quarta-feira, 24 de setembro de 2025

Onde ancorar o nosso olhar?




Onde ancorar o nosso olhar?

Para todos aqueles que se encontram numa situação difícil: a morte de um familiar ou amigo; a dura luta contra uma doença oncológica... A vida não é fácil.

Com o passar dos anos tomamos consciência que a experiência da vida não é simples nem leve. Tal como os israelitas no livro dos Números. (Nm 21, 4b-9)

E isto vale para todos. Certamente, existem situações extremas. Gente que vive na primeira pessoa a doença, a guerra, a fome ou os desastres naturais. Mas mesmo para os poupados a tais desastres, as dificuldades da vida apresentam-se em toda a sua complexidade.

Por mais que nos sintamos financeiramente seguros, sabemos que o dinheiro não é tudo e, acima de tudo, não garante a serenidade e o verdadeiro bem-estar. Em última análise, todos nos vemos a ter de lidar com o fim da nossa existência, e ter ou não dinheiro resume-se a muito pouco.

Da dureza da vida, da qual ninguém está isento, emerge precisamente a fragilidade desta, onde simplesmente ter alimento não chega, onde, tal como as serpentes no deserto, tudo nos traz insegurança, vulnerabilidade e sofrimento. Para enfrentar os perigos do deserto, Moisés, a mando de Deus, constrói uma serpente de bronze e pendura-a num poste: olhar para esta serpente significa estar salvo das suas mordeduras.

É o sinal que Deus envia para que o povo cansado possa reaprender a confiar, a acreditar no Seu amor. E é interessante que Deus não elimina as serpentes, que continuam a morder o povo. Mas oferece um antídoto mais forte do que o veneno, com o poder de curar. O mal permanece, mas não conduz necessariamente à morte.

Paradoxalmente, o povo não deve lutar contra as serpentes, não deve tentar eliminá-las. Nunca o conseguirá, porque sozinhos não conseguimos derrotar o mal.

Jesus reinterpreta este sinal a partir daquele que será o seu destino enquanto homem crucificado: «E, assim como Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o Filho do Homem seja levantado, para que todo aquele que nele crê tenha a vida eterna.» (Jo 3, 14-15)

A sua vida e morte são como a serpente levantada, visível por todos, e quem olha para ela vê algo que o pode curar. Na cruz vemos o amor do Pai por cada um de nós: «Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigénito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna.» (Jo 3, 16).

O mal não desapareceu. Existe, e é um mal que gera a morte, um mal que procura perturbar o caminho para a liberdade, para a terra prometida, para a vida eterna. O mal que é, em última análise, falta de confiança, falta de amor.

Aqueles que levantam os olhos e contemplam o Senhor pendurado na cruz já não podem acreditar que Deus não os ama. A cruz é o antídoto que nos pode salvar. Só a cruz o pode fazer.

Caros amigos que sofreis, a fé, em última análise, é precisamente isto: crer, ser capaz de se abrir a uma dimensão que, embora não tire a dor e o sofrimento, atravessa-o, rasga-o e permite-nos apreender aquele vislumbre de luz que não conhece a morte e ancora o olhar naquele para além.



Resumindo: será verdade que a morte é o limite intransponível da vida, o fim de tudo? Se sim, então é bom olhar para baixo, cauteloso com as cobras que nos enredam os pés na esperança de que a sua mordedura nos apanhe o mais tarde possível. Se não, certamente tentaremos sempre evitar as cobras, mas acima de tudo, tentaremos manter o nosso olhar fixo nesta luz, permitindo que as nossas vidas se encham daquela esperança que dá sentido ao nosso fatigado viver.

Coragem!

Rezemos uns pelos outros.



Paulo Victória


terça-feira, 23 de setembro de 2025

Abrigo







Alguém que é abrigo.


Que não precisa de fazer grande ruído ou de muitas palavras.

Alguém que está, de verdade. E isso chega.

Que está nos dias bons e nos outros também. Quando o mundo é pesado, quando a alma se encolhe ou quando o coração aperta.


Alguém que é abraço.

Que se faz lugar seguro. Refúgio onde podes serenar, respirar, ser.

Que ampara todas as tuas dores, todos os teus anseios, todos os teus silêncios.

Que encosta a sua alma à tua só para te recordar que, mesmo nas noites mais escuras, ainda há estrelas a brilhar.

Com a ternura de quem sabe que ainda há abraços que salvam.


Alguém que é presença, companhia.

Que não se impõe, mas que se faz sempre sentir.

Como uma manta nos dias frios e uma chávena quentinha entre as mãos trémulas.

Que não promete resolver-te a vida, mas que permanece ao teu lado enquanto a vida acontece.

Como quem não deixa apagar a chama da esperança que te diz que vai correr tudo bem.


Alguém que te aparece nas pequenas coisas: numa mensagem que chega no momento certo, num abraço para ti, numa mão que te conforta, num olhar que te compreende sem perguntar, num sorriso do coração.

Que fica, mesmo quando o mundo tem pressa. Que espera, mesmo quando o tempo demora. Que acredita, mesmo quando tu duvidas.


Alguém que é mais do que sorte.

Que te segreda ao coração, com a delicadeza dos gestos que dispensam as palavras, a declaração de amor mais bonita: que, aconteça o que acontecer, vai estar sempre perto de ti.


A alguém assim: que saibas sempre agradecer.

Alguém assim: que nunca te falte. E que saibas sempre sê-lo para alguém, também.



Daniela Barreira


segunda-feira, 22 de setembro de 2025

«…que os homens rezem…»



Faz da Tua Vida uma constante oração


Quando tudo o que conhecemos não chega

e sentimos que a humanidade nos está a asfixiar…

O único caminho a seguir é a escuta da Tua Palavra, Senhor!


Quando até vendemos a nossa Alma,

ao escolhermos mais uma caminhada e dizemos “Não!” ao Teu saboroso Pão…

A única salvação é ansiar o Teu infinito Perdão, Senhor!


Quando gastamos o nosso tempo a debater futilidades

e a fazer da vida de um irmão um motivo de chacota…

A única redenção é colocar o joelho no chão perante o irmão,

porque Tu vives Nele, Senhor!


Quando os olhos servem para julgar

e nos afastam dos cenários de pobreza, injustiça e até violência extrema…

A única forma de vida é dar a Vida para Te servir, Senhor!


Quando vivemos na bolha de um paraíso, onde nada nos falta,

mas quem vive ao nosso lado é atormentado pela solidão e pela amargura…

O único sentido para a Vida é ser fiel ao Teu projeto de Amor, Senhor!


E… quando nos faltarem as forças e a determinação,

para levarmos Jesus a Todos e Todos a Jesus,

neste mundo vazio onde reina o dinheiro e o ter,

rezemos como Peregrinos de Esperança:


Louvamos-Te, Senhor, porque levantas os fracos e exaltas os humildes.



Liliana Dinis,

domingo, 21 de setembro de 2025

S. Mateus, apóstolo e evangelista

 

Um pecador que encontra Jesus   



Levi organizou um grande banquete para Jesus, que aceitou e participou com seus discípulos. Este gesto causou escândalo entre os Escrivas e Fariseus, porque participaram da festa também publicanos e pecadores. A resposta de Jesus impressionou Mateus. “Os sãos não precisam de médico, mas, sim, os doentes”, disse o Nazareno, acrescentando: “Eu não vim para chamar os justos, mas os pecadores”.

Mateus, que era pecador, deixou tudo e seguiu a Jesus, tornando-se um dos Doze. Seu nome, algumas vezes, foi citado nos Atos dos Apóstolos. O anúncio de Cristo foi a sua missão.

Segundo algumas fontes, Mateus teria morrido por causas naturais; no entanto, segundo algumas tradições, consideradas pouco críveis, a sua existência terminou na Etiópia.

Na descrição dos quatro seres do Apocalipse – águia, boi, leão, homem – São Mateus é associado àquele com aspecto de homem.

As suas relíquias encontram-se na cripta da Catedral de Salerno. Ali o Santo é festejado, em 21 de setembro, com uma solene procissão.

Autor do primeiro Evangelho, destinado aos Judeus

Mateus é autor do primeiro Evangelho, escrito não em grego, mas, quase que certamente, em aramaico. Os destinatários do Evangelho de Mateus são os cristãos de origem judaica: no texto ele coloca em realce o fato de que Jesus é o Messias, que cumpre as promessas do Antigo Testamento.

De Mateus ao Papa Francisco, através de Caravaggio

A figura do evangelista é muito requisitada pela iconografia. A famosa obra da “Vocação de São Mateus”, pintada por Caravaggio, entre 1599 e 1600, encontra-se na igreja de São Luís dos Franceses, em Roma. Trata-se de uma pintura sugestiva, na qual a luz tem um papel fundamental: como símbolo da graça, ela não provém da janela, mas de Jesus. É uma cena que atrai, sobretudo, pela sua ação dramática: o dedo de Jesus aponta para Mateus; ele, por sua vez, aponta para si mesmo, como que pedindo confirmação da sua chamada. A vocação de São Mateus e a pintura de Caravaggio marcaram a vida do Papa Francisco, que fala, sobre si mesmo, em uma entrevista ao Padre Antônio Spadaro, publicada na revista “La Civiltà Cattolica”; o Papa se autodefine “um pecador, ao qual o Senhor dirigiu o seu olhar”.

Vaticano

O Valor do Dinheiro

 



Que valores devem servir de base ao nosso projeto de vida? Que escolhas devemos fazer para que a nossa vida não seja desperdiçada? A liturgia deste vigésimo quinto domingo comum convida-nos a refletir sobre estas questões… Avisa-nos, logo à partida, que não pode ser o dinheiro a comandar a nossa vida; sugere-nos, em contrapartida, que escolhamos os valores duradouros e eternos, os valores do Reino, os valores de Deus.

