terça-feira, 21 de junho de 2016

SÃO JOÃO SÃO JOÃO TRAZ O ARCO E O BALÃO


A liturgia celebra a morte dos santos. O único santo de quem se celebra também o nascimento é João Batista. Sabemos que sua mãe era Isabel, uma senhora idosa e estéril, da descendência de Aarão. Seu pai, Zacarias, era um sacerdote do grupo de Abias. Ambos eram de idade avançada e justos diante de Deus (cf. Lc 1, 5-6). Desejavam ter um filho. Apesar da promessa de que iria ter um filho, Zacarias, consciente da idade avançada dos dois, duvidou daquela conversa do Anjo e saiu-lhe cara a brincadeira: ficou mudo até que tudo acontecesse. Mas o desejado pimpolho não se fez esperar, traquina e saudável lá veio à luz do dia. Segundo nos narra S. Lucas, a Anjo havia dito a Zacarias que o menino ia ser grande diante do Senhor e seria cheio do Espírito Santo desde o ventre materno (cf. Lc 1, 15-16). Oito dias após o nascimento, foram circuncidá-lo e queriam dar-lhe o nome de seu pai, Zacarias. A mãe, Isabel, bateu o pé e disse que não, que havia de chamar-se João. Os vizinhos diziam que sim, que deveria chamar-se Zacarias, até porque ninguém na família se chamava João. Foi o pai, Zacarias, que acabou por resolver a contenda. Porque não podia falar, escreveu numa tabuinha: “João é o seu nome”. E pronto, ponto, ficou dito e decidido. No mesmo instante, a boca de Zacarias abriu-se, a sua língua soltou-se e começou a louvar a Deus. Todos se admiraram e se perguntavam: “O que irá ser este menino?” (cf. Lc 57-66). De formação austera e simples, pessoa humilde e firme nas suas convicções, João foi um grande profeta, um profeta de transição do Velho para o Novo Testamento. Denunciou o erro com coragem e determinação, anunciou a verdade com entusiasmo e esperança. Foi o percursor de Cristo. Aquele que deu testemunho da luz, mas não era a luz. O que apontou “o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo” e batizou Jesus no Jordão. As autoridades de Jerusalém, intrigadas sobre se não seria ele o Messias, mostravam-se atentas e curiosas. Desejavam saber quem, afinal, era aquele senhor tão estranho que se vestia com pele de camelo, se alimentava de gafanhotos e mel silvestre, congregava o povo que o ouvia com atenção e denunciava a falsa segurança dos fariseus e as intrigas políticas dos saduceus: “raça de cobras venenosas” (Mt 3,7). Enviaram-lhe, então, uma espécie de embaixada que lhe perguntou, com insistência de mosca, qual a sua identificação: “Tu quem és?” João, que tinha o seu cartão de cidadão em dia, não demorou: “Eu não sou o Messias”. Insistiram de novo: “Quem és, então? És tu Elias?” João retorquiu, com determinação: “Não sou”. Voltaram à carga: “És tu o profeta?”. João respondeu: “Não”. Sem resposta capaz para levar às autoridades, insistiram mais uma vez: “Quem és tu, para podermos dar uma resposta aos que nos enviaram? Que dizes de ti mesmo?”. João responde: “Eu sou a voz de quem grita no deserto: endireitai o caminho do Senhor”. Porque não teriam entendido muito, voltam a perguntar: “Então porque é que batizas, se não és o Messias, nem Elias, nem o Profeta?” João responde serenamente e acaba por encerrar a entrevista: “Eu batizo com água, mas no meio de vós está Alguém que vós não conheceis e que vem depois de mim. Eu não mereço nem sequer desatar-lhe a correia das sandálias” (Jo 1, 19-28). Esta estranha postura aliada à forte e revolucionária pregação de João incomodaram muita gente, a começar pelas próprias autoridades. O Imperador temia que a fama e a simpatia de João provocassem uma revolta contra ele, Imperador. O próprio Herodes não aguentou por muito mais tempo este fora de série que cativava o povo e denunciava a hipocrisia dos costumes, de forma dura e seca, sem medo nem enredos. Mandou-o prender, algemar e colocar na prisão. Mateus diz que “Herodes …quisera mesmo dar-lhe a morte, mas teve medo do povo que o considerava um profeta” (Mt 14, 3-5). Mas Herodes não se fez esperar. Por motivos que envergonham a justiça e definem tal personalidade, mandou-o assassinar da forma mais leviana e desonrosa, a pedido de Herodíades, mulher de seu irmão Filipe, ainda vivo, e com a qual, ele, Herodes, mantinha uma relação amorosa. João afirmava-lhe, sem papas na língua: “Não te é permitido tê-la por mulher”. Na grande farra do seu aniversário, Herodes, por dá cá aquela palha, mandou-o decapitar e entregar a sua cabeça, num prato, à dita cuja mulher de seu irmão e sua companheira ou namorada, usando os eufemismos de hoje em dia. Assim morria aquele acerca do qual Jesus dissera: “Em verdade vos digo: entre os nascidos de mulher, não apareceu ninguém maior do que João Batista” (Mt 11,7-10). Educado na sadia exigência da verdade, no sentido de Deus e do bem, cumpriu a sua missão, com entusiasmo e zelo. Não foi cana agitada pelo vento, não embandeirou em arco, não foi balão de oxigénio sem peso nem valor. Foi grande na vida, foi grande na morte.
Dom Antonino Dias - Bispo de Portalegre- Castelo Branco

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