Sabes amiga, a minha tenda está vazia, não porque falte alguma coisa, mas porque espera uma visita.
Para Ela arranjei espaço, limpei o lixo que me incomodava, lavei as janelas para entrar mais luz e esperei… esperei pacientemente porque sabia que era importante.
Desliguei de tudo o que me poderia perturbar e redobrei a atenção para ouvir que o Senhor queria de mim. Fiz silêncio e escutei:
As crianças que faziam barulho, os adolescentes que resmungavam e os jovens que procuravam mais e mais. Convidei-os a entrar, até porque a noite, essa estava a chegar. Entraram e admiraram a minha espera e comigo esperaram.
Os chamados “pecadores”, gente sem nome, que representa a humanidade nos seus momentos mais tristes. Pensei nos meus pecados e como eles prevalecem na medida em que aumenta a minha infelicidade, quando deixo de acreditar no bom de cada um e encho a cabeça de maldades e desconfiança. Recordo os momentos em que deixamos entrar a maldade e somos seduzidos pela arrogância. A estes Senhor, também os convidei a entrar e aceitaram.
Ouvi as lamentações dos frágeis que passaram junto da minha tenda e rapidamente os convidei a entrar. Senti a tristeza daqueles a quem lhes foi roubada a justiça, dos desfavorecidos olhados com desdém, das mulheres vítimas de violência, dos novos escravos do trabalho, dos sem-abrigo nem identidade e de tantos que carregam o pior que a humanidade tem. O espaço foi ficando apertado, mas a minha tenda deixou de estar vazia e eu deixei de ter frio.
Ouvi os incrédulos, gente sábia que tudo sabe sobre o que vê e pouco sabe explicar sobre o que sente. Não consegui sentir revolta nem sobranceria pois eu, por vezes também sou incrédula. Também eles entraram, talvez por curiosidade apenas, mas eram os que mais atentos estavam ao meu silêncio.
Ouvi famílias inteiras que conversavam entre si sobre as peripécias do dia, as zangas entre amigos, as chatices do trabalho, os maus resultados e pela primeira vez sorri! Também naquelas famílias reconheci a minha humanidade. Convidei-os a entrar e nem acharam estranho a tenda estar quase cheia, pois estavam habituados a uma casa cheia de pouco silêncio.
Ao longe ouvi pessoas em conflito e apeteceu-me esconder dentro da tenda para não ser envolvida em grandes confusões. Sabe Deus o quanto detesto confusões, a menos que seja eu a criá-las! Mas senti curiosidade, senti vontade de perceber o porquê do conflito, mas confesso, não percebi nada do que diziam e acho que eles também não se percebiam uns aos outros. Fiz uma abordagem, mas foi em vão, o que é certo, é que estavam tão distraídos que entraram na tenda. De repente fez-se silêncio.
Cansada que estava de tal alvoroço ergui os olhos ao céu e contemplei a beleza do pôr-do-sol, a brisa fria do anoitecer, e os luzeiros que surgiam ao longe. Senti a Tua criação em pleno, mas rapidamente reparei na Tua mais bela criação que ocupava a minha tenda como se fosse sua. Acolhi cada um com gentileza e sem juízos de valor (por mais que me apetecesse). Perguntei: Senhor que queres que eu faça?
Rapidamente pus a mesa, sim, porque sei que gostas de festa, pus o pouco que tinha, e sabes? Sobrou. Rapidamente deixou de haver crianças, jovens ou adolescentes, nem tão pouco frágeis, pecadores ou incrédulos, reinou o ambiente de família onde existem conflitos que se resolvem a conversar e dúvidas que se respondem com paciência, onde aos pecados, chamados erros e resolvemos com pedidos de desculpa, e as fragilidades recordam a humanidade de cada um de nós. Nem frio nem fome, nem tristeza nem ódio. A minha tenda Senhor, passou a ser Tua porque: onde há Amor, aí habita Deus.
E Tu amiga? Como é a tua tenda?
Raquel Rodrigues,
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