A primeira leitura traz-nos a palavra de Amós, o profeta da justiça social. Dirigindo-se aos comerciantes sem escrúpulos, apostados em “espezinhar os pobres” e em “eliminar os humildes da terra”, Amós avisa: “Deus não esquecerá nenhuma das vossas obras”. A injustiça, a exploração dos pobres, a humilhação dos mais fracos, a subversão da verdade, a escravização dos irmãos, são a subversão completa do projeto que Deus tem para o mundo e para os homens. Os que escolhem esses caminhos, terão que dar contas a Deus das opções que fizeram.Amós diz uma coisa inquietante: “Deus nunca esquecerá” as obras daqueles que, dominados pela ganância, multiplicam as injustiças e deixam atrás de si um cortejo de vítimas. Talvez tenhamos ignorado demasiadas vezes este aviso; talvez achemos que Deus não se mete em questões de política social; talvez estejamos convencidos de que é possível acalmar a indignação de Deus repartindo com Ele alguns dos nossos lucros; talvez pensemos que, se cumprirmos as nossas “obrigações” religiosas, Deus não terá razões de queixa contra nós; talvez consideremos que há pecados mais graves, do ponto de vista de Deus, do que algumas “habilidades” que fazemos para engrossar a conta bancária; talvez achemos que Deus nos desculpa tudo por causa dos cargos importantes que temos na nossa comunidade paroquial… Mas, depois de todos esses “talvez”, fica a afirmação decisiva e arrepiante que o profeta Amós nos lança: “Deus nunca esquecerá nenhuma das obras” de quem defraudou os seus irmãos e atirou o pobre para a miséria. Não há desculpas nem meios termos, nem explicações razoáveis: “Deus nunca esquecerá”. Medimos bem o alcance de tudo isto?

No Evangelho, Jesus conta uma parábola sobre um administrador astuto, que percebeu quais eram os valores em que valia a pena apostar. Numa altura em que a sua vida tinha chegado a uma encruzilhada, propôs-se prescindir de um lucro imediato e precário, para garantir uma recompensa duradoura e consistente. Jesus avisa os seus discípulos para fazerem o mesmo. A aposta nos bens materiais nunca será, segundo Jesus, uma aposta que dê pleno sentido à vida do homem.O que é que dá sentido à nossa vida? Quais são as coisas das quais não podemos absolutamente prescindir? Quais são as apostas que priorizamos? Será boa ideia apostarmos todos os nossos esforços na procura de bens materiais? Há gente para quem o dinheiro é a prioridade fundamental; há gente que acredita que o dinheiro lhe pode proporcionar bem estar, segurança, poder, importância, influência; há gente que considera que o dinheiro lhe facilitará a vida e lhe assegurará uma felicidade sem estorvos. Jesus, no entanto, tem outra perspetiva das coisas. Ele considera que, quando se trata de dar sentido à vida, há valores mais seguros, mais importantes, mais duradouros do que o dinheiro. Jesus acha que “fazer amigos” é bem mais importante do que ter contas bancárias recheadas; estabelecer pontes de diálogo e entendimento é mais compensador do que viver fechado num mundo pessoal de bem estar e de autossuficiência; partilhar o que temos com os nossos irmãos necessitados traz-nos mais felicidade do que a acumulação egoísta da riqueza. Para Jesus, os valores do Reino de Deus – o amor, a fraternidade, a solidariedade, a generosidade, a partilha, o serviço, o cuidado, a simplicidade, a humildade – é que são os valores que nos completam, que nos realizam, e que devem sustentar o edifício da nossa vida. O que pensamos disto? Concordamos com Jesus?

Na segunda leitura, o autor da primeira Carta a Timóteo convida os crentes a sentirem-se irmãos de todos os homens, sem exceção. Todos temos por Pai o mesmo Deus, todos fomos redimidos pelo mesmo Cristo Jesus. Todos fazemos parte de uma única família; as dores e esperanças dos nossos irmãos dizem-nos respeito; somos chamados à fraternidade e à comunhão. Essa solidariedade que devemos ter uns com os outros deve, inclusive, transparecer no nosso diálogo com Deus, na nossa oração.

Para o autor da primeira Carta a Timóteo, a universalidade, a solidariedade, a fraternidade, a consciência da nossa responsabilidade por todos, também devem transparecer nos momentos em que dialogamos com Deus. A nossa oração será muito pobre e muito egoísta se for apenas o momento em que nós tentamos pôr Deus ao nosso serviço exclusivo e Lhe recomendamos que não se esqueça de cuidar dos nossos interesses, dos nossos projetos, das nossas carências, enfim, de tudo o que é “nosso”… Como é que Deus verá a oração de quem só fala de si e só quer saber de si próprio? No diálogo com o nosso Pai do céu não deveríamos mostrar que o nosso coração não está fechado aos outros, exclusivamente virado para nós próprios?


Deus ou o dinheiro? Amós e Lucas convidam-nos a um sério exame de consciência sobre a nossa maneira de praticar a justiça social e de utilizar o dinheiro. Quantos pobres, hoje no mundo, são explorados com meia dúzia de euros por alguns que enriquecem sobre a sua miséria? Não acusemos ninguém! Nesta semana, retomemos estes textos para fazer o ponto da situação em toda a verdade. A que mestre estamos amarrados: a Deus ou ao dinheiro?

sábado, 20 de setembro de 2025

Reflexão para o XXV Domingo do Tempo Comum

 

Quem quer rezar bem, deve ter um bom relacionamento com o outro, só assim poderá falar com o Outro.



Vatican News

Neste domingo nosso relacionamento com Deus é analisado para que possa crescer em maturidade e intensidade.

Com certeza interferirá de modo muito forte nosso relacionamento com o irmão. Deus, como o Pai, tem como muito importante para que nossa relação com Ele “vá de vento em popa” nossa relação com o irmão, principalmente com aquele que é carente de algum dom para que tenha uma vida feliz. Estar bem com Deus, supõe estar bem com o irmão. Egoísmo, egocentrismo não encontra espaço no relacionamento com o Senhor. Já quando os discípulos pediram a Jesus que os ensinasse a rezar, lhes deu como modelo a oração do Pai-Nosso. Portanto quem quer rezar bem, deve ter um bom relacionamento com o outro, só assim poderá falar com o Outro.

A leitura da Profecia de Amós critica severamente aquele que maltrata o irmão, que olha a vida com olhos oportunistas para tirar proveito da situação adversa em que está o carente.

O Evangelho mostra a esperteza de um administrador corrupto que ao soube agir de modo previdente quando foi informado da chegada do momento de prestação de contas ao proprietário. Ele não se desculpa com o patrão, mas age de modo inteligente para com os devedores. Na verdade, todos são devedores em relação ao patrão. Tanto as pessoas que haviam feito empréstimos, como o administrador que não correspondeu às promessas da contratação. Ele teve para com os devedores uma atitude amiga e envolvente que os tornassem gratos á sua ação.

Jesus o elogia porque ele soube agir de modo excelente com os bens materiais e não ficar na “rua da amargura” quando chegasse a hora de prestar contas.

Todos nós somos esse mau administrador, que não fomos fiéis às promessas batismais, especialmente ao amor a Deus e ao Próximo. Sabendo chegar nosso fim – mais cedo ou mais tarde nos encontraremos diante do Senhor e deveremos prestar contas de nossa vida, de tudo de bom que tivemos e nos foi proporcionado – tenhamos feito amigos com o que não nos pertence, ou seja, todos os bens são dons de Deus. Se usarmos esses bens em favor do carente, estaremos transformando aquilo que é material em espiritual e além da “gratidão” de Deus porque “fizemos o bem ao menor de seus irmãos”, teremos esses carentes, gratos, rogando ao Senhor que perdoe nossas faltas. E o primeiro a rogar a Deus por nós, para que nos perdoe, será o próprio Jesus, o Filho de Deus que se fez irmão de todos os homens, especialmente dos carentes.

