quinta-feira, 25 de janeiro de 2024

O perdão é tarefa para uma vida inteira



Falamos sobre o perdão como se fosse simples. Como se pudéssemos carregar num botão e ativar essa funcionalidade que nos mudaria a vida e nos tornaria numa espécie de cúmulo do altruísmo. Não é assim que funciona.

Há alguns dias que esta ideia tem dançado na minha cabeça: o perdão é trabalho para a vida inteira. A verdade é que perdoar é difícil. Pode tornar-se, até, insuportável. Dependendo do que nos tenha sido feito, podemos demorar até conseguir, sequer, equacionar esta possibilidade. Entendemos o perdão como um presente que vamos oferecer a quem nos ofendeu. Uma espécie de livre-trânsito para continuarem por aí a magoar-nos ou a ferir outros.

Mas, na realidade, o perdão é um presente que nos oferecemos a nós próprios. É um bálsamo para colocar na ferida triste e velha que, às vezes, carregamos durante tantas décadas. Ainda assim, é-nos difícil assimilar esta perspetiva. Sentimo-nos também culpados por termos deixado (ou por termos permitido) que nos magoassem. E talvez seja por isso tão difícil oferecer-nos o perdão ou encontrar lugar para este presente nas nossas vidas.

O perdão é trabalho para uma vida. E, para algumas mágoas, talvez fossem necessárias duas vidas. Ou mais.

Mas mais do que conseguir encontrar espaço para o perdão, é preciso ter coragem para o querer. Ter vontade de perdoar pode ser tão corajoso como o próprio ato de o conseguir, efetivamente, fazer.

Neste início de ano, e imersos num mês de janeiro tão comprido, que possamos encontrar tempo para perceber que partes de nós precisamos de perdoar. Deixar cair essa vontade (ou ilusão) de que poderíamos ter feito diferente e aceitar que foi como foi. E aceitar que é como é. Depois, e numa tentativa séria de perscrutar o que nos habita a alma, tentar lembrar cada um daqueles que nos deram razões para chorar ou que nos tornaram a vida num lugar pior. Perceber que, muitas vezes, quem magoa também foi magoado. Perceber que quem magoa precisa de aprender a dar amor de outra maneira.

Não nos deixemos iludir. O que escrevo é dificílimo. Quase tremendo de estivermos a falar de pessoas que nos destruíram a vida, por exemplo. Mas… queremos dar-lhes o direito de o continuar a fazer?


Marta Arrais

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