quarta-feira, 31 de janeiro de 2024

Tempo para ver



Tempo para sentir o que o corpo quer e diz.

Tempo para andar mais devagar. Para abrandar.

Tempo para respirar fundo.

Tempo para ver melhor.

Para fechar os olhos mais vezes e conversar com a escuridão clara de os ter fechados.

Tempo para curar.

Para amar melhor e começar por dentro. Por mim.

Para devolver na medida do que foi dado e acrescentar um pouco mais.

Fazer do nada o tudo.

E do tudo o quase nada.

Tempo para meditar. Para encher o peito de ar e acreditar.

Para escrever uma carta e para acreditar nas palavras que ali nascerem.

Tempo para ver o que precisa de ser visto. Para ler o que precisa de ser lido. Para tirar os dourados do que precisa de ser observado sem cores nem artifícios.

Tempo para não ir. Para não fazer. Para não arriscar. Para não dizer.

Tempo para ficar calado. Para escolher o silêncio e a paz.

Tempo para adormecer de consciência tranquila.

Para perceber que tudo é o que tem de ser.

Que tudo vem quando é o tempo e que tudo o que sabemos é o que precisamos de saber.

Tempo para guardar a alma das coisas que a fazem pequena.

Para a preparar para as coisas pequenas que a fazem grande.

Tempo para ver tudo
como se fosse a primeira vez.


Marta Arrais

terça-feira, 30 de janeiro de 2024

Jornadas do Clero das Dioceses do Centro.

 


Com início às 10h00, começaram hoje, dia 30 de janeiro, em Fátima, as Jornadas do Clero das Dioceses do Centro.

Na saudação aos presentes, o padre Emanuel Silva, da diocese de Portalegre-Castelo Branco, recordou que o formato destas Jornadas surgiu em maio de 2023, com a decisão dos bispos das dioceses de Aveiro, Coimbra, Leiria-Fátima, Viseu e Portalegre-Castelo Branco, no intuito de alargar experiências de formação diocesanas. A comissão então constituída trabalhou nos últimos meses e elaborou um programa que compreende exposições temáticas e ateliês de diálogo, sempre no sentido de “revisitar as origens da Igreja e, ao mesmo tempo, apresentar os atuais desafios que a cultura e o tempo lhe colocam”, disse.

Cerca de 250 sacerdotes das dioceses referidas, acompanhados pelos bispos respetivos, deslocaram-se a Fátima para viver uma experiência que se pretende de comunhão, partilha, reflexão, oração e convívio. O Santuário de Fátima foi escolhido pela sua centralidade e facilidade de logística para uma primeira experiência que, referiu o padre Emanuel, “servira de fundamento para próximas realizações em locais diferentes”.

Em nome dos bispos presentes, D. António Luciano, bispo de Viseu e vogal da comissão episcopal das vocações e ministérios, salientou o espírito sinodal, como modelo dinamizador destas jornadas. Para tanto recordou São Paulo, salientando que “a Graça e a paz de Jesus Cristo preencham os corações dos participantes de forma a que todos se sintam motivados e empenhados na vivência destes dias”. E, porque, como disse, “o desafio da renovação pastoral, veio para ficar, não se pode mais olhar para trás”. Antes, como Papa afirma, será necessário lançar um olhar de esperança — tendo em vista o Jubileu da Esperança que se celebrará em 2025 —, pelo que cada um dos participantes deverá viver todos os momentos das jornadas”. Terminando a sua alocução inicial, D. António, desejou que o regresso a casa seja como “os discípulos de Emaús animados, cheios de esperança, desejosos de renovar vidas e atividades”.

Pela organização: Pe. Rui Ribeiro

Sítio das Jornadas: https://www.leiria-fatima.pt/jornadasclero


Sei dialogar com o meu irmão?



Quando falamos da unidade dos cristãos, e para que esse diálogo seja útil e esclarecedor, temos que partir desta premissa: Nós, cristãos, somos o povo eleito, o povo escolhido, o povo reunido em nome do Senhor, que pelo seu amor nos salvou e nos salva continuamente. Um povo ao qual o Senhor confiou o Evangelho para que chegue a todo e cada ser humano.