sexta-feira, 19 de setembro de 2025

O PORQUÊ DE UMA CHAVE FEITA PORTA-CHAVES



Ofereceram-me em tempos uma chave feita porta-chaves. A delicadeza para com quem ma ofereceu levou-me a perguntar o porquê desse preparo e qual o seu significado. A resposta não se fez tardar. Se não me explicaram tudo, tintim por tintim, o que é certo é que não permitiram que a culpa morresse solteira, pois tempo não lhes faltou para atirar com todas as culpas para cima de Maria Domingas Mazzarello, fundadora que foi, com São João Bosco e sob o seu carisma, das Filhas de Maria Auxiliadora.
Ó feliz culpa!...
Porque sabia que os grandes obras não dependem apenas do mérito humano, mas precisam de ser impulsionadas e abençoadas por Deus, esta senhora Mazzarello, que sempre buscou servir a Deus na execução dos projetos que sonhava e servia, no fim de cada dia ia colocar a chave da Instituição aos pés da imagem de Maria Auxiliadora, como que a significar-lhe a sua gratidão pelo dia que acabava - com êxitos e menos êxitos, com certeza -, e a pedir-lhe auxílio para ultrapassar as dificuldades que, no dia seguinte, iria sentir no gerir da Instituição e no desempenho da sua missão em prol daquela juventude que era a menina dos seus olhos. Para fazer memória deste gesto tão simples quão significativo, e tornar presente a sua devoção a Maria Auxiliadora e a dedicação à juventude, as suas Irmãs de religião sonharam uma chave-porta-chaves, tendo, na cabeça da chave, de um lado a imagem de Maria Auxiliadora, do outro, Maria Mazzarello. Se esse não é, fielmente, o pleno significado, peço desculpa, mas foi assim que entendi a explicação que me foi dada pelas Irmãs salesianas da comunidade religiosa presente na Chainça, em Abrantes, uma grata presença entre nós, também ao serviço sobretudo das pessoas jovens.
Se incluir a proteção divina nos projetos ao serviço do bem comum é próprio de pessoas crentes e humildes que sentem a alegria de viver para Deus e para os outros, não por medo ou obrigação, mas por amor, também Deus se serve de pessoas assim para lhes inspirar e confiar grandes projetos. Este discernir a vontade de Deus e adaptar-se a essa vontade, move a vida com determinação e alegria, torna-se fundamental para o sucesso de qualquer projeto, sobretudo educativo.
Está a começar um novo ano letivo que se quer com qualidade. Tê-la-á se, de facto, existir nos professores/educadores uma dedicação apaixonada e total à promoção integral de cada pessoa jovem, semeando neles conhecimento, curiosidade em saber, alegria e esperança, mesmo perante as dificuldades que a vida lhes venha a oferecer. Fazer crer e sentir a cada pessoa jovem que é amada, que é excelente, que é admirável, que é única, só se pode fazer com afeto, com amizade, com calor humano e delicadeza espiritual, gerando empatia pela atenção que naturalmente se lhes dá e eles natural e gratamente reconhecem. Sabemos que a função do professor, sobretudo nas escolas públicas, é ensinar o que há a ensinar, academicamente falando, e bem, é a sua obrigação. No entanto, acho que há coisas inseparáveis. O professor também é educador/formador, não tanto pela palavra que até pode não ser devida, nem oportuna, nem conveniente. Se o fizer, até pode ser tido como alguém que está a meter o nariz onde não é chamado e a passar para além do que é o seu dever e missão. Mas é educador, sim. Educa quando o seu modo de ser e estar é testemunho e transmite valores, quando forma para o bem e para o cumprimento do dever, quando é feliz e transmite que a vida é bela, que deve ser vivida com alegria, em tom de festa. Como representante e colaborador dos pais, serve com amor de bom pai, amando e servindo com paciência e capacidade de persuasão, com compaixão no presente e esperança no futuro. Assim, nada de auto-banalidade da sua pessoa, “nada de agitação de ânimo, nada de desprezo no olhar, nada de injúrias nos lábios”, nada duma “tempestade de palavras, que só fazem mal a quem as ouve e de nenhum proveito servem para quem as merece”, nada que manifeste apenas autoridade, nada que possa dar aparência de dominador ou de que está a descarregar o seu mau humor, nada de ímpetos de emoção repentina. Sempre foi mais fácil “encolerizar-se do que ter paciência, ameaçar uma criança do que persuadi-la”. É “mais cómodo, para a nossa impaciência e para a nossa soberba, castigar os recalcitrantes do que corrigi-los, suportando-os com firmeza e benignidade”.
Como Jesus, que veio para servir e amar, devemos sentir-nos envergonhados de tudo quanto “possa dar a aparência de dominadores”, pois, “se algum domínio exercemos sobre eles (os jovens), há de ser apenas para os servir melhor. Assim fazia Jesus com os seus Apóstolos, tolerando-os na sua ignorância e rudeza, e inclusivamente na sua pouca fidelidade; era tal a familiaridade e afeição com que tratava os pecadores que a alguns causava espanto, a outros escândalo, e em muitos infundia a esperança de receber o perdão de Deus; por isso nos ordenou que aprendêssemos d’Ele a ser mansos e humildes de coração”.
A todos os professores/educadores desejamos um bom ano escolar, apreciamos a sua nobre missão. E, sobretudo aos crentes, aconselhamos a que não se esqueçam de colocar, se não uma chave, uma outra 'coisinha' aos pés da Senhora, a agradecer, todos os dias, o dia de hoje, nos seus êxitos e dificuldades, e a pedir a sabedoria do Espírito para o novo dia de amanhã entre os jovens e crianças, não esquecendo uma oração por eles, pelos seus alunos.
Tudo o que aqui exprimo faz parte do carisma e dos escritos de São João Bosco e de Maria Domingas Mazzarello, Santa da Igreja Católica. Os jovens precisam de professores/educadores assim! São Francisco Xavier não via com bons olhos quem sabia muito mas não tinha vontade de fazer nada: “Muitas vezes me vem ao pensamento ir aos colégios da Europa, levantando a voz como homem que perdeu o juízo e, principalmente, à Universidade de Paris, falando na Sorbona aos que têm mais letras que vontade para se disporem a frutificar com elas”. Frutificar com o que se aprende é quase sempre fruto do bom testemunho de algum dos professores/formadores, que foi também capaz de forjar a vontade dos seus alunos.

D. Antonino Dias - Bispo Diocesano
Portalegre-Castelo Branco, 18-09-2025.


Com o coração nas mãos

 





Volta e meia andamos com o coração nas mãos o que significa que andamos aflitos e preocupados com algo.

Preocupamo-nos com o que não sabemos que vai acontecer ou como vai acontecer.
Afligimo-nos com as notícias e ficamos ansiosos porque não dominamos o desfecho de muito do que acontece a nós e aos nossos.

Sentes isso? E quando parece que algo se resolve, surge logo outros motivos de preocupação e logo voltamos a ter “o coração nas mãos.”

Então, quando é que que não os temos nas mãos? Provavelmente: NUNCA! E se calhar é esse o melhor sitio para ele. As nossas mãos representam a ação, a transformação do que somos em gestos concretos. O nosso coração é o órgão mais valioso (juntamente com os outros todos:), não quero que ninguém se zangue) e deve ser transformado em gestos concretos de amor ao próximo e a nós também.

Se o teu coração for o melhor que tens a oferecer, já é bom! Mas não te enganes, ele é teu e como tal a responsabilidade de o tratares bem é tua. Não fujas do que te preocupa, mas garante que tens o coração no sítio certo e bem seguro. Não abras demasiado as mãos aos que te cansam, nem apertes demasiado com medo de mostrar o que sentes e és capaz.

Segura-o com carinho.

Protege-o com segurança.

Leva-o onde se sente feliz

Enche-o de mimos.

E leva-o a descansar.


E se as tuas mãos forem o melhor sitio, que elas sejam tal qual bandeja para o mais precioso que tens - o amor!


E tu, amiga, onde tens o teu coração?


Raquel Rodrigues

quinta-feira, 18 de setembro de 2025

Um bom livro é um mapa-mundo





A viagem da vida deve ser feita com cuidado. Importa saber o que outros, antes de nós, aprenderam – tantas vezes, para que não cometamos os mesmos erros que eles. Outras, para que acreditemos que o impossível é, afinal, possível, para quem luta e acredita!

Criamos um mundo novíssimo dentro de nós, mas cheio de gente que conhecemos e de episódios da nossa vida. No entanto, também há muita gente que não gosta nada de olhar para si mesma tal como é, e, por isso, lê pouco.

Um bom livro desperta em nós o que sempre soubemos, mas que nunca nos tinha sido contado: uma mistura mágica entre imaginação, memória e reflexão. Um bom livro não pensa, mas faz pensar.

Ainda que seja pura ficção, um bom livro é, por vezes, mais real do que a própria realidade e continuará a falar-nos muito tempo depois de lermos a sua última página.

Na vida de cada um de nós, cabe-nos o dever de eleger quem será o herói. Há quem atribua a si mesmo esse papel, enquanto outros se limitam ao papel de personagens secundários da sua própria existência, escolhendo outras pessoas para protagonistas. A verdade é que esta opção quase sempre acaba em desgraça.

Mais belo do que escrever é viver uma vida que valha a pena ser escrita e lida por muitos!

Será sempre mil vezes mais belo viver um romance do que escrevê-lo.



José Luís Nunes Martins


Experiência Pessoal



Recentemente li que a Suécia estaria a regressar ao ensino analógico, abandonando o digital. Em poucos anos percebeu o que há algum tempo se sabia: não há como pôr as mãos na massa, em vez dos dedos no ecrã.

Desde 2007, quando surgiu o primeiro iPhone, que se tem assistido a uma crescente materialidade desincarnada, isto é, a virtualidade que precisa apenas dos dedos-materiais, e de um ecrã-material, para capturar a nossa atenção, dando-nos a sensação de lidarmos com “algo” que, na prática, é desincarnado, não tem formato próprio, mas pode assumir qualquer formato por ser pura informação.

A vida em ambiente digital não vive de experiências, mas de conteúdos. Foi o que senti da última vez que viajei para o país que abraça de um modo mais consciente o ensino analógico de modo a participar numa conferência. Nos aeroportos cruzamo-nos com pessoas de muitas culturas e línguas, mas o denominador comum era a selfie.

O tristemente curioso foi numa eucaristia, depois de ter voltado, em que houveram dois baptizados, ver uma família em que o marido apenas sabia algumas das orações, a tirar selfies enquanto o ritual do baptismo se iniciava. Cada eucaristia é uma oportunidade de experimentar Deus no interior de nós próprios, mas gerar conteúdos como parte da materialidade desincarnada em que muitas pessoas vive, sem se importar muito com isso, demonstra de novo o domínio do conteúdo partilhável sobre a experiência pessoal. Um dia iremos dar conta que quanta atenção perdemos e que não mais recuperaremos. Como restaurar a atenção e recomeçar a desejar mais experiências pessoais em vez de conteúdos digitais?
A restauração da nossa atenção é uma teoria dos anos 1990 do casal Kaplan que passa pelo maior tempo de contacto com o mundo natural. Com um discurso perfeitamente laico, esta teoria assenta numa experiência profundamente espiritual. O Tempo da Criação que vivemos sempre no mês de setembro no mundo Católico por iniciativa do Papa Francisco, alinha-se com a natureza cíclica da nossa existência para nos convidar a abrir o coração, que envolve corpo, mente e espírito, à experiência espiritual incarnada.

Não tenho dúvidas sobre as vantagens abertas pelas tecnologias digitais. Em Lund, na Suécia, procurei ir à missa consciente de que iria compreender uma palavra apenas: Amém. E foi graças à aplicação do Secretariado Nacional da Liturgia que consegui acompanhar as leituras usando o telemóvel. E com a ajuda do ChatGPT, até consegui perceber como é que os suecos desejam a paz uns aos outros naquele momento particular da Eucristia. Mas quando chegou esse momento, curiosamente, todos fizemos uma vénia, sorríamos e desejávamos com o coração a paz ao outro. Com poucas palavras ou mesmo nenhuma.

O regresso ao lápis e papel no processo de aprendizagem, não significa voltar aos tempos antigos, mas reconhecer que a experiência pessoal é mais importante para o nosso desenvolvimento e amadurecimento do que os conteúdos digitais que geramos ou acessamos para capturar a atenção do outro ou vender a nossa. E isto por uma razão muito simples: a experiência pessoal é profundamente espiritual.



Miguel Oliveira Panão

quarta-feira, 17 de setembro de 2025

De quantos seres somos feitos?




Somos um e no entanto somos tantos!

Não deixa de ser caricato pensar em quem somos em diferentes circunstâncias e também quem somos aos olhos dos outros!

Somos feitos de um emaranhado de fios onde se cruzam emoções, pensamentos, ações, onde flutuamos entre sentimentos ambíguos tantas vezes, mas totalmente válidos!

