quinta-feira, 30 de novembro de 2023

Dar pérolas a…


Quantas vezes nos enchemos de palavras bonitas, inspiradas e repletas de amor e as entregamos de bandeja ao nosso interlocutor?

Quantas vezes pomos a melhor toalha, o melhor serviço de louça e a refeição preparada com todo o espero e a damos aos nossos convidados?

Quantas vezes damos o nosso melhor, as nossas capacidades, pensamentos, sonhos e loucuras ao serviço de algum projeto?

Quantas vezes damos pérolas…?

O resto do ditado já é sobejamente conhecido e, mais uma vez, a sabedoria popular, tem a capacidade de pôr em poucas palavras sentimentos tão intensos.

Esta é uma expressão que nos remete para a frustração que sentimos quando damos o nosso melhor, seja tempo, opiniões, ideias e conselhos e recebemos…

…ora indiferença…

…ora um condescendente aceno de cabeça.

Outras vezes somos nós que não sabemos aceitar as pérolas que nos dão em forma de palavras e gestos preciosos para quem o oferece. Estamos tão cheios de nós mesmos, dos nossos tesouros, que desvalorizamos a pérola que o outro nos oferece.

Vivemos de expectativas entre o que damos e o que recebemos e nem sempre o equilíbrio se encontra com facilidade. Nem sempre gerimos a frustração com a serenidade necessária de quem sabe discernir o que é uma pérola ou apenas uma pedra disfarçada de brilho.

Até lá saibamos dar pérolas a quem as quiser receber e saibamos fazer colares com as pérolas que nos quiserem dar. Quanto às pedras essas…faz o que quiseres, mas não as atires de volta.

E tu amiga, que pérolas dás tu?


Raquel Rodrigues

quarta-feira, 29 de novembro de 2023

Espera, mas não fiques à espera!



Não há quem não espere. Mas há uma enorme diferença entre os que vivem numa sala de espera e os que aproveitam cada dia da sua vida para construir aquilo que querem que um dia seja verdade.

As esperas ou são como uma canção de embalar que nos adormece ou como um desafio que nos desperta a alma para cumprir os sonhos!

A espera é uma alegria que dói. Qualquer fé é difícil porque é uma guerra declarada ao tempo. Mas a paciência, quando assente no amor, tudo suporta.

Assim como sofremos só por esperar o mal que acreditamos estar próximo, também a esperança é já motivo de alegria pelo bem que está para chegar. Quem espera ser feliz em breve já começou a sê-lo! Quanto maior e mais nobre é o que se espera, maior é o contentamento de o aguardar!

Quase todos nós seríamos capazes de viver sozinhos no deserto, mas apenas se lá estivéssemos à espera de alguém que amamos!

Não esperes por uma oportunidade especial para revelar o quanto amas a quem amas. Prova-o hoje, no que estiver ao teu alcance. Apesar de pequeno, tudo se fará grande quando o encheres com o teu amor.

A felicidade não te persegue, nem foge de ti… está à tua espera. À espera de que te levantes e trabalhes para a realizar.

Muito do que não esperas acontecerá. Quanto ao que esperas, só acontecerá se o puderes exigir a ti mesmo.


José Luís Nunes Martins

terça-feira, 28 de novembro de 2023

Anda gente a salvar o Mundo!


Anda gente a salvar o Mundo. E nós nem nos apercebemos disso. No meio de toda a azáfama damos por adquirido o que nos parece de fácil acesso, mas esquecemo-nos que o mais simples dos pormenores da nossa vida são assegurados por tantos e tantas. Há, por aí, quem se detenha em permitir que o mais simples aconteça no ordinário dos nossos dias e nem compreendemos o quão extraordinário são todos os seus atos.

Anda gente a salvar o Mundo. Há quem se preocupe verdadeiramente com os problemas dos outros. São pessoas que se desgastam por inteiro para que o outro possa ser. Dão tudo de si para que ninguém fique para trás. São gente que vive para solucionar o que parece irremediável. São mulheres e homens que, através da união e da partilha, vão criando verdadeiros milagres.

Anda gente a salvar o Mundo. São pessoas que dão o seu tempo sem querer nada em troca. Dão-se por reconhecerem o impacto que podem ter nos outros. Não procuram protagonismo, nem certificados. Dão-se porque sabem que a vida só se alarga quando nos entregamos em serviço. São gente que vai para além do altruísmo egoísta. São mulheres e homens que se comprometeram a ser missionários do amor.

Anda gente a salvar o Mundo. E quem são estas pessoas? Pensa: quantos e quantas andam empenhados em abraçar o sofrimento dos outros? Quantos e quantas se disponibilizam verdadeiramente para escutar os que caminham consigo? Quantos e quantas tiram do seu tempo para que o outro possa ser? Quantos e quantas movem rios e montanhas para que tantas causas sociais subsistam? Quantos e quantas permitem que o outro seja olhado e amado?

Anda gente a salvar o Mundo. E termos conhecimento disto dá-nos esperança, principalmente, num momento em que tudo parece estar desfragmentado. Termos conhecimento disto cria dinamismo, principalmente, num momento em que ninguém parece ter paciência e sensibilidade para os outros. Anda gente a salvar o Mundo. Consegues ter consciência disto?

Hoje, antes de caíres no desânimo, questiona-te: se até nós que somos olhados conhecemos o poder do olhar, quanto impacto poderá ter naqueles e naquelas que não se sentem olhados/as?


Emanuel António Dias

segunda-feira, 27 de novembro de 2023

Jornada Diocesana da Juventude (JDJ) 2023



O Secretariado da Pastoral da Juventude e Vocações (SDPJV) de Portalegre-Castelo Branco realizou a Jornada Diocesana da Juventude (JDJ) 2023, entre as 21h00, desta sexta-feira, 24 de novembro, e as 18h00, do dia seguinte, em Abrantes.

A JDJ 2023 começou com “algumas dinâmicas de conhecimento”, às 21h00, uma hora depois a Adoração pela Paz, e, às 23h00, os jovens partiram para as famílias de acolhimento.

Este sábado, dia 25 de novembro, a Jornada Diocesana da Juventude de Portalegre-Castelo Branco começou, pelas 09h00 com o acolhimento, pelas 11h00, iniciaram se nove workshops, com temas diversos como – ‘Fé, porquê e para quê?’; ‘O Namoro Cristão’; ‘Compromisso e Liberdade’; ‘Caminhos para os jovens’; ‘O cristão na era das redes e da ecologia integral’ -, antes do almoço partilhado.

O Secretariado Diocesano da Pastoral da Juventude e Vocações salientou que, a partir das 15h00, decorria uma “tarde cheia de atividades e surpresas”, e terminaram este encontro diocesano, um “fim-de-semana emocionante”, com a Eucaristia, às 18h00, na praça do Município de Abrantes.

Que a morte nos lembre de viver!


Não nos habituamos à morte.

A partida de alguém é sempre um susto. Um trago de ar que se engole e que não se deixa respirar. A alma fica suspensa numa espécie de tumulto capaz de nos fazer rever tudo e olhar para as coisas de outra maneira.

Não sabemos onde colocar a morte. E incómoda. Faz ferida e deixa, tantas vezes, a vida em carne viva. Não sabemos por onde ir. É como se a nossa bussola interna se desorientasse e as agulhas entrassem numa loucura sem retorno.

No entanto, sabemos que vivemos com a morte de mãos dadas com os dias que somos e temos. Vamos sendo visitados por ela, mais ou menos proximamente e vamos reajustando as nossas vidas quando a vemos pousar.

Mais do que pensar na morte, da qual não podemos escapar, faz-nos falta pensar mais na vida.

No quanto a tomamos por garantida.

No quanto a julgamos por certa.

Nas imensas vezes que nos esquecemos de dizer amor aos que são nossos.

No quanto vivemos apressados e sem rumo.

No quanto nos deixamos enredar por ritmos que não condizem com o do nosso coração.

Que saibamos fazer-nos um convite diário para não nos esquecermos de viver.

Que a morte nos lembre que tudo passa e que nada se pode repetir.

Que a morte nos lembre que as nossos podem não estar cá muito tempo e que devemos dedicar-nos a cuidar melhor deles.

Que a morte nos faça esquecer as brigas, as tristezas e as guerras e ser protagonistas de paz e de amor.

Ainda vamos a tempo de viver melhor hoje.

Para que um dia possamos dizer à morte que vivemos tão, mas tão bem.


Marta Arrais

domingo, 26 de novembro de 2023

MCC - Reflexão- Caminhada do Advento ao Natal

 


Participa, traz o teu entusiasmo e todos ficaremos mais fortes para acolher o NATAL.


Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo -

 


No 34º Domingo do Tempo Comum, celebramos a Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo. As leituras deste domingo falam-nos do Reino de Deus (esse Reino de que Jesus é rei). Apresentam-no como uma realidade que Jesus semeou, que os discípulos são chamados a edificar na história (através do amor) e que terá o seu tempo definitivo no mundo que há-de vir.
A primeira leitura utiliza a imagem do Bom Pastor para apresentar Deus e para definir a sua relação com os homens. A imagem sublinha, por um lado, a autoridade de Deus e o seu papel na condução do seu Povo pelos caminhos da história; e sublinha, por outro lado, a preocupação, o carinho, o cuidado, o amor de Deus pelo seu Povo.
O Evangelho apresenta-nos, num quadro dramático, o "rei" Jesus a interpelar os seus discípulo acerca do amor que partilharam com os irmãos, sobretudo com os pobres, os débeis, os desprotegidos. A questão é esta: o egoísmo, o fechamento em si próprio, a indiferença para com o irmão que sofre, não têm lugar no Reino de Deus. Quem insistir em conduzir a sua vida por esses critérios ficará à margem do Reino.
Na segunda leitura, Paulo lembra aos cristãos que o fim último da caminhada do crente é a participação nesse "Reino de Deus" de vida plena, para o qual Cristo nos conduz. Nesse Reino definitivo, Deus manifestar-Se-á em tudo e actuará como Senhor de todas as coisas (vers. 28).
Descobrir que o Reino da vida definitiva é a nossa meta final significa eliminar definitivamente o medo que nos impede de actuar e de assumir um papel de protagonismo na construção de um mundo novo. Quem tem no horizonte final da sua vida o Reino de Deus, pode comprometer-se na luta pela justiça e pela paz, com a certeza de que a injustiça, a opressão, a oposição dos poderosos, a morte não podem pôr fim à vida que o anima. Ter como meta final o Reino significa libertarmo-nos do medo que nos paralisa e encontrarmos razões para um compromisso mais consequente com Deus, com o mundo e com os homens.


https://www.dehonianos.org/

sábado, 25 de novembro de 2023

Às vezes, é só o amor





Às vezes, também precisamos de um abraço que seja porto de abrigo. Que nos esconda dos medos. De tudo. Que seja lugar seguro para onde podemos sempre correr, para onde podemos sempre voltar.

Às vezes, também precisamos de um aconchego que nos abrace o coração, que nos abrace a alma. Que seja colo. Que nos guarde. Que nos apazigue. Que nos ajude a respirar.

Às vezes, também precisamos de uma mão que nos segure com a certeza de que não nos vai largar. Que nos acompanhe. Que seja amparo, faça chuva ou faça sol. Que seja força. Que seja alento.

Às vezes, também precisamos de um olhar que nos olhe a alma. Que nos veja de verdade: por dentro do que somos. Que nos leia as palavras, os gestos e os silêncios. Que nos compreenda o coração, sem ser preciso falar.

Às vezes, também precisamos de um sorriso do coração. Que nos conforte. Que nos faça sentir que vai ficar tudo bem. E que, enquanto não ficar, nos faça sentir que não estamos sozinhos. Que nos dê esperança.

Às vezes, também precisamos de alguém que nos faça sorrir. Que nos queira bem. De verdade. Que esteja, que fique, que se importe. Que nos mostre o lado mais bonito. Do dia, da vida, do mundo. De tudo.

Às vezes, também precisamos de amor. Todas as vezes.

Às vezes (e em todas as vezes), é só o amor. É sempre o amor. Que nos cura. Que nos salva.


Daniela Barreira


sexta-feira, 24 de novembro de 2023

JOVENS ALEGRES E SEMEADORES DE ESPERANÇA



Ainda se sente e sentirá por esse mundo além aquele frenesim saudável da Jornada Mundial da Juventude 2023. Foi bonito e reconfortante ver e viver o surfar na onda de tantos jovens de numerosos países, raças e culturas. Celebrar com eles o encontro com Cristo Rei e com os outros, em verdadeira explosão de alegria e fé, foi um privilégio inesquecível. Foi o ponto mais alto da paz em movimento a semear esperança por este país fora e pelas ruas de Lisboa adentro. Envolveram-se crentes e não crentes deste reino de Portugal e dos Algarves, d’aquém e d’além-mar e arredores. E se os efeitos da efeméride continuam a ecoar pelos quatro cantos do mundo e no coração jovem de multidões, a coisa não vai parar, o entusiasmo persiste e fervilha, serena e saudavelmente.
Em 2025, temos o Jubileu dos jovens, em Roma, onde, cada pedra da rua em que tropecemos a doer e se levante a protestar, logo revela histórias da História cristã e do mundo. Em 2027, outra Jornada Mundial, desta vez em Seul, na Coreia do Sul, desejando eu que, por tabela, o saudável ruído desta paz em movimento, que sois vós os jovens, sacuda e sensibilize para a fraternidade universal os canhões perfilados da Coreia outra de outros jovens a viverem constitucionalmente prisioneiros da estreita ideologia da autossuficiência nacional.
Vamos ou não vamos, caros jovens? Claro que sim, nem que a vaca tussa e o boi espirre. Tantos já sonham nisso e o sonho é que comanda a vida, assim o disseram sábios portugueses, não sabendo eu se os sábios da Grécia já o haviam dito!... Vamos lá, jovens, toca a cevar, desde já, o porquito-peteiro e a atiçar o fogo da esperança na suave brisa do Espírito Santo, até porque, diz quem sabe, a juventude “é um tempo cheio de esperanças e sonhos, alimentados pelas realidades belas que enriquecem a nossa vida: o esplendor da criação, as relações com os nossos entes queridos e com os amigos, as experiências artísticas e culturais, os conhecimentos científicos e técnicos, as iniciativas que promovem a paz, a justiça e a fraternidade, e assim por diante”.
Até chegar cada um desses acontecimentos, não desistas do teu grupo, permanece atento aos desafios em curso. Não te isoles. Não te afastes da tua comunidade cristã, não batas a porta, não olhes com indiferença. Anima-te e anima os outros com iniciativas e processos de crescimento na cultura da fé. Todos precisamos de todos, sobretudo precisamos de ti, e olha que dos fracos não reza a história. O jovem Francisco, com 86 anos, já nos saiu a caminho, feliz e provocante, assim: “vós, jovens, sois a esperança jubilosa duma Igreja e duma humanidade sempre a caminho. Quero tomar-vos pela mão e, junto convosco, percorrer a senda da esperança. Quero falar convosco das nossas alegrias e esperanças, mas também das tristezas e angústias dos nossos corações e da humanidade que sofre. Nestes dois anos de preparação para o Jubileu, meditaremos, primeiro, sobre a expressão paulina “Alegres na esperança” (Rm 12, 12) e, depois, aprofundaremos a frase do profeta Isaías: “Aqueles que esperam no Senhor, caminham sem se cansar” (cf. Is 40, 31).
‘Alegres na esperança’ é uma exortação de São Paulo à comunidade de Roma, a viver debaixo de intensa perseguição. Esta alegria da esperança não é a alegria que o mundo oferece de mão beijada, tantas vezes fugaz e a desembocar na tristeza e frustração. Não é, diz o Papa, “otimismo fácil nem uma panaceia para simplórios”. Não é “a negação da dor e da morte”. Esta alegria na esperança “brota do mistério pascal de Cristo, da força da sua ressurreição. Não é fruto do esforço humano, do engenho ou da arte. É a alegria que deriva do encontro com Cristo”, de nos sabermos amados por Deus mesmo quando nos parece distante. Deus nunca nos deixa sozinhos e mantém a sua promessa: «Ainda que atravesse vales tenebrosos, de nenhum mal terei medo porque Tu estás comigo» (Sal 23, 4).
Esta esperança, que nos anima e dinamiza na alegria, alimenta-se com a oração e com as nossas opções diárias, opções concretas. E Francisco dá um exemplo aos jovens: “nas redes sociais, parece mais fácil compartilhar notícias más do que notícias de esperança. Assim deixo-vos uma proposta concreta: tentai compartilhar cada dia uma palavra de esperança. Tornai-vos semeadores de esperança na vida dos vossos amigos e de quantos vos rodeiam (...) Às vezes, à noite, saís com os vossos amigos e, se estiver escuro, tomais o smartphone e acendeis a lanterna para iluminar. Nos grandes concertos, milhares movem aquelas luzinhas modernas ao ritmo da música, criando um belo cenário. De noite, a luz faz-nos ver as coisas dum modo novo e, mesmo na escuridão, emerge uma dimensão de beleza. O mesmo se passa com a luz da esperança, que é Cristo Rei. Por Ele, pela sua ressurreição, é iluminada a nossa vida. Com Ele, vemos tudo sob uma nova luz” (...) Animado pela esperança divina, o cristão encontra-se repleto duma alegria diversa, que vem de dentro. Os desafios e as dificuldades existem e sempre existirão, mas se estivermos dotados duma esperança ‘cheia de fé’, enfrentá-los-emos sabendo que não têm a última palavra e nós próprios tornamo-nos uma pequena lanterna de esperança para os outros. Queridos jovens, não tenhais medo de partilhar com todos a esperança e a alegria de Cristo Ressuscitado! A centelha que se acendeu em vós, conservai-a, mas ao mesmo tempo comunicai-a: dar-vos-eis conta de que ela crescerá! A esperança cristã, não a podemos guardar para nós, como um belo sentimento, visto que se destina a todos. Aproximai-vos em particular dos vossos amigos que talvez aparentemente sorriam, mas por dentro choram, carentes de esperança. Não vos deixeis contagiar pela indiferença e pelo individualismo: permanecei abertos como canais por onde a esperança de Jesus possa fluir e difundir-se nos ambientes onde viveis”.
Francisco termina a sua Mensagem apontando-nos Maria como a mulher da esperança, a mãe da esperança. Permanecendo forte aos pés da cruz de Jesus, ela “preenche o silêncio do Sábado Santo com uma amorosa expetativa cheia de esperança, incutindo nos discípulos a certeza de que Jesus venceria a morte e que o mal não seria a última palavra”.
Força, jovens, sempre alegres a semear a esperança!


