sábado, 7 de maio de 2016

CASAMENTO QUE NÃO FOI NEM DEVE SER


Manuel era filho de Duque e Condessa, com largos recursos económicos. Tudo lhe aparecia feito, tudo lhe estava pronto nas diversas ocasiões e em tempo certo. Maria, também menina prendada, gozava de não menos cuidados e atenções. Nunca sentiu falta de nada, nunca precisou de fazer grandes esforços para obter o que desejava, nunca se preocupou muito com o futuro. Para ela, o futuro era o presente e o presente estava resolvido. Seus pais, tal como os do Manuel, agiram como se eles viessem a ser sempre pessoas apaparicadas. Manuel e Maria, um dia, encontraram-se nos bancos da Universidade. Diz-se que namoraram tanto quanto bastasse para se conhecerem bem. Assim, chegou o dia de juntar os trapos e os cacos, congregaram sinergias e casaram. E para satisfazer a curiosidade do leitor, posso garantir que eles iam muito lindos e foi tudo muito bonito. Bem trajados, com veste comprida e ramo florido; com fotógrafos empertigados a distrair do essencial e padrinhos a condizer refreando a pequenada das alianças; com charrete milord e quatro cavalos baios aparelhados a rigor; com pompa e circunstância ao som da marcha nupcial por entre balões de vento presos nos bancos da igreja a significar o que cada um queira imaginar; com arroz e confeitos no adro para gozo da garotada e alegria de quem vê; com almoço farto e animado bailarico no resort. Aquilo só visto!... Pese embora ninguém saber responder à Missa, alguns não terem maneiras na igreja e outros se terem espraiado pelos cafés e tascas ao redor do adro, pois apenas foram convidados para a boda, lá no resort! Sim, como garante de fé pouco convencida e nada convincente, alguns noivos já não convidam para a celebração do matrimónio na igreja tal, convidam para a boda do “auspicioso enlace” lá num dito cujo restaurante. Mas voltando ao casamento, à saída, ao me colocar no meio dos convidados a ver passar o garboso par, dirigido na charrete por jovem com traje a imitar o “traje de luzes”, escutei, com estranheza, o que picou os meus ouvidos. Os que conheciam a Maria torciam o bico e diziam: “pobre Manel”. Os que conheciam o Manel, de bico não menos torcido, afirmavam: “pobre Maria”!... Nenhum tem emprego; nenhum sabe cozinhar; nenhum sabe pregar um botão e ambos desconhecem o trem de cozinha; nenhum tem maneiras apesar de terem cursos superiores; nenhum sabe qualquer arte ou ofício uma vez que o curso superior não lhes servirá para muito; ambos já se refilam porque as coisas não aparecem feitas; as sogras também já pelejaram pois cada uma queria “primeirar” em saber quem é que risca; ambos fumam desmesuradamente o que se não é pecado é causa de grande desgosto para a carteira, a saúde e o nosso primeiro que mandou não fumar; ambos abusam da noite e da esplanada do café; não têm um projeto de futuro, não participam na construção do bem comum, não partilham as contas bancárias, não se relacionam com ninguém, já não têm conversa e esquecem-se um do outro para se entreterem a enviar mensagens para os amigos e as amigas… São tão pobres, tão pobres, mesmo tão pobres que só têm dinheiro, piercings de ouro e smartphones de última gama. Penso que nesta ideia de comprar tudo feito e de viver de repentes, nem a “Amoris laetitia” lhes valerá!
Caro amigo leitor, não se assuste, por favor, não se entristeça, não faça caso do que leu. Esta acumulada e tão rica pobreza é miserável demais para ser verdade!... Quis apenas despertar-lhe a atenção para o que entendo que também deveria ser uma das grandes preocupações na preparação para o matrimónio. Não podemos ter em vista apenas a preparação do matrimónio quanto à vocação e missão da família, quanto aos valores fundacionais da mesma, quanto ao amadurecimento afetivo e ao itinerário de reflexão, de fé e de conhecimento mútuo que deve existir entre dois namorados, rapaz e rapariga. Há coisas basilares que se pressupõem, mas podem não existir e levar à falência qualquer matrimónio por mais esperançoso que possa ser à partida. São coisas que, em princípio, se aprendem no seio do lar paterno onde todos se amam, se cuidam e se preparam para a vida, independentemente dos cursos académicos. E ninguém poderá substituir o interesse dos próprios e o cuidado dos pais e educadores neste progressivo crescimento e preparação para a vida. O Livro da Sabedoria recorda-nos: “É melhor um pedaço de pão seco na tranquilidade, do qu
e a casa cheia de banquetes e de brigas” (Sab 17,1).

D. Antonino Dias - Bispo Diocesano Portalegre- Castelo Branco

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