Hoje sou alegria, amanhã talvez tristeza, mais á frente serei leveza, outras vezes sentirei o peso de algo que me angustia. Dias haverão em que serei risos, outros serei silencio e sorriso discreto. A alma é a mesma, as circunstâncias é que são diferentes e está tudo bem em poder ser todos e só um, sem constante ânsia em ocultar aquilo que somos para não por em causa o que pensam de nós.

Cabe a cada um acolher o outro na sua verdade e perceber o quão importante é permitir que o outro seja quem é em toda a sua essência, porque no fundo é isso que todos pretendemos, não é?



Lucília Miranda

terça-feira, 16 de setembro de 2025

Regressa a ti!



Setembros é o mês dos recomeços. Dos reinícios. Da despedida do verão que nos parece sempre que passou demasiado depressa. Vamos sendo protagonistas e personagens deste modo de vida que nos obriga a estar sempre onde já não estamos. É como se a velocidade de tudo nos avassalasse. Ainda agora era verão, e estávamos na praia a tomar banhos de mar ou de piscina e, de repente, já o tempo parece estar mais fresco e já sabe bem vestir um casaco ou uma camisola.

Sinto cada vez mais que a vida passa por nós em vez de sermos nós a ter a ousadia de passar por ela. Como se nos tivéssemos deixado levar por um ritmo e por uma dimensão de tempo que nos torna cada vez mais efémeros e menos presentes.

Tudo o que se anuncia é com uma antecedência que nos faz viver no futuro e a ignorar o momento presente. Também esse incentivo nos faz sentir uma ansiedade maior, uma crescente necessidade de controlar o que nos foge das mãos a cada instante.

Talvez valha a pena trazer mais presença a este mês de setembro. Menos pressa e um bocadinho mais de luz sobre todas as coisas que nunca deixaram de ser importantes: a família, os amigos, as pessoas que conhecemos e que nos são queridas que estão a passar por um momento difícil, o cuidar do nosso tempo de descanso e de não produtividade. O querer desenvolver mais a nossa humanidade e menos aquilo que nos faz ser cada vez mais parecidos com um personagem de inteligência artificial. No nosso caso seria mais de “consciência artificial”.

Mesmo nesta dinâmica de regresso às aulas e ao trabalho, neste mergulhar de horários que nos fazem sentir menos e pensar mais, fica o convite para respirar fundo mais vezes. Para parar para perceber o que é que, realmente, estamos a precisar de ser ou de fazer neste momento.

O trabalho pode esperar, mas a vida não.

Os horários mudam-se, mas as pessoas não.

Neste regresso à rotina de todos os dias, saibas tu (e saibamos nós) regressar ao que somos. (Re)conhecer o que nos habita e encontrar tempo para amar o que precisa e os que precisam. É só o hoje que temos! E que tens!


Marta Arrais


segunda-feira, 15 de setembro de 2025

Exaltação da Santa Cruz



«Deus amou tanto o mundo»


E eu… impaciente…

peço e peço mais a cada dia.


Se me deito quero levantar-me

Se me levanto quero ficar parada


Se tenho água quero sentir sede

Se tenho sede quero frio e chuva


Se tenho Pão quero riquezas desmedidas

Se tenho riquezas desmedidas quero o mundo


Se tenho fogo na Alma quero um coração manso

Se tenho um coração manso quero a força do Teu Espírito Santo


E a Cruz… a Cruz da verdadeira salvação,

permanece erguida por Ti, Bom e humilde Jesus, para que eu A queira.



Liliana Dinis

domingo, 14 de setembro de 2025

Exaltação da Santa Cruz, o amor de Deus que se manifesta







Origens


Esta festa de Exaltação da Santa Cruz nasceu em Jerusalém, em 13 de setembro de 335, no aniversário da dedicação das duas igrejas construídas por Constantino, uma sobre o Gólgota (ad Martyrium) e a outra perto do Santo Sepulcro (Ressurreição), após a descoberta das relíquias da cruz por Helena, a mãe do imperador. A cruz, instrumento da mais terrível das torturas, em 320, Constantino a proibiu de ser utilizada.

Restituição da Cruz


Em 614, Cosroes II, rei dos Persas, travou uma guerra contra os Romanos. Depois de derrotar Jerusalém, levou consigo, entre os diversos tesouros, também a Cruz de Jesus. Heráclio, imperador romano de Bizâncio, propôs um pacto de paz com Cosroes, que não aceitou. Diante da sua negação, entrou em guerra com ele e venceu, perto de Nínive, e pediu a restituição da Cruz, que a levou de volta a Jerusalém. Neste dia da Exaltação da Santa Cruz, não se glorifica a crueldade da Cruz, mas o Amor que Deus manifestou aos homens ao aceitar morrer na Cruz.

Cruz: o amor de Deus para connosco


O Evangelho, que a liturgia nos propõe na festa da Exaltação da Santa Cruz, diz que Deus pretende construir uma relação de amor com cada um de nós; Ele se oferece na pessoa do seu Filho Jesus, pregado na Cruz.

O fato de levantarmos o olhar para Deus nos propõe uma verdade importante: somos convidados a voltar a nos relacionarmos de novo com Ele.

A Misericórdia


O fato de elevar o nosso olhar não nos deve causar medo, mas gratidão, porque tal elevação é a medida do amor com a qual Deus ama os seus filhos no Filho. Com efeito, a misericórdia de Deus ilumina as noites da nossa vida e nos permite continuar o nosso caminho.

Não há espaço para indiferença


Não podemos permanecer indiferentes diante da Cruz de Jesus: nem com Ele nem contra Ele. Trata-se de uma escolha, que deve ser feita antes de qualquer ação. A vida do cristão é o testemunho de quanto “Deus nos amou a ponto de dar seu Filho Jesus”.

Festa


A festa da Exaltação da Santa Cruz, em 14 de setembro, conservou-se nos documentos. Contudo, na litúrgica, andou muito lentamente, sobretudo porque o dia 14 estava já ocupado pelos santos mártires Cipriano e Cornélio. A reforma litúrgica pós-conciliar restabeleceu a importância do dia de hoje, que é festa.

Significado da Cruz


Para o cristão, a cruz significa a árvore da vida, o trono, o altar da Nova Aliança: de Cristo, o novo Adão adormecido na cruz, brotou o admirável sacramento de toda a Igreja. A cruz é o sinal de Cristo sobre aqueles que no Batismo são configurados a Ele em morte e glória.

Minha oração


Sabemos que tudo neste mundo é passageiro, mas a tua salvação através da Cruz permanece. Fazei que aprendamos a adorar a Santa Cruz e nela alcancemos força e consolo. Amém!”

Santa Cruz, sede a nossa salvação!


https://santo.cancaonova.com/

A Misericórdia de Deus

 






As leituras que a liturgia do décimo quarto domingo comum nos propõe falam-nos do amor de Deus. Garantem-nos que nada nos afastará desse amor, nem sequer a nossa infidelidade, a nossa autossuficiência, as nossas opções erradas. O amor de Deus é a mais bela das nossas certezas.

A primeira leitura traz-nos um episódio da caminhada dos israelitas pelo deserto. Quando eles, traindo os compromissos que tinham assumido no Sinai, constroem e adoram um bezerro de ouro, Deus fica indignado e propõe-se punir o Seu povo; mas, depois de Moisés Lhe ter lembrado as suas promessas, Deus desiste do castigo que tinha pensado infligir a Israel. Neste episódio há um padrão que se repete ao longo de toda a história da salvação: a misericórdia de Deus acaba sempre por triunfar sobre a sua ira.Como é que Deus lida com as nossas falhas, as nossas opções estúpidas, as nossas recusas em acolher as suas indicações e propostas? Ele “queima pontes” e afasta-se irremediavelmente de nós? Ele diz-nos, em algum momento, que está farto das nossas traições e que não conta mais connosco? O episódio da construção, pelos israelitas, de um “bezerro de ouro” e a decisão final que Deus toma em relação à rebeldia do seu povo deixa-nos uma resposta clara para estas questões: a misericórdia de Deus sobrepõe-se sempre à sua indignação. É bom acreditarmos num Deus que nunca nos fecha a porta. Se não pudéssemos contar com a misericórdia de Deus, a nossa fragilidade conduzir-nos-ia a um beco sem saída e experimentaríamos um desespero sem esperança. O amor inquebrantável de Deus pelos seus filhos pecadores tem de ser o grande dogma sobre o qual construímos a nossa vida de todos os dias. Caminhamos pela vida alimentados e fortalecidos pela certeza do amor de Deus? Damos testemunho desse amor junto dos nossos irmãos acabrunhados pela consciência da sua fragilidade?

No Evangelho Jesus, dirigindo-se àqueles que O criticavam por se sentar à mesa com gente de moral duvidosa, conta três parábolas sobre a bondade de Deus para com os “perdidos”, os excluídos, os “malditos”. Deus não deixa para trás nenhum dos seus queridos filhos; e sente uma enorme alegria sempre que volta a abraçar aquele que “estava morto e voltou à vida, estava perdido e foi reencontrado”. As parábolas do pastor bondoso, da mulher que procura a dracma perdida e do pai misericordioso, são três magníficos hinos ao amor de Deus.As “parábolas da misericórdia” deixam no ar algumas questões: se Deus é assim, se Deus está sempre de braços abertos para acolher os filhos que fizeram escolhas erradas, vale a pena ser bom? Não será mais lógico “gozar a vida” o mais possível, sem problemas de consciência, uma vez que Deus tudo perdoa? Há uma coisa que devemos ter absolutamente clara: escolher caminhos de autossuficiência, à margem de Deus, nunca é uma opção que nos traga felicidade e realização pessoal; optar pela futilidade e pelos valores efémeros leva-nos, mais tarde ou mais cedo, a um enorme vazio interior e a situações sem saída. Podemos, evidentemente, no exercício da nossa liberdade “matar Deus”, ignorar as suas indicações, afastar-nos da “casa do pai”, viver como nos apetece; mas será uma opção inteligente? Ao fim de algum tempo, não descobriremos que andamos em círculos, sem rumo e sem objetivo? Isso não será perder tempo? Podemos dar-nos ao luxo de desperdiçar a nossa breve vida em caminhos que não nos levam a lado nenhum?

