quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

ESCREVER COM TINTA DE LUZ



A 24 de janeiro celebrou-se o padroeiro dos jornalistas, Francisco de Sales (1567-1622). Foi um mestre na arte de escrever, em tempos conturbados pelo radicalismo dos seguidores de Calvino, que tinham um forte bastião em Genebra.

Aqui era bispo católico Francisco de Sales. Não calava a verdade, mas não fazia da sua pena uma flecha para fulminar hereges. Alguém o aconselhava a desanimar de proclamar a boa nova de Jesus na região de clara maioria calvinista, afirmando com amargura: “essa gente só entende a linguagem que sai da boca dos canhões”. Francisco seguiu a pedagogia do bom pastor, que dá a vida pelas suas ovelhas, sem nunca assumir o papel de lobo contra as ovelhas que não eram do seu rebanho.

Resumindo o seu estilo de comunicar, mesmo aos que seguiam por caminhos opostos ao catolicismo, assim afirmou: “uma colher de mel apanha mais moscas que um barril de vinagre”. Francisco de Sales soube falar e escrever com o mel da bondade. Nesta linha, resumiu ele a sua atitude como pastor da Igreja: “Dado que o coração do nosso Salvador não tem outras leis que as da doçura, humildade e caridade, nós atuaremos sempre conduzidos por este suave jugo”.

Como as suas pregações eram escutadas apenas por um reduzido número de fiéis, achou que devia promover uma “Igreja em saída”, ao jeito do seu futuro homónimo Francisco, Papa no século XXI. Assim, começou a publicar semanalmente umas simples folhas, que distribuía pelas casas, clarificando ideias, proclamando verdades, sem proselitismos nem polémicas, mas com humildade e doçura. Foi um jornalista exemplar nos começos do século XVII.

Quando comunicamos podemos usar o veneno da mentira, ácido corrosivo da boa fama alheia, vinagre agressivo e mal-humorado. São tintas nada aconselháveis para escrever. Há quem julgue que escrever é uma espécie de exercício de “tiro ao alvo”, sendo necessário encontrar um inimigo para atacar. Recordo uma história que ouvi sobre um professor universitário, polemista inveterado. Ao almoço com colegas professores, fazia este comentário, feliz e vitorioso: “Correu-me muito bem esta manhã, pois consegui escrever doze páginas sobre um assunto atual”. Logo interveio um comensal, fazendo-lhe esta pergunta: “Contra quem escreveste?”

Podemos assim classificar a arte de Francisco de Sales comunicar: quando falava, as suas palavras eram embebidas em mel de doçura; quando escrevia, usava tinta de luz, que iluminava e aquecia.

Um seu irmão testemunhava que Francisco de Sales tinha um caráter duro e forte, mas que ele soube educar e evangelizar, a ponto de ficar conhecido como o santo da bondade. Comunicava tanta amabilidade e doçura que passou a ser proverbial este comentário: “Como deve ser bom Deus, se Francisco é assim tão bom!”

O Papa Francisco, falando da importância do bom uso das redes sociais, assim exortava: “Abrir o caminho ao diálogo, ao encontro, ao sorriso, ao carinho… Esta é a rede que queremos: uma rede feita, não para capturar, mas para libertar, para preservar uma comunhão de pessoas livres”. É uma rede de bondade que nos deve unir sempre mais.

Manuel Morujão, sj

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