Só a partir do encontro com o Amor de Deus que muda a nossa existência, poderemos viver em comunhão com Ele e uns com os outros. Assim, seremos capazes de oferecer a todo o ser humano um testemunho credível, dando conta da esperança que está dentro de nós e testemunhar uma fé adulta, que é capaz de confiar totalmente em Deus numa atitude filial.

Uma fé alimentada pela Oração, pela meditação da Palavra de Deus e pelo Estudo das verdades da fé para que a mensagem do Evangelho se aprofunde cada vez mais e chegue a todos. “Amarás ao Senhor teu Deus… e ao teu próximo como a ti mesmo”, é esta frase do Evangelho segundo São Lucas (10, 27), que é o tema do Oitavário de Oração pela Unidade dos Cristãos que, no hemisfério norte, decorre de 18 a 25 de janeiro.

Se é verdade que o clima atual, entre as Igrejas Cristãs, não é caracterizado por sentimentos de conflito, nem são autorizadas excomunhões mútuas, por outro, existem ainda muitas diferenças entre católicos e protestantes, especialmente a nível eclesiológico.

Basta pensarmos nas diferentes visões da relação entre ministros de culto e leigos, no papel das mulheres, que em muitas das Igrejas da tradição reformada podem hoje ser nomeadas pastoras, e nas diferentes abordagens de algumas questões éticas importantes.

Para haver um diálogo verdadeiro, creio ser necessário acabar com alguns preconceitos de parte a parte: do lado evangélico, evitar um certo complexo de superioridade quando dizem que os Católicos são conservadores; e do lado Católico, abandonar a ideia de que os protestantes estão inclinados a trair os princípios cristãos, para se conformarem com o pensamento predominante ou secular. Todos somos esse povo eleito!

No desígnio de Deus a Igreja é chamada a ser una. O que realmente causa escândalo, não é a diversidade das formas que contém, mas a sua constante oposição, a incapacidade de reconhecer o testemunho dos outros estilos eclesiais, o seu valor. Parece que esquecemos Cristo e o Seu Evangelho! Foi o que aconteceu no século XVI, na época da Reforma.

Na minha opinião, e creio não ser apenas minha, para que o verdadeiro diálogo continue, seria bom que as Igrejas falassem um pouco menos de si mesmas e das suas respetivas estruturas, colocando em primeiro plano aquilo que constitui a razão essencial da sua existência: o anúncio do Evangelho. O anúncio de Jesus Cristo!


Rezemos!



Paulo Victória

segunda-feira, 29 de janeiro de 2024

A vida é caminho...

 


A vida é caminho de seguir, não é caminho de ficar.
É caminho de percorrer ,o que nos parece "lugar comum", e tem tanto para contar.
É caminho de nos atrevermos em cada amanhecer.
É caminho partilhado, sem medo de perder.
É caminho de verdade, amor e compaixão.
A vida é caminho de servir e escutar o coração.


E por mais trilhos que surjam, todos nos levam de regresso a nós mesmos. Porque é aí que existe a fonte da vida.
E a vida, é caminho.


"Eu sou o caminho, a verdade e a vida." [Jo 14,6]


Carla Correia


domingo, 28 de janeiro de 2024

VIDA E SALVAÇÃO

 




A liturgia do 4.º Domingo do Tempo Comum reafirma a irreversível decisão de Deus de oferecer aos homens, em cada passo do caminho que percorrem na história, a Vida e a salvação. Os textos bíblicos que neste domingo nos são servidos mostram algumas das estratégias de que Deus se socorre para vir ao encontro dos homens e para lhes apresentar os seus desafios e propostas.

A primeira leitura propõe-nos – a partir da figura de Moisés – uma reflexão sobre a missão profética. O profeta é alguém que Deus escolhe, chama e envia para ser a sua “palavra” viva no meio dos homens. Através dos profetas, Deus apresenta-nos, em linguagem que entendemos, as suas indicações e propostas.

Se o profeta é designado para tornar presente no meio dos homens o projeto de Deus, ele não pode utilizar a missão em benefício próprio. O profeta não deve ceder à tentação de se vender aos poderes do mundo e pactuar com eles, a fim de concretizar a sua sede de poder; não pode “vender a alma ao diabo” para daí tirar algum benefício; não deve utilizar o seu ministério para conseguir sucesso, para promover a sua imagem e obter os aplausos das multidões. A missão profética tem de estar sempre ao serviço de Deus, dos planos de Deus, da verdade de Deus, e não ao serviço de esquemas pessoais, interesseiros e egoístas.