Na segunda leitura, Paulo recorda algo que nunca deixou de lhe causar espanto: o amor de Deus manifestado em Jesus Cristo. Esse amor, derramado incondicionalmente sobre os pecadores, transforma-os e torna-os pessoas novas. Paulo, o perseguidor de cristãos convertido a Cristo, é um exemplo concreto dessa ação salvadora de Deus. Por isso, nunca deixará de testemunhar e de agradecer tudo o que Deus fez por ele.Paulo não duvida, nem por um instante, da misericórdia de Deus. Porquê? Porque a experimentou na sua própria vida. Paulo tinha sido cúmplice dos assassinos de Estevão, o primeiro mártir da Igreja de Jerusalém (cf. At 7,58) e tinha participado ativamente na perseguição dos primeiros cristãos (cf. At 8,3; 9,1-2). Apesar disso, Deus não o rejeitou; e, no tempo oportuno, chamou-o e envolveu-o no seu projeto de salvação. Deus não nos exclui porque em dado momento fizemos uma opção errada; Deus não nos bloqueia na sua lista de amigos porque um dia dissemos ou fizemos algo que Lhe “caiu mal”. Deus tem e terá sempre por nós um apreço que só o amor pode explicar. Ele conta sempre connosco. Aconteça o que acontecer na nossa vida, Ele quer incluir-nos na sua história de salvação. Talvez nos sintamos indignos e desprezíveis por opções e gestos da nossa vida passada; talvez carreguemos o peso de culpas que não conseguimos esquecer… Mas o amor inquebrantável de Deus estará sempre à nossa espera para curar as nossas feridas e para nos oferecer a oportunidade de caminharmos em direção a Ele. Estamos conscientes disso? Acreditamos que a misericórdia de Deus é infinitamente maior do que a nossa culpa?


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sábado, 13 de setembro de 2025

A solidão que revela a luz

 


P

arece clichê dizer que a solidão nos ensina. Mas, na verdade, ela é uma das grandes mestras da vida.



Éno silêncio da ausência, no desconforto do vazio e na travessia da escuridão que muitas vezes reconhecemos a verdadeira felicidade.


Assim como não perceberíamos a luz sem antes termos conhecido a escuridão, também não reconheceríamos a graça da vida sem atravessar momentos de silêncio interior. A solidão, quando acolhida, não é apenas ausência: ela pode ser espaço de revelação.

Do ponto de vista psicológico, é nesse encontro com nós mesmos que surgem as perguntas mais profundas: Quem sou eu, além do que mostro ao mundo? Do que realmente preciso? O que a minha alma deseja? Perguntas que não nascem no barulho, mas no recolhimento.

E, do ponto de vista espiritual, é nesse mesmo recolhimento que Deus se aproxima. Não porque Ele precise de silêncio para falar, mas porque nós precisamos de silêncio para ouvir. É no coração que se esvazia do excesso que a presença d’Ele se torna mais nítida.

Quando estamos abertos a esse processo, deixamos de ser pessoas que “morrem em vida” e passamos a viver em plenitude. É como se a solidão, antes temida, se transformasse em solo fértil onde floresce a confiança, a fé e a verdadeira esperança.

A fé nos recorda que, ainda que experimentemos noites escuras, o sol sempre chega. Assim como a ressurreição de Cristo veio depois da cruz, também em nossas vidas a alegria vem após o sofrimento, e a luz após a escuridão.

Viver em vida é justamente isso: aceitar as dores sem perder a esperança, atravessar a solidão sem esquecer da presença de Deus, e reconhecer que, mesmo quando parece que estamos sozinhos, somos acompanhados por um maior.

Talita Rodrigues


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sexta-feira, 12 de setembro de 2025

HÁ COISAS LEVADAS DA BRECA!...



Sim, há mesmo coisas levadas da breca! Não naquele sentido de breca significar furor, ira, diabruras, mas no de exprimir coisas espantosas, incríveis, extraordinárias. E espantoso é, por exemplo, haver dias internacionais para muita coisa, fazendo com que muita coisa tenha, em cada dia, todos os dias, o seu dia internacional. Já são 218 esses dias, além dos anos temáticos, das décadas especiais, dos dias europeus e alguns dias mundiais da Igreja. Entendemos tais preocupações e a necessidade de agir, mas também sabemos que, se o hábito de os proclamar pode viciar os seus autores, a tanta abundância também pode desmotivar aqueles que se pretendem sensibilizar. Esta afirmação, porém, pode parece uma tontaria, mas o leitor fará o favor de a rejeitar ou contestar. O Dia Internacional da Democracia, deste ano, já bate à porta, e, como sabemos, a democracia preza a liberdade de expressão. Quando, porventura, essa liberdade de expressão leva a dizer o que se pensa sem pensar o que se diz, tanto pode sair um disparate mais que asinino, como uma ideia fulgurante ao jeito de talento parlamentar, como um impropério de fazer ferver a indignação ao ponto de a tampa saltar para sovar tal vileza: ihihihihih...
Desde 2007, e por solene autorização das Nações Unidas, lavrada e emitida em Resolução, a Democracia, mesmo que tenha pressa e faça bater a aldraba na porta, só poderá entrar a 15 de setembro, o seu dia. Não sei se é por isso, mas acho que essa esbelta senhora, a Democracia, anda um pouco desorientada e abatida, cabisbaixa, talvez doente. Como se não bastasse, os especialistas em tais maleitas manifestam dificuldade em acertar na moche, não apreciam os sintomas em evidência, mostram cansaço e alheamento. Possivelmente, alguns deles também estarão adoentados, coitados, talvez com síndrome de grave doença antidemocrática, tendo dificuldade em encontrar alguém que tenha a coragem de lhes fazer um rigoroso diagnóstico e de lho revelar... Assim, a tão desejada Democracia, nas suas moléstias, ter-se-á de contentar com umas mezinhas caseiras bem mal amanhadas, possivelmente ao gosto de curiosos amadores ou de tarefeiros com pressa, incapazes de lhe garantirem esperança no resultado. Paciência, são sortes!
Como o leitor constata, ainda sobra uma mão cheia de dias para, se a imaginação funcionar, a ONU conseguir proclamar mais uns tantos dias de âmbito internacional. Só não sei é se haverá coisa assim tão mísera que só mereça um dia em cada ano! Já no longínquo século terceiro antes de Cristo, mesmo insinuando ser um gazeteiro, pois afirmou que ‘o muito estudo cansa o corpo’ (Ecl 12,12), o sábio Coelet do Eclesiastes, ou atualizou o que já corria de boca em boca, ou arrancou mesmo do seu toutiço uma conclusão que, face às perguntas deste nosso tempo, não está assim tão fora de prazo como os iogurtes envelhecidos. Ele sabia que no tempo há tempo para tudo. Mas, olhando à sua volta, escutando e mirando o que se passava, entendia que o tido como certo e mais que comprovado era posto em causa, e o que fazia mover as pessoas e a sociedade em geral era uma fantasia, uma corrida desenfreada atrás do vento, uma maluqueira maluca a fazer perder o sentido da vida e a constatar que, apesar de tanto canseira, “geração vai, geração vem, e a terra permanece sempre igual’ (Id.1,4). Entre nós, hoje, também não falta quem rabuje pelo facto de, na sua perceção (como agora se diz), aquilo que se tinha como certo - e bom! -, ser abandonado sem nada que o substitua ou supere. Ao mesmo tempo, dentro da sua mesma perceção, ora baloiçam entre o usufruir à farta do antigo e o dizer mal de quem o construiu, ora gozam à brava o presente mas maldizem-no e esconjuram quem o suporta e conduz, ora anunciam um futuro de maravilhas tão excelentes que até o maravilhoso mundo da Alice ficará a anos-luz de distância. A sua conclusão é excelente e radical, assim o presumo eu já que eles a guardam como um grande segredo: “Nós é que somos e sabemos! Se não formos nós a segurar musculadamente nas rédeas e a presidir aos destinos pátrios, só haverá mais do mesmo: ‘geração vai, geração vem’ e nada de novo acontecerá debaixo do sol, não haverá novidade que se preze, só a derrocada total, até dos escombros!”
Jesus, que revolucionou a história, não veio para destruir, veio para aperfeiçoar. Não desprezou o passado, não se manifestou senhor do presente, apontou para um futuro feliz construído por todos, sem exclusões nem peneiras. Nessa perspetiva e nessa esperança, apreciamos a dialética democrática, esse processo de diálogo e debate, onde diferentes ideias, interesses e opiniões se confrontam em busca de algo novo, tanto quanto possível fruto das achegas de todos, para que, quem de direito e de dever, possa agir melhor em favor do bem comum, do bem estar coletivo, do progresso e do desenvolvimento sustentável. Muito ajuda neste processo a interação sadia dos poderes legislativo, judicial, executivo e a fidelidade à Constituição, a qual, neste momento, persente que anda mouro na costa, pois, se assim não fosse, um grupo de Juristas de Coimbra não teria posto a correr uma petição pública que pode ser subscrita por quem se associe à sua defesa.
Como vínhamos a falar, no processo democrático do bem fazer, ninguém pode agir como se tivesse o monopólio do presente, ninguém pode romper com o passado só porque sim, ninguém, nos seus delírios ideológicos ou subestimando a realidade em favor da ideia, deve prometer aquilo que não é capaz de dar. Tal como Jesus fez, a democracia deve respeitar o passado e a tradição, deve respeitar o trabalho daqueles que vieram antes, que se esforçaram por nos oferecer o melhor que puderam e como o entenderam, deve assumir o dever de aperfeiçoar essa herança, tanto quanto necessário e possível, pois nem tudo será de manter, nem tudo tem o mesmo valor, nem tudo, hoje, será conveniente à pessoa e à sociedade, mas tudo pode ser retificado, completado e aperfeiçoado. Ter a pretensão ensoberbada de descartar todos e tudo quanto vem do passado para começar do zero, do nada, como se isso fosse possível, como se antes nada e ninguém tivesse existido, como se o hoje não dependesse do ontem e o amanhã do hoje, como se agora é que se inventou a pólvora, não será boa atitude democrática, não manifesta bom senso, reconhecimento, gratidão, evolução, crescimento. Ora, este Dia Internacional da Democracia tem o propósito de enaltecer, reafirmar, promover e proteger a dita cuja e os seus valores, com a colaboração individual e coletiva, o apoio da comunidade internacional, da sociedade civil e de todos quantos defendem os valores democráticos. Mesmo que muito se tenha trabalhado nessa área, há, por esse mundo além, quem, embora sabendo que o tempo deve servir para nascer, plantar, construir, rir, bailar, incluir, abraçar, amar e ter paz, preferem ofender, arrancar, destruir, dividir, descartar, odiar, fazer guerra, matar...
Coisa levada da breca seria também se, agora que se aproximam as nossas eleições autárquicas e se apela à participação e ao voto como dever e valores democráticos, os políticos se apresentassem com discursos tais que criassem na opinião pública a ideia de que só falam verdade quando dizem mal uns dos outros. O respeito de uns pelos outros edifica, educa, constrói, atrai, gera confiança. A gritaria, a baixeza na linguagem e nos argumentos degrada, deseduca, destrói, afasta.


