Perdoar, per+donare, conceder generosamente ao agressor arrependido, através de um gesto benevolente, a graça de se libertar da culpa por uma ofensa cometida. É um passo muitas vezes incompreensível, sem justiça nem lógica. Grandioso como uma pirâmide e simples, tão simples e discreto que se esconde facilmente na ternura de um olhar ou no silêncio de um abraço. É um acontecimento regenerador. Proporciona um caminho diferente.
A experiência de liberdade é evidente: o ofendido não cedeu à tentação da reacção primitiva da vingança e o agressor, tocado por este gesto sobrenatural, reconhece-se amado, libertando-se assim do medo da retaliação. Perdoar é uma sublime manifestação de amor. É dizer 70X7 «eu amo-te apesar da tua fraqueza». E quem não perdoa, não só não ama, como não se sente amado. Talvez não se perdoe também. Por isso, tem uma história suspensa. Permanece congelado pelo ódio e é refém dos estilhaços de uma palavra, de um gesto, de um passado que é sempre presente. Resiste à graça da reconciliação.
Guardo na memória, com algum incómodo, o exemplo de perdão dos cristãos egípcios cujos familiares tinham sido brutalmente assassinados pelos ISIS. Era um perdão capaz do milagre maior da conversão do assassino. Um gesto que o transformaria se ele se tivesse deixado tocar pela atitude misericordiosa das vítimas.
Mas o perdão não vem por si. É necessário um treino diário. Assim como aprendemos as primeiras letras, também devíamos interiorizar a beleza da comunhão construída pelo perdão celebrado em família, na escola e entre amigos. Só assim nos livramos da espiral de violência reclamada pela natureza humana e potenciada por uma cultura que enaltece os aparentemente fortes e vencedores. Pedir perdão não é, no entanto, um sinal de fraqueza nem de derrota.
Per-doar não se confunde com esquecimento. Posso ter bem presente o cenário doloroso da ofensa, mas o seu efeito e respetivo veneno, já foi neutralizado pelo antídoto do amor. Pelo contrário, tornar-me-ia terra fértil para o rancor e em cada palavra e até nos gestos mais simples transpareceria o azedume da discórdia e a sede de vingança.
Tristes são aqueles que se despedem deste mundo com o jugo das ofensas nunca perdoadas. Só a eternidade lhes há-de ensinar o valor do perdão.
[P. Nélio Pita, CM] - 16 Setembro 2017 em iMissio
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