sexta-feira, 8 de janeiro de 2021

PENSAR DÁ MUITA TRABALHEIRA!... Oh!, se não dá!...


Já pensaste bem naquele teu e meu presente que nos foi dado no Natal?!... Então, anda daí, junta-te a nós e vamos desembrulhá-lo. Às vezes, fala-se sem pensar. Não raro, mesmo quando se pensa, cumpre-se o ditado: “cada cavadela sua minhoca”, ou então: “ou entra mosca ou sai asneira”! Pensar é uma exigência do bom senso em ordem à verdade, ao bem e ao melhor. Muitas coisas não aconteceriam, ou aconteceriam, se, primeiro, se pensasse bem nas consequências do fazer ou do não fazer. É consensual que a Verdade anda por aí a lamentar-se e a manquejar, sente-se desconsiderada e muito mal tratada, desconfia-se dela, descarta-se, tantas vezes por indiferença, subserviências, interesses ou maldade. Coisas dos homens!... E das mulheres também!... Parte-se do princípio de que a diversidade de posições são todas iguais, têm todas o mesmo valor, o que interessa é falar!. No entanto, só a Verdade é verdadeira, embora a mentira possa ter alguma coisa de verdade. Há quem, por exemplo, use meias verdades para levar a água ao seu moinho. É uma forma de gerar embustes entre pessoas ou na própria sociedade. Faz-se passar mentiras muito bem empanadas em doces meias verdades. Mas só a Verdade é capaz de iluminar, orientar e promover a pessoa e o sentido da própria vida. Só a Verdade é o alicerce seguro da construção do bem comum. Só a Verdade nos restabelecerá de situações menos felizes que acontecem na nossa própria vida. Será na Verdade, que, um dia, no fim dos tempos, apesar dos muitos desencontros, encontros e encontrões por este vale de lágrimas, todos haveremos de nos encontrar.
O diálogo pode ser um ótimo meio para encontrar a Verdade. Não o diálogo-conversa-de-café onde cada um diz o que lhe apetece e parece, sem fundamento nem conhecimento de causa. Não o diálogo para o qual se parte com preconceitos, com conclusões preestabelecidas, com o desejo de vencer ou o medo de perder. Não o diálogo em que, em nome da liberdade, a pessoa se desvincula da referência à Verdade, nega a capacidade de a poder conhecer e de reconhecer o que é verdadeiro. Não o diálogo que usa formas de argumentar que encapotam aquele relativismo e subjetividade que, nada reconhecendo como definitivo, tem como medida o próprio EU e as suas decisões subjetivas, partindo do pressuposto de que a Verdade se manifesta, de modo igual, nas mais diversas situações e doutrinas, mesmo que contraditórias. Só o diálogo feito com reta intenção, com capacidade de escuta, com respeito mútuo, humildade e inteligência, dará frutos. É da discussão que nasce a luz. Se é a Verdade que se procura, a Verdade, poderá demorar em se mostrar, mas acabará por dar a mão à palmatória e saltar, não porque lhe doeram as reguadas, mas com a alegria de ter sido encontrada. Não a minha verdade, não a tua verdade, não a nossa verdade - ninguém tem o monopólio da verdade! -, mas aquela Verdade que todos procuramos. De facto, somos verdadeiros na medida em que buscamos a Verdade e nela procuramos viver, sem favorecer quem se esmera em defender interesses dúbios, quem usa ideologias esfarrapadas ou arrogância intimidatória. O respeito por todos não significa que possa haver indiferença perante a Verdade e o Bem. Pelo contrário, é o próprio amor que exige e incita a que se anuncie a todos o Bem que edifica e a Verdade que salva.
A terminar o tempo festivo do Natal, celebramos o Batismo do Senhor, no rio Jordão. Não tendo pecado, Jesus meteu-se na fila, misturou-se com os penitentes para ser batizado por João. Ao sair da água, porém, viu descer sobre si o Espírito Santo, o Espírito da Verdade, e ouviu o Pai a chamar-lhe Filho muito amado. Um dia, o encavacado Pilatos perguntou a Jesus o que era a Verdade. Jesus, porém, não lhe respondeu, até porque Pilatos não estava interessado na Verdade, só queria ouvir de Jesus o que ele e o povo gostariam de ouvir. Mas Jesus apresentou-se aos seus como o Caminho, a Verdade e a Vida. Para nós, cristãos, a Verdade plena é Jesus Cristo. Uma Verdade que nunca se impôs ou impõe, apenas se propõe e convida todas as pessoas à conversão e à fé, à alegria de viver na Verdade e de caminhar em direção à Verdade plena.