D. Antonino Dias - Bispo Diocesano
Portalegre-Castelo Branco, 12-09-2025.


Como continuar confiando em Deus quando a vida parece difícil demais

 




Santa Teresinha nos encoraja a confiar na misericórdia de Deus, especialmente quando não somos fiéis a Ele


Uma das primeiras coisas que acontece quando a vida fica difícil é deixarmos de permanecer fiéis a Deus. Observamos nossas vidas e pensamos: "Onde o Senhor está, Deus?". Isso fica ainda mais acentuado quando nossa força de vontade é enfraquecida e sucumbimos a várias tentações.

Em momentos como estes, Santa Teresinha do Menino Jesus nos exorta a correr como uma criança nos braços de nosso Pai Celestial:

"[Uma criança que pecou] se joga nos braços de seu pai, dizendo que lamenta tê-lo machucado, que o ama e que provará isso por ser bom a partir de agora ... Então, se essa criança pedir ao pai para puni-la com um beijo, não acho que o pai possa endurecer seu coração contra a confiança de seu filho, conhecendo sua sinceridade e amor."

Uma ação como essa requer uma profunda confiança em Deus, vendo-O não como um pai vingativo que castiga desnecessariamente seus filhos, mas como um pai amoroso e misericordioso, pronto para nos receber e curar nossas feridas.

Santa Teresa fala essas palavras por experiência própria, pois admite à sua irmã que não é perfeita:

"Receio não ter dito o que devo; talvez você pense que eu sempre faço o que estou dizendo. Ah não! Nem sempre sou fiel, mas nunca desanimo; eu me abandono nos braços de Jesus. A pequena gota de orvalho vai mais fundo no cálice da flor dos campos e lá encontra novamente tudo o que perdeu e muito mais."

Esta a imagem de correr para Jesus e permitir que ele nos abrace é uma ilustração muito amada de Santa Teresa. Ela volta a isso com frequência em seus escritos e incentiva os outros a terem uma confiança semelhante em Deus.

Quando os tempos ficam difíceis e começamos a duvidar da bondade de Deus, a melhor coisa a fazer é correr para ele. Mas isso requer um coração filial, que não teme a ira de Deus, mas confia em sua misericórdia.


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quinta-feira, 11 de setembro de 2025

A vida... como é!



A minha conexão espiritual nao vive nas alturas, vive no dia a dia.
Faz integralmente parte de mim.

Abro-me às experiências da vida. O que é aparentemente bom e aparentemente mau. Porque vivemos nesta dualidade. Neste mundo de ilusão; e compreendo que está tudo bem.

O que realmente importa costuma ser invisível. "Às vezes luto, às vezes danço com Deus".

No fundo, eu sei que é na vida de todos os dias que tocamos o divino. É nesse movimento inacabado que eu o encontro.

A vida é o lugar perfeito. Abraço-a. E nesse abraço reconheço, que tudo já está aqui.

Boa semana!


Carla Correia

quarta-feira, 10 de setembro de 2025

Quem não renuncia a todos os seus bens...




«Fazei brilhar sobre mim, Senhor,

a luz do vosso rosto…»


A cada amanhecer Te procuro,

para entender os Teus desígnios.

És Tu, Pai, quem me busca e me ilumina com a Tua Palavra de Amor.


No caminho da Vida,

tomo, alegremente, a minha Cruz.

És Tu, Jesus, quem me acompanha.


Ao irmão, que por mim passa,

ofereço um gesto de amor.

És Tu, Espírito Santo, quem abre os meus braços.



Só podemos amar a Deus,

o Seu projeto de Paz (que nos faz lutar),

a Sua infinita Misericórdia (que não obedece ao nosso padrão de justiça),

o Seu Perdão incondicional (que precisamos dar para possuir)…

se vivermos, a cada dia, a Sua Palavra com Fé…

E, se permitirmos que o Senhor da Vida nos ilumine com a Sua Sabedoria.


“Então, saberemos qual o caminho a seguir…

Encontraremos a razão de existir.”


Hoje, para levarmos Jesus a Todos e Todos a Jesus,

neste caminho de Páscoa,

façamos da nossa Vida uma Cruz de Esperança, para quem está triste.

Uma Cruz saborosa como o Pão da Eucaristia, para quem tem fome.

Uma Cruz colorida que dá alento, a quem está oprimido.

Uma Cruz que é união na Família, paz no Mundo e amor na Alma da humanidade.


Que tenhamos a coragem e a verdadeira conversão de coração

ao rezarmos baixinho:

“Sim, Senhor, eu quero seguir-Te… sempre!”


Liliana Dinis

terça-feira, 9 de setembro de 2025

Irmã Markéta Maria da Alegria recebe hábito no Mosteiro de Campo Maior da Ordem da Imaculada Conceição

Jovem da República Checa esteve nas Jornadas Mundiais da Juventude de 2023 em Lisboa


Foto: Pedro Miguel Conceição/ jornal a defesa

Évora, 08 set 2025 (Ecclesia) – A Comunidade das Monjas Concepcionistas da Ordem da Imaculada Conceição do Mosteiro de Campo Maior viveu “a alegria” da celebração da tomada de hábito da postulante Markéta Janovská, presidida pelo Arcebispo de Évora.

O ritual da Tomada de Hábito, dia 06 deste mês, antecedeu a celebração da Eucaristia e o momento marcante foi “o corte de cabelo como sinal de despojamento das vaidades do mundo”, lê-se numa nota enviada à Agência ECCLESIA.

Após vestir o hábito, foi anunciado que a partir de agora a jovem Marketa assume o nome de Sor Marketa Maria da Alegria.

A Markéta é uma jovem de 22 anos, natural da República Checa e fez o seu percurso de fé inserida numa Comunidade do Caminho Neocatecumenal, com quem passou pelo Mosteiro durante as Jornadas Mundiais da Juventude de 2023
em Lisboa
.
Foto: Pedro Miguel Conceição/ jornal a defesa

“O testemunho da Markéta é uma prova visível de que a Deus nada é impossível, nem mesmo as distâncias ou a barreira linguística”, sublinha a Comunidade das Monjas Concepcionistas.

“Seguir a Cristo, mediante a oração e a imitação da pureza de Nossa Senhora a exemplo de Santa Beatriz é o carisma da nossa Ordem, o qual a jovem Markéta deseja experimentar mais intensamente, aceitando fazer a vontade do Senhor, e por isso inicia agora o Noviciado com a cerimónia da Tomada de Hábito, que é a expressão visível deste desejo de se entregar ao Senhor e de cortar com as vaidades do mundo”, afiança a Comunidade.

Na homilia D. Francisco Senra Coelho afiançou que a Markéta é “o sorriso de Deus para o Povo de Deus e para a Humanidade”.
Foto: Pedro Miguel Conceição/ jornal a defesa

“O chamamento à vocação e o sim da Markéta é a certeza que Deus nunca abandona o seu povo. É sinal de esperança e motivo de júbilo para esta Comunidade Concepcionista, para a Arquidiocese e para toda a Igreja”, referiu.

“Nesta atitude de resposta radical ao Amor de Deus é que nasce a Alegria”, afiançou o Arcebispo de Évora, desafiando todos “a darmos o nosso sim ao Amor de Deus”.

Perante a escassez de vocações em alguns lugares do mundo, o prelado referiu que “o homem de hoje tem dificuldade em assumir-se membro de uma Igreja”.

“O Senhor não se importa com números, mas sim com a verdade. Não devemos colocar o cristianismo em saldos por causa do número de vocações”, referiu, apelando que a “nossa atitude deve ser sempre de fidelidade ao Evangelho”.

No final da celebração a jovem Sor Marketa Maria da Alegria deu testemunho da sua felicidade afiançando que “quero ser toda de Cristo, quero entregar-me toda a Deus”, comunicando com um sorriso aberto e uns olhos brilhante.

LFS

segunda-feira, 8 de setembro de 2025

Troca os espelhos por janelas



As janelas são uma espécie de ponte entre o interior e o exterior. Há quem as feche e que ainda ponha cortinas, o que impede toda a comunicação entre um lado e o outro.

Há, em cada um de nós, uma janela onde ocorre um encontro interessante: o que nos habita procura saber mais sobre o mundo, e o mundo, por sua vez, tem vontade de espreitar para dentro de nós. Se abrirmos a janela, deixamos que o vento e a luz entrem, e quem está de fora pode ver-nos melhor; assim, também nós podemos aprender mais sobre tudo o que há para além de nós.

Mas, se a vontade de encontro e da troca é muito importante, não é suficiente para que possamos tirar o melhor proveito. A janela não olha. Mais do que abrir a janela, importa saber olhar. Há quem abra a janela, mas feche os olhos. Há quem os tenha abertos, mas teima em não ver senão aquilo que quer ver e ignorando, com uma teimosia orgulhosa, o que está diante de si.

Quem assim fecha as cortinas, ainda que tenha os olhos abertos e nos pareça sensato, não vê senão… as suas próprias cortinas.

É bom estar à janela, atento como uma criança que sabe que tem muito para aprender. Um pôr do sol, do início ao fim, é um dos mais belos espetáculos que podemos contemplar. No entanto, são poucos os que deixam tudo de lado por meia hora para assistir à chegada da noite.

É bom estar à janela do nosso coração e ver a vida ao nosso redor. Não nos deixemos inebriar e corromper por tantas falsas janelas que prometem muito, mas apenas nos mostram mundos que não existem e cujo único objetivo é consumir-nos.