D. Antonino Dias - Bispo Diocesano
Portalegre-Castelo Branco, 24-11-2023.

Acomodei-me e agora?

 


Quantas vezes dás por ti a olhar para o passado, para as opções que fizeste, e a não gostar do que vês? Espero que não muitas. Mas é certo que volta e meia temos a tendência de olhar para a nossa vida e nem sempre ficamos confortáveis com o que vemos.

Será que escolhemos bem o curso?

Será que escolhemos bem as companhias?

E se tivesse arriscado?

E se tivesse dito não, ou dito sim?

E se tivesse mudado de emprego? Mudado de país?

E se não me tivesse acomodado?

E se….

A vida está repleta de SESSSSSSS. Eu tenho muitos! Mas reconheço que a maioria das decisões que tomamos são cartas fechadas. Ora porque eramos muito novos. Ora porque não sabíamos o que sabemos agora. Ora porque não ouvimos quem nos aconselhou. Enfim…!

E como viver com esses SESSSSSS? É que eles às vezes pesam, especialmente quando eles envolvem terceiros e quando tomamos decisões e fazemos escolhas condicionados por outros ou que os condicionam. Sim, é que não vivemos numa redoma por isso tudo tem consequências. Então? Como viver com a nostalgia das decisões passadas?

Não sei!

Prefiro refletir sobre o que sinto e deixar que o discernimento divino sopre para a melhor atitude. Umas vezes o vento sopra para a resignação, outras para revolta, e outras o vento impele-me à mudança. Seja qual for o SE…aproveita-o, nunca se sabe se não é o início de uma bela história de sucesso.

E tu amiga, quais os teus SESSSS?



Raquel Rodrigues

quinta-feira, 23 de novembro de 2023

Afasta-te do que te distrai

 


O que tens andado a pensar? Por que razão? O que procuras ser que não és? O que desejas ter que não tens?

Vivemos num mundo cheio de possibilidades. Cada uma delas grita-nos e procura atrair a nossa atenção. Assim, e porque queremos viver com intensidade, queremos exceder-nos em vários projetos e planos ao mesmo tempo.

Em vez de nos concentrarmos numa só coisa, procurando fazê-la o melhor possível, perdemo-nos fazendo saltar o nosso foco de pensamento em pensamento, sem aprofundar nenhum. Podem chegar do passado ou do futuro, mas parecem ter todos a mesma missão: distrair-nos do presente.

Preocupamo-nos com a falta de tempo, mas, na verdade, somos nós que o desperdiçamos, com tanta desatenção.

Importa que, no meio de solicitações sem fim, saibamos dizer não a quase todas. É um paradoxo, mas quanto mais possibilidades temos mais liberdade perdemos, porque nos fragmentam entre tantos afazeres.

Ou naufragamos neste mar de possibilidades, ou aprendemos a navegá-lo. Seria bom que fizéssemos listas de tarefas a não fazer, melhor ainda que fossemos capazes de as cumprir com a certeza de que a nossa felicidade depende disso.

Em que deves colocar a tua atenção de forma estável e duradoura? O que é mais importante, que vale mais do que tudo o que vais deixar de lado? O que te permite ser quem és, não te fazendo querer ser nem melhor nem diferente?

Talvez o que está próximo de ti e a que teimas em não dar tempo nem atenção.

Faz-te presente, foca-te apenas no que és e já tens. Oferece-te de forma plena, concentrada e verdadeira.

Não te distraias com quem deseja que sejas apenas ou seu escravo ou consumidor do que tem para vender. Dedica-te a uma coisa de cada vez e entrega-te inteiro. Não procures ser melhor, apenas quem és. Dá ao mundo o fruto do dom que Deus te deu.

Só isso te fará feliz.



José Luís Nunes Martins

quarta-feira, 22 de novembro de 2023

Isto também é meu!

 


Temos muita dificuldade em aceitar o que não gostamos em nós. Mais ainda: é-nos complicado querer ver o que temos que não é bom. Seja isso um defeito, uma característica da nossa personalidade, uma dor antiga ou alguma espécie de raiva ou de tristeza.

Temos um desejo secreto, e profundamente infantil, de ser habitados só por coisas boas e por bons sentimentos. Não queremos os avessos das coisas. Não queremos a tristeza que nos deixa sem chão. Não queremos a raiva que nos faz doer a barriga e a alma. Não queremos o medo que nos prende as vontades e não nos deixa acreditar no futuro. Não queremos olhar para o que nos fizeram de mal, para o que nos fizemos de mal com a desculpa pequenina do “já passou”.

Mas a verdade é que há muita coisa que não passa. Aliás, tudo o que é não visto aumentará de tamanho até nos obrigar a olhar. E um olhar forçado nunca será um processo meigo ou pouco tumultuoso.

Ficamos doentes pelas coisas que não dizemos. Pelos traumas que não processamos. Pelas lutas que não quisemos travar. Pelos lutos que não fizemos. E, quando menos esperamos, vem o corpo avisar-nos com uma dor aqui ou ali. Com uma doença que nem combina com o nosso estilo de vida saudável.

Estamos doentes da alma. Alienados de nós próprios, ainda que ilusoriamente conectados com as dores dos outros. Que saberemos das dores dos nossos se deixámos órfãs as nossas? Que cura podemos oferecer se as nossas feridas apodrecem sem colo e sem amor? Que luz podemos ser se vivemos de coração às escuras para tudo o que gostávamos de não sentir?

Falta-nos sentir. Falta-nos atravessar o deserto imenso do que somos. Falta-nos a coragem para ter febre de viver. De viver tudo. Até o insuportável. Porque é precisamente isso que nos vai fazer perceber que caminho travar.

Falta-nos adotar a nossa alma como uma vocação. Como um propósito de vida único e último.

Enquanto não cuidares da tua alma não saberás quem és.

Enquanto não te atreveres a sentir tudo o que tens aí dentro, todos os caminhos vão fazer-te ficar cada vez mais perdido.


Marta Arrais

terça-feira, 21 de novembro de 2023

21 de novembro Apresentação de Nossa Senhora no Templo

 



Joaquim e Ana, por muito tempo não tinham filhos, até que nasceu Maria, cuja infância se dedicou totalmente, e livremente a Deus, impelida pelo Espírito Santo desde sua conceção imaculada
A memória que a Igreja celebra hoje não encontra fundamentos explícitos nos Evangelhos Canônicos, mas algumas pistas no chamado proto-evangelho de Tiago, livro de Tiago, ou ainda, História do nascimento de Maria. A validade do acontecimento que lembramos possui real alicerce na Tradição que a liga à Dedicação da Igreja de Santa Maria Nova, construída em 543, perto do templo de Jerusalém.
Os manuscritos não canônicos, contam que Joaquim e Ana, por muito tempo não tinham filhos, até que nasceu Maria, cuja infância se dedicou totalmente, e livremente a Deus, impelida pelo Espírito Santo desde sua conceção imaculada. Tanto no Oriente, quanto no Ocidente observamos esta celebração mariana nascendo do meio do povo e com muita sabedoria sendo acolhida pela Liturgia Católica, por isso esta festa aparece no Missal Romano a partir de 1505, onde busca exaltar a Jesus através daquela muito bem soube isto fazer com a vida, como partilha Santo Agostinho, em um dos seus Sermões:
“Acaso não fez a vontade do Pai a Virgem Maria, que creu pela fé, pela fé concebeu, foi escolhida dentre os homens para que dela nos nascesse a salvação; criada por Cristo antes que Cristo nela fosse criado? Fez Maria totalmente a vontade do Pai e por isto mais valeu para ela ser discípula de Cristo do que mãe de Cristo; maior felicidade gozou em ser discípula do que mãe de Cristo. E assim Maria era feliz porque já antes de dar à luz o Mestre, trazia-o na mente”.
A Beata Maria do Divino Coração dedicava devoção especial à festa da Apresentação de Nossa Senhora, de modo que quis que os atos mais importantes da sua vida se realizassem neste dia.
Foi no dia 21 de novembro de 1964 que o Papa Paulo VI, na clausura da 3ª Sessão do Concílio Vaticano II, consagrou o mundo ao Coração de Maria e declarou Nossa Senhora Mãe da Igreja.


Nossa Senhora da Apresentação, rogai por nós!



http://santo.cancaonova.com

NÃO DESVIEM O OLHAR DOS POBRES, PEDE O PAPA

 

NÃO DESVIEM O OLHAR DOS POBRES, PEDE O PAPA



“Quando nos cruzamos com um pobre, não podemos virar o olhar para o lado oposto, porque impediríamos a nós próprios de encontrar o rosto do Senhor Jesus”, afirma o Papa, na Mensagem para o Dia Mundial dos Pobres, que se assinala no próximo domingo, 19 de novembro.

A Mensagem, que tem como tema «Nunca afastes de algum pobre o teu olhar», assinala que cada pobre, sem excepção, é nosso próximo, e não importa a cor da pele, a condição social, a proveniência.

“Somos chamados a ir ao encontro de todo o pobre e de todo o tipo de pobreza, sacudindo de nós mesmos a indiferença e a naturalidade com que defendemos um bem-estar ilusório”, refere Francisco.