O Evangelho
mostra como Jesus, o Filho de Deus, com a autoridade que lhe vem do Pai, renova e transforma em homens livres todos aqueles que vivem prisioneiros do egoísmo, do pecado e da morte.

Para Marcos, a proposta de Deus chega torna-se realidade viva e atuante em Jesus. Ele é o Messias libertador que, com a sua vida, com a sua palavra, com os seus gestos, com as suas ações, vem propor aos homens um caminho novo de liberdade e de vida. Ao egoísmo, Ele contrapõe a doação e a partilha; ao orgulho e à autossuficiência, Ele contrapõe o serviço simples e humilde a Deus e aos irmãos; à exclusão, Ele propõe a tolerância e a misericórdia; à injustiça, ao ódio, à violência, Ele contrapõe o amor sem limites; ao medo, Ele contrapõe a liberdade; à morte, Ele contrapõe a vida. Estou disponível para caminhar com Jesus, para acolher as suas propostas, para abraçar o seu projeto, para acolher a libertação que Ele me veio oferecer?

A segunda leitura
convida os crentes a repensar as suas prioridades e a não deixar que as realidades transitórias sejam impeditivas de um verdadeiro compromisso com as realidades perenes, nomeadamente o serviço de Deus e dos irmãos.

Paulo vê na castidade por amor do Reino uma forma de vida que liberta o coração do homem para o serviço de Deus e dos irmãos. E na verdade, hoje como ontem, muitos homens e mulheres sentem-se chamados por Deus a viverem deste jeito para serem mais livres na sua doação e no seu serviço. Nem sempre o mundo os aprecia e entende. Muitas vezes são mesmo criticados e ridicularizados pela sua opção. Mas essas pessoas generosas, de coração livre, que colocaram o serviço de Deus e dos irmãos como prioridade absoluta, são um dom de Deus à Igreja e ao mundo. Estamos conscientes disso e agradecemos a Deus esse dom?