Não nos deixemos levar pelas ilusões. Troquemos os espelhos (de todos os tipos) por janelas que nos abram à verdade do mundo e aos outros!


José Luís Nunes Martins

domingo, 7 de setembro de 2025

O CAMINHO

 



Nas leituras que a liturgia deste domingo nos propõe sobressai a temática do “caminho”: a nossa vida é um caminho, nem sempre linear, nem sempre fácil, que nos leva até à meta final da nossa existência, a vida verdadeira e eterna. O que devemos fazer e que precauções devemos tomar para não nos desviarmos e falharmos o alvo? Quem nos conduzirá e nos apontará a direção certa?

Na primeira leitura, um “sábio” de Israel reflete sobre as limitações que são inerentes à nossa condição de seres humanos. Ele acredita que a única forma de chegarmos à vida verdadeira é acolhermos a “sabedoria” de Deus e deixarmo-nos guiar por ela. É esse o caminho que ele sugere a todos aqueles que se preocupam em construir uma vida plena de sentido.As modernas tecnologias de comunicação revolucionaram a nossa forma de nos relacionarmos uns com os outros. Fizeram com que todos os habitantes da “aldeia global” ficassem em rede e pudessem partilhar ideias, opiniões, perspetivas, teorias, apreciações, observações, críticas positivas e negativas… Tudo isto pode ser profundamente enriquecedor: pode aproximar-nos de pessoas com outras experiências e vivências, ajudar-nos a entender a verdade do outro, tornar-nos mais tolerantes, mostrar-nos o sem sentido dos nossos preconceitos, abrir-nos à partilha e à comunhão, oferecer-nos conhecimentos a que de outro modo não teríamos acesso. Mas, em contrapartida, todo esse ruído de fundo de ideias e opiniões que a cada instante invade a nossa vida, pode confundir-nos e interferir com a nossa capacidade de fazermos escolhas convenientes. Levados pela “onda”, vamos assumindo acriticamente, sem nos darmos conta, a ideologia dominante, os “valores” que os líderes de opinião procuram impor, as visões da maioria… Será que tudo isso que a “vaga” tecnológica traz até à nossa “praia” nos conduz no sentido da vida plena, da realização total, da verdadeira felicidade?

No Evangelho, Jesus traça as coordenadas do “caminho do discípulo”. Quem se dispõe a percorrer esse caminho, deve caminhar de olhos postos em Jesus e no Reino de Deus. Não pode deixar-se distrair, nem pelas pessoas, nem pela preocupação dos bens materiais, nem pelos seus projetos e interesses pessoais. Quem embarca na aventura do Reino de Deus tem de fazê-lo sem reticências, sem condições, com total empenho e compromisso.Paulo põe o amor no centro de toda a experiência cristã. Ele acredita, na linha de Jesus, que o amor é o valor fundamental na construção de um mundo renovado. A injustiça, a exploração dos seres humanos, a escravatura, a guerra, não desaparecerão através do recurso a métodos violentos. Os métodos violentos só servirão para substituir uns senhores por outros senhores, uns escravos por outros escravos, uns sofredores por outros sofredores. A construção de um mundo mais feliz e fraterno só acontecerá com a conversão dos corações ao amor. Quando essa conversão se der e nascer a civilização do amor, teremos finalmente um mundo mais humano, mais justo, mais pacífico. É esta também a nossa convicção? Estamos disponíveis para nos convertermos ao amor e sermos arautos – com palavras e gestos – de um mundo mais fraterno?

Na segunda leitura, a partir da história de Onésimo, o escravo fugitivo, São Paulo lembra-nos que o amor é o foco fundamental que ilumina o caminho que os discípulos de Jesus percorrem na história. É o amor que nos permite descobrir a igualdade de todos os homens, filhos do mesmo Pai e irmãos em Cristo; é o amor que nos permite acolher e abraçar todos os “Onésimos” que encontramos no caminho.Paulo põe o amor no centro de toda a experiência cristã. Ele acredita, na linha de Jesus, que o amor é o valor fundamental na construção de um mundo renovado. A injustiça, a exploração dos seres humanos, a escravatura, a guerra, não desaparecerão através do recurso a métodos violentos. Os métodos violentos só servirão para substituir uns senhores por outros senhores, uns escravos por outros escravos, uns sofredores por outros sofredores. A construção de um mundo mais feliz e fraterno só acontecerá com a conversão dos corações ao amor. Quando essa conversão se der e nascer a civilização do amor, teremos finalmente um mundo mais humano, mais justo, mais pacífico. É esta também a nossa convicção? Estamos disponíveis para nos convertermos ao amor e sermos arautos – com palavras e gestos – de um mundo mais fraterno?


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DOIS JOVENS VIVAÇOS E SANTOS, COMO CONVÉM!...



Domingo, 7 de setembro, Carlo Acutis e Pedro Jorge Frassati são canonizados pelo Papa Leão XIV. A Canção Nova e o Vaticano News, com início às 9 horas, fazem transmissão em direto. O mundo precisa de jovens desta têmpera, traquinas e santos, verdadeiros profetas da mudança. Recordo alguns dados das suas vidas, baseando-me em tanto que sobre eles se tem escrito. Um faleceu com 15 anos de idade, o outro com 25. Foram patronos de Jornadas Mundiais da Juventude.

CARLO ACUTIS
Em outubro de 2006, falecia Carlo Acutis, um jovenzinho que soube marcar a diferença. Embora tivesse nascido, em 1991, em Londres, foi Milão que o viu crescer. Cheio de vida e alegre como todos os jovens, a todos cativava pela sua serenidade e entusiasmo pela vida. Antónia Salzano e Andrea Acutis, seus pais, ainda relativamente novos, sempre foram credíveis no seu testemunho de fé e nunca delegaram o seu dever de educar na fé. Dotado de uma inteligência acima da média e apaixonado pela vida, Carlo entendera bem o chamamento à santidade e quanto bem podia fazer pelos outros, com gestos simples, realizados com amor. Alegre e altruísta, sempre animado, foi voluntário em muitos projetos, sobretudo dirigidos para os mais necessitados. De noite saía de casa com comida e bebidas quentes para os sem-abrigo, com os quais também partilhava as suas economias. A Eucaristia era para ele um bem precioso, indispensável, era a autoestrada para o céu, como ele dizia. Tornou-se popular e muito apreciado, um exemplo de fé concreta e alegre, testemunhando elevada maturidade espiritual. A sua história despertou profunda admiração e comoveu muitíssima gente. Fascinado por lugares sagrados, visitava os santuários, não esquecendo aqueles em que se falava de milagres eucarísticos. Em 2002, esteve em Fátima e no Santuário do Santíssimo Milagre, em Santarém. Já tinha iniciado a criação de um mapa dos locais onde teriam acontecido milagres eucarísticos, pois tinha vontade de fazer uma exposição internacional. Se Francisco de Assis era o seu santo predileto, ele tinha grande devoção ao Anjo da Guarda e à oração do terço diário, frequentava os sacramentos.
Criou um site dedicado aos milagres eucarísticos e à vida dos santos, procurando ajudar aqueles que desejavam marcar a diferença. Tornou-se um profeta da mudança, soube utilizar as redes sociais, foi criativo e genial, usando as técnicas de comunicação para transmitir o Evangelho, para comunicar valores e beleza. Das Filipinas a Cabo Verde, do Brasil à China, em todo o mundo está presente esta sua herança espiritual. Deixou-nos o testemunho de uma “outra forma de viver a juventude”. Fez “brilhar os traços da idade juvenil em toda a sua beleza”. Imaginava um futuro melhor e possível, resolveu ajudar a construí-lo sem querer ser fotocópia de quem quer que fosse. Sabia-se e queria ser original com os dons que o Senhor lhe tinha dado, pois afirmava que “todos nascem como originais, mas muitos morrem como fotocópias”.
Uma leucemia fulminante, porém, levou-o para junto do Senhor, a quem amava e anunciava, tinha apenas 15 anos: "Estar sempre junto com Jesus: este é o meu plano de vida" dizia ele. No seu funeral, havia migrantes, alguns muçulmanos e hinduístas que o conheciam pela empatia que gerava. Como refere a Sagrada Escritura, “até os jovens se cansam e afadigam; até os rapazes tropeçam e caem, mas os que põem a sua esperança em Deus renovam as suas forças, abrem asas como as águias, correm e não se fatigam, caminham e não se cansam” (Is 40, 30-31).

