sábado, 26 de setembro de 2020

Recomeçamos!



Ainda como quem não sabe por onde é o caminho, recomeçamos.

O Verão atravessou-nos de luz como se uma janela se tivesse aberto do lado de dentro do coração.

Vivemos o pico do Verão como quem viveu, também, a Primavera.

Uns meses antes, todas as flores pareciam ter desaparecido da face da terra e tudo em redor parecia demasiado difícil, escuro, inacreditável.

Depois, chegou agosto e as tempestades que trazíamos presas aos olhos começaram a secar. Era como se o Sol e o Céu nos tivessem dado umas pequeninas tréguas para recuperar forças, fôlego e fé.

Não me esqueci (nem me esqueço) daqueles para quem a Primavera e o Verão ainda não chegaram. A doença. A morte. A perda. As saudades. As ausências.

Para muitos, ainda será inverno de neve e de gelo ou outono de vento que nos faz cair as folhas das árvores que (nos) habitam debaixo da pele.

Ainda assim, a pouco e pouco, recomeçamos e ousamos tirar os olhos do chão.

Começamos de novo como quem foi forçado a nascer outra vez. Como quem foi impelido a aprender a viver num mundo tão diferente do que era.

Ainda assim, permitimos que o Sol faça casa em nós e nos acenda a luz que precisarmos para ver e andar melhor.

Começamos de novo como quem sabe que ainda há futuro. Que ainda há esperança. Que ainda há barcos para chegar. Que ainda haverá dias que nos farão tremer de alegria. Que nascerão folhas novas. Que ainda havemos de dar as mãos outra vez sem que nos sintamos envenenados. Que ainda havemos de nos abraçar até sentir os ossos. Que ainda havemos de brindar ao que passou. 

Começamos outra vez como quem sabe que as batalhas não acabaram. Que a espada ainda não está cravada no coração do dragão.

E assim, enquanto não vencemos a guerra, que saibamos deixar (só) paz por onde passarmos.


Recomeçamos?


Marta Arrais

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