que aqui exprimo faz parte do carisma e dos escritos de São João Bosco e de Maria Domingas Mazzarello, Santa da Igreja Católica. Os jovens precisam de professores/educadores assim! São Francisco Xavier não via com bons olhos quem sabia muito mas não tinha vontade de fazer nada: “Muitas vezes me vem ao pensamento ir aos colégios da Europa, levantando a voz como homem que perdeu o juízo e, principalmente, à Universidade de Paris, falando na Sorbona aos que têm mais letras que vontade para se disporem a frutificar com elas”. Frutificar com o que se aprende é quase sempre fruto do bom testemunho de algum dos professores/formadores, que foi também capaz de forjar a vontade dos seus alunos.

D. Antonino Dias - Bispo Diocesano
Portalegre-Castelo Branco, 18-09-2025.