PIER GIORGIO FRASSATI
Pedro Jorge Frassati também soube marcar a diferença. É capaz de rasgar horizontes no coração daqueles que andam à procura de vida com sentido. Comprova que a santidade, sendo tarefa que não se pode delegar, é possível a todos: crianças, jovens e menos jovens, cada um pelo seu caminho e nas suas circunstâncias existenciais. Nasceu em Turim, em 6 de abril de 1901. Aí viveu e cresceu, a maior parte da vida, no seio de uma família abastada e da alta burguesia. Seu pai, Alfredo Frassati, era jornalista, fundador e dono do jornal "La Stampa". Foi embaixador em Berlim, demitiu-se quando Mussolini assumiu o poder. Sua mãe, Adelaide Ametis, era uma pintora famosa. Embora fosse educado cristãmente, a vivência da fé em família ficava muito aquém do que ele desejava. Sua mãe animava-o a comprometer-se nas dinâmicas da paróquia. Aí foi fazendo o seu caminho, em vida feliz e socialmente comprometida, espevitando o seu crescimento espiritual e a sua ação apostólica. Conheceu a Ordem Terceira dos Dominicanos, a Ação Católica, o Apostolado da Oração, a Liga Eucarística, a Associação dos jovens adoradores universitários, os centros da Juventude Mariana Vicentina e a Conferência de São Vicente de Paulo. Tinha como passatempo favorito visitar os doentes e os casebres das periferias de Turim. “Ao redor dos pobres e dos enfermos eu vejo uma luz particular que nós não temos”, ou: “Jesus faz-me visita cada manhã na Comunhão, eu restituo-a no mísero modo que posso, ou seja, visitando os pobres”. Porque levava às casas dos mais necessitados as mais variadas coisas, desde lenha e roupas a alimentos e móveis, porque gastava a mesada que a família lhe dava nestas atividades caritativas, os seus colegas chegaram a denominá-lo como a “Empresa de Transportes Frassati”.
Porque entendia que a Caridade não era suficiente e que eram precisas reformas sociais, foi um dos fundadores do jornal “Momento”, destinado a explanar os ensinamentos sociais do Papa Leão XIII. Chegou a ter polémicas acesas com adeptos do Partido Fascista e esteve inscrito no Partido Popular Italiano. Como desejava trabalhar perto dos operários pobres, decidiu estudar Engenharia Industrial Mecânica, em Turim, com especialização em mineração, pelo facto de os mineiros serem os operários mais pobres de entre os explorados. Quando esteve em Berlim, em tempos que seu pai era Embaixador, ainda pôs a questão de vir a ser sacerdote, ideia que logo deixou por achar que não tinha vocação. Seus pais queriam exigir dele mais do que ele aparentava querer. O pai chegou a classificá-lo de “homem inútil” e à deriva, acompanhando pessoas que não estavam à sua altura. Pedro Jorge sorria, aceitava as repreensões de modo sereno, sabia lidar com todos. Gostava do teatro, da poesia, da arte, da música, da ópera, de visitar museus, recitava versos de Dante Alighieri de cor, escrevia com beleza e profundidade, amava o desporto, sobretudo o esqui e o montanhismo, escalou os Alpes e o Vale de Aosta, adorava as montanhas, extasiando-se a contemplar o ar puro e a beleza do Criação. Nesta sua maneira séria e divertida de estar na vida, chegou a fundar a “Sociedade de Tipos Estranhos” ou dos “arruaceiros”, cujos membros, “desonestos e vigaristas”, recebiam apelidos engraçados. O dele era “Robespierre”. Faziam excursões, contavam piadas, mas, sobretudo, aspiravam à amizade mais profunda fundada na oração e na fé.
Atingido por uma meningite fulminante, faleceu cerca de quinze dias depois, em 4 de julho de 1925, com apenas 24 anos de idade. Milhares de pessoas participaram nas exéquias. Familiares e amigos ficaram estupefactos com a presença de tantos pobres de Turim que ele havia ajudado, material, social e espiritualmente. Seu pai ficou inconsolável e arrasado pelo vazio que a morte de Pedro lhe causara. Impressionado com a multidão presente, reconheceu que só compreendeu bem quem era o seu filho quando o perdeu para sempre. Aos poucos, foi-se aproximando da fé numa conversão maravilhosa que muitos consideraram ser o "primeiro" milagre de Pedro Jorge. É amado e venerado em todo o mundo, desde a Patagónia à Polónia, das Filipinas à França, dos Estados Unidos à Austrália.

D. Antonino Dias . 
Bispo Diocesano
Portalegre-Castelo Branco, 06-09-2025.

sábado, 6 de setembro de 2025

A mudança começa hoje, agora, comigo, contigo!


O lugar que vivemos evoca a tensão de viver, trabalhar e forjar relações que nem sempre são simples e pacíficas: falam da complexidade da vida, feita de luz e sombra, felicidade e sofrimento, e das responsabilidades que devemos carregar, por vezes dolorosas.

O passar dos dias é muitas vezes uma sucessão de ações, coisas para fazer ou pensar, que nos impedem de viver o tempo, com relações duradouras e profundas.

Um tempo mais descontraído pode preparar-nos para uma ligação mais acolhedora e humanizadora connosco próprios e com os outros.

As férias permitem-nos viver um espaço e um tempo diferentes, não só fisicamente, mas também espiritualmente: a simplicidade, a autenticidade e a espiritualidade.

Quase nos tornámos pessoas diferentes, menos perdidas e mais solidárias, capazes de criar laços simples e próximos. Durante as férias, cumprimentamos as pessoas ou aqueles com quem partilhamos o caminho, sem medo nem preconceitos.

O outro, já não é um inimigo do qual precisamos de nos defender, ou um estranho que nos ameaça ou nos tira algo, mas uma pessoa como eu.

Então é natural ser solidário, brincar com estranhos, saborear como é bonito estar juntos como irmãos...

Redescobrimos a nossa identidade que é relacional. Somos feitos uns para os outros, para o encontro, para a comunhão. Nada somos sem o outro.

É o renovar, não só da energia mas também da Esperança! Depois de desfrutar da simplicidade de uma vida mais humana e fraterna, acreditamos que é possível construí-la a cada dia que passa.

A Esperança cristã não é um tranquilizante nem um analgésico para a nossa rotina do quotidiano, mas é aquele impulso interior que, iluminado pela fé na Páscoa de Jesus, nos impele a não desistir de crer na vida. Convida-nos a arregaçar as mangas para poder dar sinais positivos ao nosso mundo.

É um tesouro que não pode ser guardado numa mala, conservado durante um ano, mas uma pérola preciosa para ser cultivada e feita brilhar no lar, aberta ao convívio e ao acolhimento de todos, todos, todos os nossos irmãos.

Que a lembrança de umas férias em que experimentamos descanso e confraternização se torne para todos uma oportunidade de forjar novas relações no quotidiano marcado pelo trabalho e pela família.

A mudança começa hoje, agora, comigo, com cada um de nós, sem esperar pelo amanhã ou por alguma solução milagrosa: hoje pedem-me para ser responsável e comprometido em tecer o bem na minha família, onde trabalho, no meu tempo livre...


Paulo Victória

sexta-feira, 5 de setembro de 2025

A ONU E O DIA INTERNACIONAL DA CARIDADE



Na sua Resolução de 17 de dezembro de 2012, a Assembleia Geral das Nações Unidas decidiu designar o dia 5 de setembro de cada ano - dia do aniversário da morte de Santa Teresa de Calcutá -, como Dia Internacional da Caridade. A data foi escolhida para homenagear esta mulher, Prémio Nobel da Paz. O maior prémio que recebeu, porém, foi, sem dúvida, o da ‘incorruptível coroa de glória’, o qual lhe foi atribuído pelo Senhor da prova, o Justo Juiz, por ela ter atingido a meta a servir com alegria e amor: é santa canonizada! Nascida em 1910 na atual Macedónia do Norte, faleceu a 5 de setembro de 1997, com 87 anos, reconhecida mundialmente pela sua dedicação aos mais desfavorecidos, independentemente da sua religião, raça ou condição social. A sua vida foi acolher, cuidar, acompanhar, dignificar, fortalecer e aliviar o sofrimento das pessoas que se encontravam em situações de maior vulnerabilidade. Pautou a sua vida por aquilo em que verdadeiramente acreditava: “ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver caridade, sou como bronze que ressoa ou como símbolo que retine. Ainda que eu tenha o dom da profecia e conheça todos os mistérios e toda a ciência, ainda que eu possua a plenitude da fé, a ponto de transportar montanhas, se não tiver caridade, nada sou. Ainda que distribua todos os meus bens aos famintos e entregue o meu corpo para ser queimado, se não tiver caridade, de nada me aproveita. A caridade é paciente, a caridade é benigna; não é invejosa, não é altiva nem orgulhosa; não é inconveniente, não procura o próprio interesse; não se irrita, não guarda ressentimento; não se alegra com a injustiça, mas alegra-se com a verdade; tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. O dom da profecia acabará, o dom das línguas há de cessar, a ciência desaparecerá; mas a caridade não acaba nunca” (1Cor 13)
A Organização das Nações Unidas está consciente de que a caridade contribui para sociedades mais inclusivas, resilientes e justas, alivia os piores efeitos de crises humanitárias, dispõe o coração para servir o próximo, gratuitamente, levando as pessoas a agir com compaixão e generosidade em cada circunstância do seu dia-a-dia. Para nós, cristãos, agir na caridade é participar na realeza de Jesus Cristo, que veio para servir e não para ser servido. A caridade é “o dom mais alto que o Espírito dá em ordem à edificação da Igreja e ao bem da humanidade. A caridade anima e sustenta a solidariedade ativa que olha para a totalidade das necessidades do ser humano. Uma caridade assim, atuada não só pelos indivíduos, mas também, de forma solidária, pelos grupos e pelas comunidades, é e será sempre necessária: nada e ninguém a pode e poderá substituir, nem sequer as múltiplas instituições e iniciativas públicas, que também se esforçam por dar resposta às carências - muitas vezes hoje tão graves e generalizadas - de uma população. Paradoxalmente, essa caridade é tanto mais necessária quanto mais as instituições, ao tornarem-se complexas na organização e pretendendo gerir todos os espaços disponíveis, acabam por se esvaziar devido ao funcionalismo impessoal, à burocracia exagerada, aos interesses privados injustos e ao desinteresse fácil e generalizado” (ChFL 41).
No entanto, quer se aceite como uma das virtudes teologais, quer se veja como sinónimo de filantropia, quer se tenha como expressão de solidariedade ou de mero desejo de fazer o bem, quer se entenda como apoio aos mais necessitados e desfavorecidos ou a outras causas sociais e culturais, a caridade só será Caridade se não procura o seu próprio interesse, se for fruto do amor efetivo que não espera recompensa.
Esta iniciativa, que contribui para a erradicação da pobreza e do desenvolvimento sustentável, se já reconhece o papel de quem abnegadamente se dá a estas causas, procura envolver, ainda mais, o setor privado, a sociedade civil, o voluntariado e todas as iniciativas do bem-fazer. A caridade envolve, orienta, impulsiona, gera esperança e energia saudável, afasta da indiferença, faz da sociedade uma sociedade mais humana e mais solidária, manifesta atenção, cuidado, partilha, compromisso: semeia a paz! Integrar a caridade na vida diária deveria constituir um desafio para cada pessoa e cada instituição. São estes gestos de amor que transformam quem os recebe e quem os dá, seja através de iniciativas de vulto, seja através de um simples sorriso, duma palavra de estimulo, duma ajuda surpresa, dum pequenino gesto de amor. Além disso, a caridade sustenta o mutualismo que organiza a solidariedade com estruturas de cooperação a durar no tempo. Cria redes de apoio no campo da deficiência, da saúde, da educação, da habitação, do desporto, da cultura e doutras iniciativas e projetos de relevância.
“Assim como Eu vos amei, também vós deveis amar-vos uns aos outros. Se tiverdes amor uns para com os outros, todos reconhecerão que sois meus discípulos”, disse-nos Jesus (Jo 13, 34).


D. Antonino Dias - Bispo Diocesano
Portalegre-Castelo Branco, 05-09-2025