Para continuar esta missão que o Pai lhe confiara, Jesus instituiu a Igreja que, depois da Ressurreição, a enviou por todo o mundo, em seu nome, para chegar a todos e a cada um. Movida pelo Espírito Santo, a Igreja, apesar das suas debilidades e fraquezas - que são muitas porque também é humana -, tem o dever de obedecer e continuar a missão de Cristo, convidando à mudança de vida e de mentalidade, convidando à conversão e à Verdade, à vida nova em Cristo e à receção do Batismo. A missão de batizar está implicada na missão de evangelizar. O Batismo não é um simples rito, formalidade ou tradição. É uma verdadeira festa da família e comunidade cristãs, sobretudo quando todos estão conscientes do que celebram: um Sacramento, instituído por Cristo. Por ele, somos imersos na fonte de vida que é a morte de Jesus, o mais sublime ato de amor de toda a história. Por ele, ‘ressuscitamos’ para uma vida nova na comunhão com Deus e os irmãos. Por ele, tornamo-nos membros da Igreja e participantes do sacerdócio, profetismo e realeza de Jesus Cristo. Por ele, temos acesso à celebração dos outros sacramentos, todos eles graça do Espírito Santo, que alimentam, fortificam, exprimem a fé e tornam-nos portadores de uma nova esperança, os quais, para os crentes, são necessários para a salvação.
Ao celebrarmos o Batismo do Senhor, também fazemos memória do nosso próprio Batismo. Somos batizados no Espírito da Verdade, o qual nos transmite a ternura do perdão divino, nos impele para a Verdade e faz ecoar em nós a voz do Pai a chamar-nos filhos muito amados! Filhos e herdeiros, colaboradores na construção do seu reino, usufruindo de todas as graças que o Senhor nos oferece, na e pela sua Igreja, riqueza sem igual e tão pouco interiorizada!...
Constata-se que muitas pessoas batizadas, nunca avaliaram a riqueza do dom do Batismo, nunca refletiram sobre os seus efeitos e consequências, nunca lhe procuraram corresponder, comprometidos e agradecidos. Uns, por deficiente formação cristã, culpável ou não. Outros, por preconceitos ou indiferença. Outros, talvez por resistência à força da Palavra e ação do Espírito Santo, mesmo quando comprovadas pelo testemunho de quem anuncia. Mas quase todos, assim o acredito, porque nunca pararam para pensar! Estou convencido que, se se pensasse e se buscasse a Verdade, descobrindo o que significa ser batizado em nome da Santíssima Trindade, com certeza que não se negaria o Batismo aos filhos. Não se adiaria sem razão. Saber-se-ia escolher os padrinhos em função do seu testemunho eclesial. Ninguém, por respeito a si próprio e aos outros, ninguém aceitaria ser padrinho se a sua própria vida fosse vivida à margem da Igreja. Não se fugiria à preparação da celebração. Iria agradecer-se e ensinar a agradecer tão grande graça que o Senhor nos concede. A própria celebração aconselharia toda a família, ou pelo menos os pais e padrinhos, ao Sacramento da Reconciliação para receberem a Sagrada Eucaristia e testemunharem a comunhão em Cristo que, na Igreja e pela Igreja, batiza aquela criança tornando-a templo da Santíssima Trindade. Isto levaria a um melhor compromisso no dever de viver, defender, apoiar, espevitar e fazer crescer a fé da criança. Mesmo aos adultos não batizados, o Senhor diz: “Se hoje ouvirdes a voz do Senhor, não fecheis os vossos corações” (Sl 94). Estou certo de que, se pensassem, procurassem e descobrissem a Verdade, iriam, com certeza, afirmar como Santo Agostinho, afastado de Deus na sua juventude: “Tarde vos amei, ó Beleza tão antiga e tão nova, tarde Vos amei! Eis que habitáveis dentro de mim, e eu, lá fora, a procurar-Vos! ... Porém, chamastes-me, com uma voz tão forte, que rompestes a minha Surdez! Brilhastes, cintilastes, e logo afugentastes a minha cegueira!... Saboreei-Vos e, agora, tenho fome e sede de Vós. Tocastes-me e ardi, no desejo da Vossa Paz”.
Com isto, não estou a defender o proselitismo. Este é sempre de rejeitar, é negativo, não se coaduna com o espírito do Evangelho, não salvaguarda a liberdade e a dignidade da pessoa. Com isto estou apenas a propor e a pedir um tempinho para desembrulhar esse presente do Natal, para pensar e descobrir a riqueza do Batismo. Cada criança, cada jovem, cada pessoa, tem o direito de ouvir a Boa Nova da salvação, tem o direito de saber que Deus a ama e se entregou a si mesmo por ela. A este direito de cada pessoa corresponde o dever que a Igreja tem de ir e anunciar, no respeito pela liberdade de quem ouve e na consciência de que, se o encontro com Cristo acontecer, ele se deve à força da Palavra, à ação do Espírito Santo e ao testemunho de quem anuncia. Anunciar e testemunhar, com alegria e esperança, são o primeiro e o mais importante serviço de Caridade e Amor que os cristãos podem prestar à humanidade, começando pelas pessoas que mais se amam, a família. “Se hoje ouvirdes a voz do Senhor, não fecheis os vossos corações” (Sl 94).

D. Antonino Dias - Bispo Diocesano
Portalegre-Castelo Branco, 2021-01-08.

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