”Vivemos um momento histórico que não favorece a atenção aos mais pobres. O volume sonoro do apelo ao bem-estar é cada vez mais alto, enquanto se põe o silenciador relativamente às vozes de quem vive na pobreza”, comenta o Santo Padre, acrescentando que “tende-se a ignorar tudo o que não se enquadre nos modelos de vida pensados sobretudo para as gerações mais jovens, que são as mais frágeis perante a mudança cultural em curso. Coloca-se entre parênteses aquilo que é desagradável e causa sofrimento, enquanto se exaltam as qualidades físicas como se fossem a meta principal a alcançar”.

Nesta mudança de época em que a realidade virtual se sobrepõe à vida real, “acontece cada vez mais facilmente confundirem-se os dois mundos” e os pobres “tornam-se imagens que até podem comover por alguns momentos, mas quando os encontramos em carne e osso pela estrada, sobrevêm o incómodo e a marginalização”, lamenta o Papa.

A pressa, companheira diária da vida, impede de “parar, socorrer e cuidar do outro, menciona o Papa, assinalando que “delegar nos outros é fácil; oferecer dinheiro para que outros pratiquem a caridade é um gesto generoso; mas envolver-se pessoalmente é a vocação de todo o cristão”.

Novas formas de pobreza

Francisco fala da necessidade de “um sério e eficaz empenho político e legislativo” que permita a solidariedade e a subsidiariedade aos mais pobres, realçando que “quem vive em condição de pobreza também tem de ser envolvido num processo de mudança e responsabilização.

No texto, o Papa refere-se às novas formas de pobreza que afetam “as populações que vivem em cenários de guerra e privam as criança de um presente sereno e de um futuro digno”.

“Ninguém poderá jamais habituar-se a esta situação; mantenhamos viva toda a tentativa para que a paz se afirme como dom do Senhor Ressuscitado e fruto do empenho pela justiça e o diálogo”, pede o pontífice.

Francisco também não esquece “as especulações, em vários setores, que levam a um aumento dramático dos preços, deixando muitas famílias numa indigência ainda maior” e denuncia as privações que atentam contra a dignidade de cada pessoa: “sempre que uma família tem de escolher entre o alimento para se nutrir e os remédios para se curar, “então deve fazer-se ouvir a voz de quem clama pelo direito a ambos os bens, em nome da dignidade da pessoa humana”.

As preocupações do Santo Padre prendem-se também com o futuro das novas gerações: “quantas vidas frustradas e até suicídios de jovens, iludidos por uma cultura que os leva a sentirem-se «inacabados» e «falidos»”.

Francisco termina com um alerta: “tentação insidiosa é também parar nas estatísticas e nos números. Os pobres são pessoas, têm rosto, uma história, coração e alma. São irmãos e irmãs com os seus valores e defeitos, como todos, e é importante estabelecer uma relação pessoal com cada um deles”.

Foto: @Vatican News

segunda-feira, 20 de novembro de 2023

Há quem tenha sede e fome!



Há quem tenha sede. Há, nesse mundo fora, quem ainda não tenha conseguido saciar as suas inquietações e as suas dúvidas. Existem muitos que continuam à procura da fonte de água-viva. Anseiam pela água capaz de lhes dar a conhecer a paz que procuram. Vivem para que um dia possam saborear da água que lhes dê acesso ao conhecimento da Verdade.

Há quem tenha fome. Há, em tantos cantos do mundo, quem viva esfomeado do amor. Há gente que nunca sentiu o sabor de se ser amado. Existem, tantos e tantas, que ainda não conseguiram encontrar a refeição que lhes possibilite criar relação. Há quem ainda não tenha descoberto como unir todos os seus pedaços quebrados e desalinhados.

Há quem tenha sede. Há, em tantos becos sem saída, quem ainda não tenha provado do vinho da alegria. E como são muitos os que ainda não abriram a garrafa da esperança.De que estarão à espera? Até quando resistirão ao álcool da vida eterna? Até quando resistirão à alegria de se saberem aceites tal como são?

Há quem tenha fome. Há, em tantas cidades e vilas, quem ainda não tenha provado do pão da misericórdia. Existem, tantos e tantas, a quem não lhes é concedido sentir a textura do pão que lhes permite recomeçar. Vivem achando que não são dignos do pão que veio ao mundo para se partir e repartir por todos. Vivem como se nem sequer fossem dignos de apanhar as migalhas.

Ainda existem tantos homens e mulheres com sede e fome. E continuarão a existir enquanto não permitirmos que se sentem à mesa. Continuarão a existir enquanto lhes pedirmos que tragam apenas metade do que são. Continuarão a existir enquanto não compreendermos as suas dores e feridas. Continuarão a existir enquanto não os olharmos de verdade.

Consegues reconhecer quem ainda vive sedento e esfomeado ou o teu privilégio não te permite reconhecer quem falta estar à volta da mesa?

Consegues reconhecer quem ainda vive sedento e esfomeado ou só te preocupas com a tua entrada na ceia?

É dever nosso proporcionar o acesso a todos à mesa dando, assim, a conhecer o pão e o vinho que lhes dá sentido à vida e que lhes reconhece inteiramente amados!


Emanuel António Dias

domingo, 19 de novembro de 2023

VII DIA MUNDIAL DOS POBRES



"Quem já senta o pobre à sua mesa, experimente a sentar-se à mesa do pobre"

D. Antonino Dias




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Estar vigilante"

 


A liturgia do 33º Domingo do Tempo Comum recorda a cada cristão a grave responsabilidade de ser, no tempo histórico em que vivemos, testemunha consciente, activa e comprometida desse projecto de salvação/libertação que Deus Pai tem para os homens.
O Evangelho apresenta-nos dois exemplos opostos de como esperar e preparar a última vinda de Jesus. Louva o discípulo que se empenha em fazer frutificar os "bens" que Deus lhe confia; e condena o discípulo que se instala no medo e na apatia e não põe a render os "bens" que Deus lhe entrega (dessa forma, ele está a desperdiçar os dons de Deus e a privar os irmãos, a Igreja e o mundo dos frutos a que têm direito).Antes de mais, é preciso ter presente que nós, os cristãos, somos agora no mundo as testemunhas de Cristo e do projecto de salvação/libertação que o Pai tem para os homens. É com o nosso coração que Jesus continua a amar os publicanos e os pecadores do nosso tempo; é com as nossas palavras que Jesus continua a consolar os que estão tristes e desanimados; é com os nossos braços abertos que Jesus continua a acolher os imigrantes que fogem da miséria e da degradação; é com as nossas mãos que Jesus continua a quebrar as cadeias que prendem os escravizados e oprimidos; é com os nossos pés que Jesus continua a ir ao encontro de cada irmão que está sozinho e abandonado; é com a nossa solidariedade que Jesus continua a alimentar as multidões famintas do mundo e a dar medicamentos e cultura àqueles que nada têm... Nós, cristãos, membros do "corpo de Cristo", que nos identificamos com Cristo, temos a grave responsabilidade de O testemunhar e de deixar que, através de nós, Ele continue a amar os homens e as mulheres que caminham ao nosso lado pelos caminhos do mundo.
Na segunda leitura, Paulo deixa claro que o importante não é saber quando virá o Senhor pela segunda vez; mas é estar atento e vigilante, vivendo de acordo com os ensinamentos de Jesus, testemunhando os seus projectos, empenhando-se activamente na construção do Reino. A certeza da segunda vinda do Senhor dá aos crentes uma perspectiva diferente da vida, do seu sentido e da sua finalidade... Para os não crentes, a vida encerra-se dentro dos limites estreitos deste mundo e, por isso, só interessam os valores deste mundo; para os crentes, a verdadeira vida, a vida em plenitude, está para além dos horizontes da história e, por isso, é preciso viver de acordo com os valores eternos, os valores de Deus. Assim, na perspectiva dos crentes, não são os valores efémeros, os valores deste mundo (o dinheiro, o poder, os êxitos humanos) que devem constituir a prioridade e que devem dominar a existência, mas sim os valores de Deus. Quais são os valores que eu considero prioritários e que condicionam as minhas opções?
A primeira leitura apresenta, na figura da mulher virtuosa, alguns dos valores que asseguram a felicidade, o êxito, a realização. O "sábio" autor do texto propõe, sobretudo, os valores do trabalho, do compromisso, da generosidade, do "temor de Deus". Não são só valores da mulher virtuosa: são valores de que deve revestir-se o discípulo que quer viver na fidelidade aos projectos de Deus e corresponder à missão que Deus lhe confiou. Mais do que uma mulher virtuosa ideal, o "sábio" autor do texto que nos é proposto exalta todos aqueles - mulheres e homens - que conduzem a sua vida de acordo com os valores do trabalho, do empenho, do compromisso, da generosidade, do "temor de Deus". São estes valores, na opinião do autor, que nos asseguram uma vida feliz, tranquila e próspera. Numa época em que a cultura do "deixa andar", da desresponsabilização, do egoísmo se afirma cada vez mais, este texto constitui uma poderosa interpelação... Na verdade, por que caminhos é que chegamos à vida e à felicidade?


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sábado, 18 de novembro de 2023

Ensina-nos, Senhor, não a temer, mas a escutar.

 



Ensina-nos, Senhor, não a temer, mas a escutar.

