Ensinou-nos o principezinho que só se vê bem com o coração. Essa deve ser uma das frases mais bonitas e mais acertadas que alguma vez alguém escreveu. “Só se vê bem com o coração”. Julgo que os olhos que temos têm, desde sempre, um ajudante à sua altura. Só se vê bem se quisermos, de facto, olhar para o que não está à vista. Esse tipo de análise visual mais aprofundada só pode fazer-se com vontade e com esperança. Estamos desaprendidos de ver bem. Esquecemo-nos de como se faz. Vamos tateando o que o mundo nos dá sem perceber, realmente, o que está ao nosso alcance. Vamos passando os olhos sobre cada coisa e presumimos. Vamos passando os olhos sobre cada pessoa e adivinhamos. Lamentavelmente, presumimos mal. Adivinhamos mal.
Atrevo-me a dizer que a capacidade de ver o que não está sempre ao alcance dos nossos olhos pode ser praticada e induzida. Por exemplo, há momentos que nos desarmam de certezas e de alegria. Nesses, costumamos ficar cegos para as coisas boas e positivas. Ficamos, simplesmente, ao colo do que nos está a magoar e a fazer mal. Se pudermos, em alternativa, ver o que nos fez chegar a esse momento, é possível ver o cenário numa outra perspetiva. O que me está a acontecer é uma consequência de como tenho vivido os meus dias? Ou é uma explosão de injustiça inesperada? Enquanto me mantiver a fazer perguntas sobre o que me está a acontecer, não mergulharei num pântano de vitimização em forma de beco sem saída. A capacidade de ver mais além reside na capacidade de fazer perguntas em vez de ficar de braços atados e coração amargurado. Outro exemplo: há pessoas que nos desviam da rota e nos fazem desconhecer o caminho certo. Levam-nos a duvidar do que fizemos e fomos até então. Essas pessoas-perigo aparecem muitas vezes ao longo da vida. Existem para nos obrigar a ver. Para nos obrigar a querer ver. Nessa altura, será tempo de perguntar: esta pessoa desviou-me da rota para uma melhor? Esta pessoa fez-me duvidar para me ajudar a encontrar certezas que combinam melhor comigo? Não?! Então, esta pessoa serviu apenas para me ajudar a dar valor a todas aquelas que estão comigo e, felizmente, não são (nem nunca foram) como ela. Parece mais simples agora, não parece? Infelizmente, não é. Também não foi simples para o principezinho. Queria encontrar amigos e ninguém da sua espécie soube ler-lhe o coração. Sobraram-lhe uma rosa e uma raposa.
Muitas vezes, o essencial também é visível aos olhos. Mas apenas aos olhos que querem, de facto, ver. Que a vida nos deixe ver as nossas rosas e as nossas raposas, mesmo quando o Mundo nos quiser falhar.
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