quinta-feira, 5 de janeiro de 2023

Esperança confiante



Quando 2021 terminava, o coração enchia-se de esperança de que 2022 seria o ano de retorno à normalidade e foi. Mas ninguém esperava pela guerra na Ucrânia e essa aconteceu, alterando o sentimento de esperança de um ano em recuperação. Por que razão deveremos esperar que 2023 seja um ano melhor, quando somos totalmente incapazes de prever o futuro? Vale ainda a pena ter uma esperança confiante de um mundo melhor em 2023?

Uma vez ouvi o escritor Brandon Sanderson a falar de como colocamos muitas vezes os nossos propósitos sobre coisas que não temos qualquer controlo. Por exemplo, escrever um livro de sucesso. Sabemos que é uma questão de historial de publicação e sorte. Hoje, Sanderson é um escritor de sucesso, mas precisou de escrever muitos livros sem sucesso até ter sorte. A esperança confiante que alimenta os bons propósitos deveria depositar-se naqueles sobre os quais temos algum controlo. Só assim poderemos superar alguma desilusão.

Por outro lado, existem eventos incertos positivos que, seguramente, nos surpreenderam e deram alguma alegria em 2022, apesar dos eventos globais adversos. No meu caso, recordo ter descoberto o valor da oração contínua que me ajudou a aprofundar uma união com Deus assente no quotidiano, bem como a aceitar e viver com as limitações do corpo após os 40 e que me davam alguma ansiedade. Coisas pequenas que fazem crescer uma esperança confiante no acumular de pequenas mudanças que fazem as grandes diferenças.

Esperar é confiar num futuro orientado para o que é bom, belo, sábio e verdadeiro. Confiar é esperar que tudo concorre para o bem daqueles que amam, sobretudo dos que amam a Deus por colocarem o olhar sobre Aquele que sublima tudo o que é finito em infinito. Uma esperança confiante levanta os braços e oferece-os a quem mais precisa, sem desejar nada em troca senão a felicidade do outro.

Uma cultura de esperança confiante não se alheia aos sinais dos tempos para adaptar as nossas escolhas de modo a chegarmos aos propósitos estabelecidos, ou a alterar os propósitos mediante as condições de possibilidade. A esperança confiante assenta sobre a metáfora de sermos como água que não de fixa na forma que tem, mas flexibiliza a forma para se ajustar ao vasilhame e manter-se fiel à água que é. Porém, a esperança confiante não se restringe à nossa pessoa.

Quando esperamos juntos, e juntos estamos confiantes, o que espero cruza-se com a esperança do outro, e a confiança partilhada ajuda a superar as desilusões que podemos viver ao longo do próximo ano. Ou, por outro lado, podemos também experimentar juntos as alegrias das pequenas ou grandes vitórias que de sonhos passaram a realidade.

Existem situações que podem diminuir o valor da esperança confiante, como a total ausência de controlo que temos sobre a mente e coração daqueles que têm o poder de começar uma guerra, e de as acabar se ao menos soubessem colocar-se na pele da pessoa comum que sofre. A falta de empatia que nos divide é um dos maiores obstáculos à esperança confiante. Como civilização, estamos a precisar de desacelerar para reencontrarmos o valor incalculável que o outro representa para uma vivência recíproca de esperança confiante no futuro ano de 2023.

Existem muitas situações tristes neste mundo que podem esmorecer a esperança que habitualmente acompanha a passagem de ano. Depois, quando reflectimos sobre os propósitos que tínhamos em 2022, e que não se realizaram, podemos questionar se ainda vale a pena ter essa esperança confiante de que este ano é que vai ser… Talvez possamos reconhecer nestes casos o valor de saber perder. Quem sabe perder não assume derrotas, mas está ciente de que as circunstâncias poderão mudar e exigir que mudemos as nossas ideias e sonhos. Ser humano é nunca deixar de ter ideias novas e sonhar.

Tenho uma esperança confiante que, se fizer a minha parte para estar atento ao que o momento presente apresenta, e for suficientemente como a água para me adaptar às vicissitudes da vida, será possível desenhar um caminho, dia após dia, que feito de pequenos passos, gradualmente, alimenta a esperança confiante de estarmos no bom caminho com pequenas e simples realizações. Se fizermos alguns minutos de silêncio para pensar naquilo que conseguimos atingir em 2022, seguramente, que nos daremos conta de tantas coisas boas que aconteceram e nos estruturaram. Algumas poderão ter sido decisivas para a nossa vida e já nem nos lembrávamos. Chegar ao fim de um ano não é somente pensar no futuro, mas reconhecer o valor do passado que o preparou. A esperança confiante faz parte dessa preparação.


Miguel Oliveira Panão

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