Ensina-nos não a temer a escuridão de certas horas, mas a escutar sim os nossos passos nas suas travessias nocturnas; os momentos em que o nosso coração parece seguro apenas da noite, imensa e deserta; as estações em que a sombra cai sem aviso.
Na verdade, Tu Senhor enches de um brilho precioso o céu de breu que se desenrola sobre nós.
Ensina-nos não a omitir, mas a abraçar a curva da solidão que se ergue a meio do caminho; o vazio que toma conta da nossa casa tornando-a a nós desconhecida e como que abstrata; o pressentimento que nos faz estremecer por tudo aquilo que nos pertence e nos falta. Na verdade, Tu Senhor estiveste e estás sempre connosco e, a qualquer momento, a nossa vida pode florir.
Ensina-nos não a cancelar, mas a integrar o turbilhão interior que assoma mesmo quando se diria sem motivo; a imperfeição que escondemos e com a qual só a custo nos reconciliamos; aquilo que à primeira vista é dissonante, mas cuja possibilidade de harmonia compreenderemos depois. Na verdade, Senhor, Tu amadureces a nossa visão da vida pois nos incitas a habitá-la na sua inteireza.
Ensina-nos, Senhor, não a arte do escapismo, mas a sabedoria da confiança, que nos coloca em Ti como somos. E somos frágeis, divididos por dentro, vacilantes, inseguros e incertos. Mas somos Teus filhos e filhas e é assim que a todo o tempo nos resgatas.


Cardeal D. José Tolentino de Mendonça



sexta-feira, 17 de novembro de 2023

HÁ PASSARITOS QUE NÃO SÃO CAVALHEIROS...



Vamos viver o VII Dia Mundial dos Pobres, instituído pelo Papa Francisco. Trazer os pobres para o centro das preocupações humanas tem sido uma das linhas de força do pontificado deste Papa, amando e olhando o pobre como pessoa de alto valor, com rosto e história, com coração e valores. A sua atitude diferencia-se de qualquer ideologia ou de quem os utiliza e coloca ao serviço de interesses pessoais, políticos, económicos ou outros. Honra lhe seja por isso. Com palavras suas, recordemos o Dia Mundial dos Pobres e traduzamos este dia em todos os dias da nossa vida.
Como sabemos, a pobreza tem muitas causas e rostos, variadas dimensões, formas e expressões materiais, culturais e religiosas. Convidados a viver a pobreza voluntária de coração aberto ao amor, estamos todos desafiados a servir os pobres, sem descanso. Esse dever inspira-se nos apelos constantes da Sagrada Escritura, na pobreza de Jesus, na atenção de Jesus aos pobres e na sua identificação com eles. “Para a Igreja, a opção pelos pobres é mais uma categoria teológica do que cultural, sociológica, política ou filosófica. Deus manifesta a sua misericórdia, antes de mais, a eles. Esta preferência divina tem consequências na vida de fé de todos os cristãos, chamados a possuírem os mesmos sentimentos que estão em Cristo Jesus (cf. EG198).
Há sessenta anos, São João XXIII escrevia: “O ser humano tem direito à existência, à integridade física, aos recursos correspondentes a um digno padrão de vida: tais são especialmente a nutrição, o vestuário, a moradia, o repouso, a assistência sanitária, os serviços sociais indispensáveis. Segue-se daí, que a pessoa tem também o direito de ser amparada em caso de doença, de invalidez, de viuvez, de velhice, de desemprego forçado, e em qualquer outro caso de privação dos meios de sustento por circunstâncias independentes da sua vontade” (PT, 11).
A dignidade de cada pessoa humana e o bem comum “são questões que deveriam estruturar toda a política económica, mas às vezes parecem somente apêndices adicionados de fora para completar um discurso político sem perspetivas nem programas de verdadeiro desenvolvimento integral. Quantas palavras se tornaram molestas para este sistema! Molesta que se fale de ética, molesta que se fale de solidariedade mundial, molesta que se fale de distribuição dos bens, molesta que se fale de defender os postos de trabalho, molesta que se fale da dignidade dos fracos, molesta que se fale de um Deus que exige um compromisso em prol da justiça. Outras vezes acontece que estas palavras se tornam objeto duma manipulação oportunista que as desonra. A cómoda indiferença diante destas questões esvazia a nossa vida e as nossas palavras de todo o significado. A vocação dum empresário é uma nobre tarefa, desde que se deixe interpelar por um sentido mais amplo da vida; isto permite-lhe servir verdadeiramente o bem comum com o seu esforço por multiplicar e tornar os bens deste mundo mais acessíveis a todos” (EG203).
Na sua Mensagem para este dia, o Papa refere que a pobreza continua a permear “as nossas cidades como um rio que engrossa sempre mais até extravasar; e parece submergir-nos, pois o grito dos irmãos e irmãs que pedem ajuda, apoio e solidariedade ergue-se cada vez mais forte”. De facto, vivemos “um momento histórico que não favorece a atenção aos mais pobres”. Olha-se para os pobres floreando a retórica e caindo na tentação das estatísticas e dos números, esquecendo que eles “são pessoas, têm rosto, uma história, coração e alma. São irmãos e irmãs com os seus valores e defeitos, como todos”. A parábola do bom samaritano “não é história do passado; desafia o presente de cada um de nós. Delegar a outros é fácil; oferecer dinheiro para que outros pratiquem a caridade é um gesto generoso; envolver-se pessoalmente é a vocação de todo o cristão”.
Centrada numa cena da vida familiar de Tobit, Ana e o filho Tobias, a Mensagem do Papa chama-nos a atenção, para valores que a família, ao vivê-los, naturalmente transmite. Entre eles estão os valores da justiça, da caridade e da solidariedade, do bem: «Filho, lembra-te sempre do Senhor, nosso Deus, em todos os teus dias, evita o pecado e observa os seus mandamentos. Pratica a justiça em todos os dias da tua vida e não andes pelos caminhos da injustiça» (Tb 4, 5). Mais: «Dá esmolas, conforme as tuas posses. Nunca afastes de algum pobre o teu olhar, e nunca se afastará de ti o olhar de Deus» (Tb 4, 7). Vivendo momentos de abundância e de pobreza, de tristezas e de alegrias, esta família jamais desistiu de viver com dignidade e honra, fiel a si mesma, a Deus e aos outros.
Um dia, regressando cansado de ir enterrar um homem que tinha sido estrangulado, atirado para a praça do mercado e abandonado, Tobit adormeceu no pátio da sua casa. Não tinha notado que havia uns pardais no muro, mesmo por cima dele. Destes, caiu excremento quente nos seus olhos e de nada lhe valeram os médicos que consultou, ficou completamente cego. Os pardais, em vez de o embalarem com a sinfonia harmoniosa do seu chilrear, desafinaram, não foram cavalheiros, prejudicaram-no, destruíram-lhe a vida, tornaram-no pobre e incapaz de trabalhar.
No mundo em que vivemos, para além das pessoas bem-intencionadas e esforçadas, que colocam os seus dons ao serviço do bem comum, com criatividade e bem fazer, para além destas pessoas promotoras do bem-estar social, continuam a existir passaritos, pássaros e passarões nada cavalheiros para com os outros humanos: cegam e tiram a voz a uns, exploram e humilham outros, marginalizam e desprezam sem dó, fabricam pobres e mais pobres deixando-os abandonados na ampla praça da sua indiferença.
Há pobres de bens, de amor, de acolhimento, de atenção, de igualdade, de liberdade, de pátria, de paz, de progresso, de saúde, de sentido da vida, de alegria, de cuidados de toda a espécie, inclusive de cuidados espirituais.
Todos, mas os cristãos de uma forma muito específica, somos chamados, “não só a emprestar-lhes a nossa voz nas suas causas, mas também a ser seus amigos, a escutá-los, a compreendê-los e a acolher a misteriosa sabedoria que Deus nos quer comunicar através deles” (EG198).
Quem já senta o pobre à sua mesa, experimente sentar-se à mesa do pobre....
D. Antonino Dias - Bispo Diocesano
Portalegre-Castelo Branco, 17-11-2023.

quinta-feira, 16 de novembro de 2023

Ensina-nos, Senhor

 


“Mais vale ser completo do que ser perfeito” (grande sabedoria de Jung). Ora isso é também uma grande verdade cristã. O que tu nos pedes imediatamente, Senhor, não é uma perfeição idealizada, mas uma confiança concreta. O importante é que nos coloquemos, como somos, nas tuas mãos. A perfeição que tu nos pedes não é a do perfeccionismo, mas a da consciência filial, a certeza inabalável de que somos filhos, de que somos teus, de que podemos viver da Palavra que vem de ti.
Ensina-nos, Senhor, a aceitar com humildade e coragem a nossa pobreza. Ensina-nos a sorrir dos nossos limites. Ensina-nos o amor por nós próprios, que passa por esta aceitação que nada tem de conformismo, mas tudo deve à esperança.

Cardeal D. José Tolentino Mendonça

quarta-feira, 15 de novembro de 2023

Somos o resultado da soma de todos os encontros que temos



Gosto muito de ti amiga!

Gosto de tudo que introduzes na minha vida e do quanto eu aprendi QUE trouxe para a minha vida e que vem do que me dás. Obrigada por fazeres caminho comigo, ainda que seja apenas por momentos.

Reconheço cada vez mais, que no meu caminho encontro vários cruzamentos de onde surgem pessoas que estão a fazer um caminho diferente do meu mas que, por momentos, se cruzam no meu caminho. Nem sempre esse encontro é fácil, mas pode ser verdadeiramente proveitoso.

Existem aqueles que fazem caminho connosco há tanto tempo que já parecem fazer parte de nós e às vezes correm o risco de se tornarem, quase, invisíveis aos nossos olhos.

Outros cruzam- se por momentos, mas são encontros tão intensos que nos fazem olhar para o caminho numa perspetiva diferente e por vezes salvam-nos de decisões erradas.

Outros há, que fizeram o caminho connosco durante muito tempo, mas que, em determinada altura, optaram por virar noutro cruzamento e seguir caminho diferente.

Aprendemos muito no caminho, mas podemos aprender mais…

No caminho há samaritanos e salteadores, montes e planícies, sol e chuva. Enfim há de tudo, e em tudo há sempre alguma coisa nova, nem que seja a experiencia da alegria, adrenalina ou medo que nos impulsiona a andar e a agir. Mas por vezes temos de parar e olhar bem para ver quem caminha connosco, agradecer por quem já caminhou, e preparar o coração para receber quem se vai cruzar connosco.

Destes encontros, recebemos um pouco de cada viajante e acredito que eles levam um pouco de nós (já dizia no principezinho).

No meu caminho fiz muitos amigos. Uns, por força da circunstância, fui perdendo um pouco a ligação, e foram surgindo outros que em momentos chave foram fundamentais na minha vida, mas não significa que fazem caminho comigo. Outros tantos, poucos, fazem o caminho comigo, não por obra do acaso, mas porque os escolhi.

E é tão bom ter companheiros de caminho!

E tu amiga, com quem escolhes fazer caminho?


Raquel Rodrigues

terça-feira, 14 de novembro de 2023

Falta cumprir-se o Reino.



Falta cumprir-se o Reino. Aquele que um dia foi tão desejado e sonhado. Falta acontecer o Reino que um dia começou a ser costurado por Jesus, o Nazareno. Falta o Reino onde não existem donos mas servidores. Falta o Reino onde os seus limites não são impostos por quem se sente dono da verdade, mas sim por quem adora Deus em espírito e verdade.

Falta cumprir-se o Reino. O Reino onde ninguém se sente condenado por Deus. Falta acontecer o Reino onde todos se sentem impelidos a recomeçar. Falta o Reino onde vale mais a misericórdia do que a lei. Falta o Reino onde a Palavra é capaz de transformar vidas. Falta o Reino onde as pedras se deixam amolecer pela ternura dos gestos de Jesus, O Cristo.

Falta cumprir-se o Reino. O Reino onde a vida se parte e reparte à volta da mesa. Falta acontecer o Reino onde todos se transformam em pão, porque se desgastam através da partilha. Falta o Reino do vinho, o reino onde há vida em abundância. Vida repleta de alegria e de novidade. Falta o Reino do sabor onde todos vivem para dar maior sentido à vida de tantos. Falta o Reino onde as histórias de todos se entrecruzam em procura do maior e melhor acolhimento.

Falta cumprir-se o Reino. O Reino onde conta mais ser do que parecer. Falta acontecer o Reino onde os gestos dão forma e brilho à presença de Deus. Falta o Reino dos que se perdem por entre olhares. Falta o Reino dos que andam com o coração nas mãos. Falta o Reino dos que se reconhecem imperfeitos. Falta o Reino dos que têm sede e, por isso, continuam em caminho, em busca. Falta o Reino dos que escutam as dores, as inquietações e dúvidas.

Falta cumprir-se o Reino. O Reino onde as portas estão escancaradas. O Reino onde todos, todos, todos são convidados a ser o centro. Falta o Reino daquele Nazareno que um dia ousou sonhar numa comunidade de erguidos. Falta um Reino de erguidos, dos que se reconhecem salvos, de si mesmos, por este Jesus. Falta o Reino dos que se deixam animar e alimentar pelo Seu sopro.

Hoje, antes de voltares ao teu quotidiano, questiona-te: com que linhas tenho costurado o Reino de Jesus?

Emanuel António Dias

segunda-feira, 13 de novembro de 2023

Que verdade é a tua?


Vivemos num mundo de faz de conta. Aquilo em que acreditamos cai por terra com uma facilidade tremenda. Temos a nossa verdade presa ao peito e andamos com ela remendada pelas mentiras que nos impingem. Pelas desilusões que a ferem. Pelas faltas de amor que reinam neste mundo.

O que ontem acreditávamos ser verdade escorre-nos agora pelas mãos como água de pântano.

Vivemos tempos sérios. Graves. Complicados. O mundo grita e contorce-se numa ferida de guerra, de mentira, de corrupção que nos afeta a todos. Os que nos governam seguem como se pudessem permanecer impunes de todos os crimes. De todas as faltas. Que não nos falta a coragem para ver o que, realmente, existe neste momento.

A inteligência artificial reina autonomamente, sem cara e sem corpo, e entra-nos casa adentro, vida adentro como se tudo o que tivesse existido até aqui não passasse de uma ilusão que se fez, agora, pó.

Que saibamos levantar a cabeça. Os braços. A vida e a cruz que carregamos. Que saibamos dizer que por nós não passarão as mentiras, os dinheiros em bolsos despertencentes, as injustiças e as faltas de liberdade.

A inteligência artificial pode ter estremecido o mundo, mas, a mim, assusta-me. Assusta-me a falta de controlo, de verdade, de humanidade.

Não nos deixemos cair neste processo enorme de desumanização em que nos querem fazer cair. Ainda nos temos uns aos outros. Ainda somos cabeças que pensam e almas que estão mais vivas do que nunca.

Não nos deixemos enredar pelo desconhecido. Continua a ser profundamente importante cultivar a empatia, a solidariedade, a ternura e o amor.

Podem tirar-nos tudo, mas a nossa verdade será sempre aquilo por que vale a pena viver.

Podem levar-nos tudo e desacreditar a nossa fé… mas aquilo que somos será sempre o nosso propósito maior.

Não deixes que te façam esquecer que estás cá para fazer com que tudo fique melhor do que estava até teres cá chegado.


Marta Arrais

domingo, 12 de novembro de 2023

Estar atento, vigilante e disponível

 


A liturgia do 32º Domingo do Tempo Comum convida-nos à vigilância. Recorda-nos que a segunda vinda do Senhor Jesus está no horizonte final da história humana; devemos, portanto, caminhar pela vida sempre atentos ao Senhor que vem e com o coração preparado para o acolher.
Na segunda leitura, Paulo garante aos cristãos de Tessalónica que Cristo virá de novo para concluir a história humana e para inaugurar a realidade do mundo definitivo; todo aquele que tiver aderido a Jesus e se tiver identificado com Ele irá ao encontro do Senhor e permanecerá com Ele para sempre. A nossa vida presente não é, pois, um drama absurdo, sem sentido e sem finalidade; é uma caminhada tranquila, confiante - ainda quando feita no sofrimento e na dor - em direcção a esse desabrochar pleno, a essa vida total em que se revelará o Homem Novo.
O Evangelho lembra-nos que "estar preparado" para acolher o Senhor que vem significa viver dia a dia na fidelidade aos ensinamentos de Jesus e comprometidos com os valores do Reino. Com o exemplo das cinco jovens "insensatas" que não levaram azeite suficiente para manter as suas lâmpadas acesas enquanto esperavam a chegada do noivo, avisa-nos que só os valores do Evangelho nos asseguram a participação no banquete do Reino. "Estar preparado" não significa, contudo, ter a "alminha" limpa e sem mancha, para que, quando nos encontrarmos com o Senhor, Ele não tenha nenhuma falta não confessada a apontar-nos e nos leve para o céu... Mas significa, sobretudo, vivermos dia a dia, de forma comprometida e entusiasta, o nosso compromisso baptismal. "Estar preparado" passa por descobrirmos dia a dia os projectos de Deus para nós e para o mundo e procurar concretizá-los, com alegria e entusiasmo; "estar preparado" passa por fazermos da nossa vida, em cada instante, um dom aos irmãos, no serviço, na partilha, no amor, ao jeito de Jesus.
A primeira leitura apresenta-nos a "sabedoria", dom gratuito e incondicional de Deus para o homem. É um caso paradigmático da forma como Deus se preocupa com a felicidade do homem e põe à disposição dos seus filhos a fonte de onde jorra a vida definitiva. Ao homem resta estar atento, vigilante e disponível para acolher, em cada instante, a vida e a salvação que Deus lhe oferece.


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sábado, 11 de novembro de 2023

Não tenhas medo. Serás pescador de homens.


Este é o tema da Semana de Oração pelos Seminários que estamos a viver em Portugal. Temos que rezar muito, mas acima de tudo, temos que viver, muito mais, como bons cristãos.

Assistimos por esse mundo ocidental fora, à queda de vocações sacerdotais. As razões são muitas e muitas vezes começam pela queda da natalidade. Mas creio que esta já é consequência da razão maior: a falta de fé!

Li, gostei e partilhei a seguinte definição de fé, “atribuída” ao padre Vasco Pinto de Magalhães:

«Fé não significa acreditar ou não acreditar se Deus existe, embora a nossa cultura tenha muitas vezes relacionado fé com essa discussão teórica. Fé, crer, significa, à letra, "apoiar-se em". Devemos perguntar: "Em quem me apoio, em quem faço fé? Qual é o meu fundamento? Em quem confio?" Ora só faz sentido "fazer fé" em quem nos ama, sem condições! Alguém que não engana e me dá força para o caminho! Ser crente cristão é estar convicto de que o caminho de Cristo é o mais humano, apoiado na certeza de um Deus que é Pai, e pedagogicamente me conduz à liberdade.»

Para viver uma vida plena precisamos de um ideal que nos apaixone, que faça o nosso coração arder. Este é o sentido da vocação que todos recebemos no Batismo. De facto, com este, damos o nosso primeiro SIM a Deus que nos chama a entrar em comunhão com Ele, a aceitar o seu senhorio sobre as nossas vidas e a tornar-nos membros vivos da Igreja, pedras vivas do Seu santo do templo que somos nós.

Dói o coração ao ver tanta superficialidade com que muitos batizados vivem a fé e o batismo! Tantas vezes apoiamo-nos em outros deuses. E todos somos chamados a viver a fé da mesma maneira. Deus dispôs para cada pessoa um caminho particular, muito pessoal, que ninguém pode delegar a outros, sob pena de causar o empobrecimento da sua vida pessoal e o de toda a Igreja.

É aqui que se realiza a diversidade de vocações nos diferentes estados de vida. Cada um acolhe em si aquele projeto que Deus, na sua bondade e misericórdia, sempre pensou e empenha-se em realizá-lo. Só descobrindo e vivendo este projeto poderemos ser verdadeiramente felizes, mesmo que não sejamos poupados das dificuldades da vida e do sofrimento.

Mas há mais! O que Deus planeou para cada um de nós é, em última análise, o que cada um de nós deseja no fundo do seu coração. Descobri-lo dá alegria, porque tomamos consciência de que Deus não nos carrega um fardo pesado, mas, tendo em consideração o que somos, orienta-nos para um futuro decididamente maior que os nossos pequenos horizontes.

Penso que é fundamental descobrir primeiro a nossa vocação batismal para depois acolher, estimular e colaborar na vocação dos demais em geral e das vocações sacerdotais em particular.

Mas voltarei ao assunto.

Rezemos.


Paulo Victória

sexta-feira, 10 de novembro de 2023

HÁ OLHARES QUE DÃO SENTIDO À VIDA


Vivemos a semana dos Seminários. Não a semana dos edifícios, mas a Semana dos Seminários, Comunidades de vida e formação, constituídas por alunos, formadores, professores, colaboradores, famílias dos alunos e benfeitores. Sendo a vocação um dom e uma tarefa, esta semana tem muito presente as pessoas que fazem caminho ou colaboram nestas instituições, tal é a nobreza da sua missão e a responsabilidade que abraçam em nome da Igreja. Desta missão e responsabilidade, porém, não se podem autodemitir as próprias paróquias e os seus movimentos de pastoral, na diversidade dos seus âmbitos de serviço e ação. Como refere o Decreto conciliar sobre a formação sacerdotal, ‘o dever de fomentar as vocações pertence a toda a comunidade cristã, que as deve promover sobretudo mediante uma vida plenamente cristã. Para isso, concorrem quer as famílias, que, animadas pelo espírito de fé, de caridade e piedade, são como que o primeiro seminário, quer as paróquias, de cuja vida fecunda participam os mesmos adolescentes, quer todos aqueles que, de algum modo, se ocupam da educação das crianças e dos jovens, principalmente as Associações católicas. Os sacerdotes, com a sua vida humilde, dedicada e alegre, com a sua mútua caridade sacerdotal e fraterna cooperação, são convidados a cultivar o espírito dos adolescentes a si confiados, de forma que eles possam sentir e seguir de bom grado a vocação divina’ (cf. OT2). A par desta colaboração de todos, Deus ajuda quem promove, quem acompanha e cuida. Deus concede os dons necessários àqueles que, com reta intenção e plena liberdade, são chamados a participar do sacerdócio hierárquico, para o culto de Deus e serviço da Igreja. A história de toda e qualquer vocação “é a história de um inefável diálogo entre Deus e o homem, sobre o amor de Deus que chama e a liberdade do homem que responde” (PdV36).
Esta Diocese tem dois seminaristas, em Teologia. Um, de Pedrógão Pequeno, Sertã; outro, de Escalos de Baixo, Castelo Branco. Têm a formação própria e o acompanhamento vocacional no Seminário dos Olivais, do Patriarcado, a quem estamos extremamente agradecidos. Aí vivem, convivem e se formam, tendo também aulas na Universidade Católica. O processo formativo para a vida sacerdotal tem quatro dimensões simultâneas: “a dimensão humana, que representa a base necessária e dinâmica de toda a vida sacerdotal; a dimensão espiritual, que contribui para caraterizar a qualidade do ministério sacerdotal; a dimensão intelectual, que oferece os necessários instrumentos racionais para compreender os valores próprios do que é ser-se pastor, a fim de os procurar encarnar na própria vida e transmitir o conteúdo da fé de modo adequado; a dimensão pastoral, que habilita a um serviço eclesial responsável e profícuo” (RFIS,89).
Trata-se duma formação que potencia a inteligência e as possibilidades cognoscitivas dos futuros pastores, sim, mas sem deixar de potenciar também as suas capacidades de amar. “A ciência incha, só o amor edifica”, dizia S. Paulo (1Cor 8,1). Sem defender a ignorância, sabemos que o conhecimento facilmente se traduz em poder, só o amor se traduz em serviço. Fomos criados à imagem de Deus, Deus é amor e fez-se homem, não para ser servido, mas para servir e dar a vida como resgate por todos (cf. Mt 20,28).
Raniero Cantalamessa afirma que, na nossa civilização dominada pela técnica, o homem precisa de um coração para que possa sobreviver nela, sem se desumanizar inteiramente. São aperfeiçoados numerosos métodos para avaliar o quociente de inteligência, o ‘QI’, mas, diz ele, ninguém se preocupa em avaliar o ‘quociente do coração’. E também o da vontade, acrescento eu. Todos apreciamos o conhecimento e a competência das pessoas e quanto o progresso e o bem-estar lhes deve. No entanto, só o amor liberta e salva, enquanto a ciência e a sede de conhecimento, sozinhas, podem levar à ruína. A formação resultará tanto melhor quanto mais o quociente de inteligência, ‘o quociente do coração’ e o ‘quociente da vontade’, que não se podem medir a metro nem pesar na balança, quanto mais forem capazes de se darem as mãos em esforço conjunto. QI+QC+QV = Bons cidadãos do Reino e do mundo.
Ao falar do jovem rico, São Marcos refere que Jesus fitou nele o olhar (cf. 10, 21). Há olhares de indiferença, de superioridade, de condenação, de desprezo, de raiva, de tristeza, de agressividade, de medo, olhares que destroem e matam. Há olhares de paz, de serenidade, de compaixão, de alegria, de solidariedade, de acolhimento, de confiança, de misericórdia, olhares que atraem, dão vida e esperança. Regra geral, o olhar revela o que somos, o que nos vai na alma. O olhar amoroso e terno de Jesus, porém, devolve sempre, a quem quer que seja, o significado e sentido da sua existência. Francisco afirma que a nossa vida “muda quando acolhemos este olhar”. Ele torna presente uma frase atribuída a Miguel Ângelo, que diz que “no interior de cada bloco de pedra, há uma estátua, cabendo ao escultor a tarefa de a descobrir”, bem como lembra o provérbio oriental que diz que “um sábio, ao olhar o ovo, sabe ver a águia; ao olhar a semente, vislumbra uma grande árvore; ao olhar um pecador, sabe entrever um santo”. E isto acontece “graças à arte do Escultor divino que, com as suas ‘mãos’, nos faz sair de nós mesmos”. Este Escultor delineia em nós “a obra-prima que somos chamados a ser”. Ele “vê potencialidades, às vezes ignoradas por nós mesmos, e atua incansavelmente, ao longo da nossa vida”. É um olhar de amor que ‘sempre nos alcança, toca, liberta e transforma, fazendo com que nos tornemos pessoas novas’. Sabemos, porém, que tudo o que é dom de Deus, também implica tarefa humana, há que colaborar, com alegria.
Quer no seu tempo, quer ao longo da história, houve sempre quem se apercebesse e acolhesse esse olhar penetrante de Jesus e com Ele fizesse caminho. As suas vidas mudaram, muitas famílias modificaram o seu rumo, a dinâmica de muitas comunidades alterou-se, toda a sociedade beneficiou. E se Jesus olha a todos de forma cativante e transformadora, também é preciso que nós, tal como naquele sábado em Nazaré, jamais deixemos de colocar os nossos olhos n’Ele: “Estavam postos sobre Ele os olhos de todos os que se encontravam na sinagoga” (Lc 4,20).
Jesus continua a estender o seu olhar sobre cada criança, cada jovem ou adulto, com esperança. E continuam a existir jovens atentos e generosos a abraçar estes desafios de serviço à comunidade humana que o Senhor lhes propõe, convidando-os ao sacerdócio. Que todos, famílias e comunidades cristãs, colaboremos para que os jovens acolham generosamente esse olhar terno de Jesus, esse olhar sincero e amigo, que transforma e dá outra direção e outro sentido à vida e às coisas da vida.

D.Antonino Dias - Bispo Diocesano
Portalegre-Castelo Branco, 10-11-2023.

quinta-feira, 9 de novembro de 2023

Aparecer para “parecer”


Vivemos cheios de “máscaras”, entre “falinhas mansas” e “palmadinhas nas costas” estamos inebriados de uma falsa aparência de “gosto muito de ti” que às vezes não passa de um “tolero-te”.

Estamos rodeados de pessoas que adoram aparecer, ocupar espaço, e fazerem-se notar a todo o custo. Podem até usar palavras finas, um tom de voz bem colocado, mas depois de algum tempo o que “parece não é”. Mas atenção, não são só os outros, nós também nos podemos deixar cair nessa necessidade de protagonismo.

Mas a “verdade vem sempre ao de cima” e mais tarde ou mais cedo a “máscara cai”. O povo, nisto é sábio e a prova disso é que estas expressões têm décadas e ainda continuam atuais.

Há, efetivamente, quem goste de aparecer, mascarado de simpatia e disponibilidade apenas para parecer ser a “melhor bolacha do pacote” mas na verdade não se conseguem comprometer com o trabalho que está por baixo do icebergue. Não basta parecer que se é, tem de se ser e isso exige um trabalho concreto, uma procura incessante por se melhorar, em vez de nos acomodar ao “sou assim, quem não gosta põe na beira do prato”.

Por vezes temos de colocar a Máscara da simpatia ”engolir sapos” em prol de projetos maiores que as nossas ambições pessoais.

Por vezes temos mesmo de “Deixar estar” e fazer silêncio, apenas para garantir que não deitamos tudo a perder e a nossa máscara choca os outros.

Mas nada nos impede de trabalharmos para que o que APARECE corresponda não só ao que PARECE mas verdadeiramente ao que SOMOS. Sim dá trabalho. Sim, nem sempre corre como queremos, mas no final é menos uma máscara que carregamos. Sim, conseguiremos ver melhor o que o outro é, mesmo que ele nos queira parecer uma outra coisa.

E tu amiga, és o que pareces?


Raquel Rodrigues

quarta-feira, 8 de novembro de 2023

Quais são as tuas dores?



Sabes o que te faz sofrer? Sabes por que razão isso te magoa? Sabes que é possível dar sentido a uma dor?

Há quem tenha muitas dores e não as saiba identificar, talvez porque isso implicaria olhá-las nos olhos ou talvez porque às vezes as dores juntam-se e formam novas formas de dor às quais é difícil reconhecer ou dar nome.

Uma dor que se esconde de nós ou da qual nós nos tentamos esconder acaba por doer ainda mais. A solidão é um fermento potente de dores. Pode engrandecê-las até a um ponto próximo do insuportável.

Seria bom que vivêssemos num mundo onde todos nós tivéssemos com quem falar sobre aquilo que nos faz sofrer, sendo também, cada um de nós, capaz de escutar, e assim aliviar, as dores do próximo.

Mas hoje reina a lógica de uma estranha verdade: como só é considerado bom partilhar as partes boas da existência, as redes sociais enchem-se de realidades que, não sendo falsas, são apenas metade da verdade, fazendo com que quem sofre julgue que as suas dores são as únicas que conhece… e, portanto, que se deve isolar ainda mais, a fim de não estragar a felicidade dos outros.

Todos sofremos, mais ainda porque o escondemos até de nós mesmos, e como ninguém pode mudar o que não aceita, fica na mesma ou piora.

Se as dores morrem ou apenas adormecem, para algum dia acordarem de novo, é um mistério.

Amar implica sofrer. As maiores dores têm, quase sempre, uma estreita relação com o que cada um de nós tem de mais nobre no seu coração. Se alguém não quiser sofrer, então não pode amar. Haverá algo de bom que não tenha sido criado sem dor?

Quem és tu? Quais são as tuas dores? Só te conheces depois de teres passado pelos vales do sofrimento.

As dores são lições sem palavras, para quem as quer aprender. Mestres que escavam em nós, tornando-nos cada vez mais profundos. E a morada das nossas grandes dores é sempre no mais fundo de nós, sendo que aquilo que nos pode curar e salvar habita por baixo desse chão.


José Luís Nunes Martins

Se te amo, solto-te



Em quase todas as situações, separar será mais fácil do que unir. Porque destruir exige menos energia, inteligência e coragem do que construir.

A paz que tantas pessoas buscam só se alcança à custa de muita bondade e justiça. Mas é mesmo muito difícil alguém ser, ao mesmo tempo, justo e bom. E depois, ainda falta o vizinho que também tem de estar em paz, porque caso contrário… não haverá paz por muito tempo.

A paz não é um deserto onde nada acontece, é sim o resultado de um sem número de equilíbrios e cedências onde todos têm o dever de cuidar e de estar atentos a cada instante.

Quem fica sentado à espera da paz, viverá em guerra com os outros e consigo mesmo, apesar de se julgar desculpado por estar à espera da oportunidade certa ou da pessoa certa. Mas, e isto é claro e evidente, não há nem oportunidades ideais nem pessoas perfeitas.

O tempo e o mundo não esperam por ninguém. Cada momento é uma oportunidade e cada pessoa que está próxima de nós é, apesar de tudo, alguém com quem temos de aprender a conviver.

Importa, acima de tudo, trabalhar com paciência e fé na construção de encontros de onde nasça confiança mútua, esperança e fé. A nível mundial, mas também em cada uma das nossas casas e famílias.

É o medo que provoca as guerras, e torna-se ainda mais forte quando se conjuga com a estupidez e a ganância.

José Luís Nunes Martins

terça-feira, 7 de novembro de 2023

E se a Igreja fosse de Jesus?



E se a Igreja fosse de Jesus? Acredito que não existiriam tiques de Senhores do templo, nem certezas sobre tudo. Creio que não se acreditaria que tudo deveria regressar ao passado, mas que se utilizaria o passado e as tradições para se dar brilho a um novo presente.

E se a Igreja fosse de Jesus? Acredito que se revestiria de alegria e de festa e que essa seria a sua grande evangelização. Creio que seria reconhecida pelos seus laços de humanidade capazes de serem reflexo de um Deus que não é senão amor.

E se a Igreja fosse de Jesus? Acredito que na sua mesa estariam todos e todas. Inclusive os que hoje se sentem indignos. Inclusive os que hoje são impedidos de poder provar o seu pão e o seu vinho. Creio que a Igreja seria porta que acolhe sem aceção de pessoas.

E se a Igreja fosse de Jesus? Acredito que estaríamos obcecados em aliviar cargas e vidas. E que não nos cansaríamos enquanto não soubéssemos que todos se sentem amados. Creio que estaríamos empenhados a viver segundo o amor e a misericórdia e não pela lei e a justiça.

E se a Igreja fosse de Jesus? Acredito que brilharíamos sobre as sombras de tantos e tantas. Seríamos o sal capaz de dar sabor a tantas vidas. Creio que o nosso testemunho seria o suficiente para falar da nossa fé e do nosso Jesus.

E se a Igreja fosse de Jesus? Acredito que os olhares não serviriam para condenar, mas sim para espelhar a paz e o divino. E viveríamos, assim, num olhar. Num olhar capaz de nos acolher inteiramente. Creio que nos saberíamos amados, porque olhados.

E se a Igreja fosse de Jesus? Acredito que a sua palavra predileta seria: recomeçar. E viveria para que todos pudessem fazer caminho. Onde do nada surgia o tudo. Onde na impossibilidade surgiria a novidade de se ser mais e melhor. Creio que não haveria passado, pecado ou queda capaz de anular uma nova vida.

E tu, já pensaste como seria? Já questionaste quantos não poderiam fazer parte da sua casa? Já pensaste quantas sombras não poderiam ser iluminadas? Já questionaste quantas súplicas poderiam ser atendidas? Já pensaste quantos é que seriam colocados no centro?

Uma Igreja de Jesus, uma Igreja à Jesus faz-se cumprindo e honrando o seu sonho: viver segundo o amor, o único capaz de unir, de erguer e de salvar!


Emanuel António Dias

segunda-feira, 6 de novembro de 2023

Sobre a amizade


O modo como uma grande amizade começa é misterioso. Podemos descrevê-lo como um movimento de empatia que se efetiva, um laço de afeição ou de estima que se estreita, mas não sabemos explicar como é que ele se desencadeia. Irrompe em silêncio a amizade. Na maior parte das vezes, quando reconhecemos alguém como amigo, isso quer dizer que já nos ligava um património de amizade, que nos dias anteriores, nos meses anteriores, como escreveu Maurice Blanchot, «éramos amigos e não sabíamos».
Aquilo de que uma amizade vive também dá que pensar. É impressionante constatar como ela acende em nós gratas marcas tão profundas com uma desconcertante simplicidade de meios: um encontro dos olhares (mas que sentimos como uma saudação trocada entre as nossas almas), uma qualidade de escuta, o compartilhar mais breve ou demorado de uma mesa ou de uma conversa, um compromisso comum num projeto, uma qualquer ingénua alegria… A linguagem da amizade é discreta e ténue. E, ao mesmo tempo, é inesquecível e impressiva.

José Tolentino Mendonça