www.dehonianos.org

sexta-feira, 26 de janeiro de 2024

A DIOCESE DE PORTALEGRE CELEBRA 475 ANOS


Foi em 21 de agosto de 1549 que o Papa Paulo III, com a Bula ‘Pro Excellenti Apostolicae Sedis’, criou a Diocese de Portalegre, por desmembramento da Diocese da Egitânia/Guarda. Fortunato de Almeida, na História da Igreja em Portugal, publica, em latim e português, essa bula de ereção da Diocese. Aconteceu após a morte de D. Jorge de Melo, Bispo da Guarda, controverso, falecido em Portalegre, em 5 de agosto de 1548, fez 475 anos de falecimento em agosto passado. Em vida, já ele próprio tinha manifestado o desejo desse desmembramento. Depois de algumas reticências do Papa Paulo III, o empenho do Rei D. João III fez valer os seus argumentos em favor da criação da Diocese, elevando também, no ano seguinte, Portalegre a cidade. D. Julião de Alva foi o seu primeiro Bispo. O Papa Paulo III morreu logo a seguir, em novembro. Por isso, só no ano seguinte, em 2 de abril de 1550, pelo Breve Dudum felicis recordationis do Papa Júlio III, é executada a bula com a qual se havia criado a Diocese. A igreja de Santa Maria do Castelo, gótica, dos finais do século XIII, serviu de primeira catedral. Sem as condições que o Papa exigia e com a promessa do Rei em ajudar a criá-las, o Bispo logo pôs mãos à construção duma nova catedral. A primeira pedra foi lançada em 14 de maio de 1556, no local onde era a igreja de Santa Maria do Castelo, tendo-se adquirido e demolido outras construções para o efeito. Não há data de inauguração da nova Catedral, e, por estranho que pareça, só foi sagrada em 6 de maio de 1926, por D. Domingos Maria de Frutuoso, sepultado que está no cemitério da Degracia, no Gavião.
Cerca de 222 anos depois, em 7 de junho de 1771, por novo desmembramento da Diocese da Egitânia/Guarda, foi criada, pelo Papa Clemente XIV, a Diocese de Castelo Branco.
Na reforma da divisão eclesiástica de Portugal, decretada pelo Papa Leão XIII em 30 de setembro de 1881, pela Bula ‘Gravissimum Christi’, esta Diocese de Castelo Branco foi extinta, durou apenas 110 anos, só teve três bispos. O seu território foi integrado na Diocese de Portalegre, bem como algum território da Diocese de Elvas, também extinta. Com as fronteiras assim alargadas, continuou a chamar-se apenas ‘Diocese de Portalegre’. Só cerca de 175 anos depois, é que o Bispo de então, D. Agostinho Joaquim Lopes de Moura, natural de Vila Real e falecido em Vila das Aves, pediu a Roma que se associasse ao nome da Diocese de Portalegre também o nome de Castelo Branco. O Núncio Apostólico em Portugal, D. Fernando Cento, deu apoio ao pedido do Bispo diocesano e o Papa Pio XII confirmou. Assim, pelo decreto de 18 de julho de 1956 da Sagrada Congregação Consistorial, a igreja de São Miguel Arcanjo é elevada “à dignidade e grau de Igreja Concatedral, de modo a poder e dever, de novo, levantar-se nela, a partir de agora, a Cátedra Episcopal”.
Atenda-se, porém, a que a Diocese de Castelo Branco tinha sido extinta. Com esta junção do seu nome à Diocese de Portalegre, da qual ela já fazia parte, não foi restaurada. Não são duas dioceses, é uma só. Por isso, não se deve dizer nem escrever Diocese de Portalegre e Castelo Branco, mas Diocese de Portalegre-Castelo Branco, sem ‘e’ no meio, coisa que nem sempre se tem em conta. Aliás, também nos princípios desta mudança de nome, erradamente, assim se dizia, escrevia e publicava, talvez devido a deficiente tradução dos documentos originais. Também é possível que os amanuenses desses documentos, em latim, os tivessem escrito com essa imprecisão. Esses documentos, ou sumiram numa qualquer guerra de gente distraída, ou têm vergonha de aparecer. Por força deles, para além do Bispo ter a obrigação de residir algum tempo, em cada ano, em Castelo Branco, tanto Portalegre como Castelo Branco conservam o título de sede episcopal. São Miguel Arcanjo é o titular da Concatedral de Castelo Branco. Duvido, no entanto, se Nossa Senhora da Assunção será mesmo a titular da Catedral de Portalegre. Talvez cause admiração eu dizê-lo, mas apenas coloco a dúvida para ver se alguém é capaz de esclarecer, com documentos, claro. De há uns tempos a esta parte, todos dizem e escrevem isso. No entanto, é estranho, e todos sabemos que a história também tem as suas ironias, caprichos e erros. E quando esses erros são cometidos por pessoas consideradas peritas, por autoridades na matéria, se outros confiam e lá vão beber, por vezes bebem zurrapa em vez de alvarinho, água contaminada em vez de água limpa e cristalina como a de Monchique. Não estou a dizer que isso aconteceu neste caso, estou só a questionar. Luís Keil, no seu Inventário Artístico de Portugal, 1943, é quem, tanto quanto para trás conseguimos ir, refere Nossa Senhora da Assunção como titular da Catedral. A Enciclopédia Verbo e outros, mais para cá, incluindo padres que deixaram livros escritos, também o dizem, escrevem e publicam, como, aliás, também foi dito e publicado no livro das Atas, apresentado no ano passado em Vila Viçosa, sobre o Congresso “Mulher, Mãe e Rainha: 375 anos da Coroação de Nossa Senhora das Conceição’.
A minha dúvida - e não só minha! -, baseia-se sobretudo em duas razões. A primeira é que a belíssima imagem que lá está na tribuna da capela-mor da catedral, adquirida por D. Amador Arrais, não se apresenta com os sinais iconográficos das tradicionais imagens de Nossa Senhora da Assunção, até tem o Menino ao colo. A segunda razão é que a Catedral foi feita sobre a igreja de Santa Maria do Castelo, e esta imagem de Santa Maria do Castelo, no século passado ainda se encontrava na Catedral. E ainda: quando, em 6 de maio de 1926, D. Domingos Maria de Frutuoso sagrou a Catedral, a placa que lá se encontra a sinalizar o ato, do lado direito do altar, diz que ele consagrou “...esta igreja e este altar em honra da gloriosa Virgem Maria...”, não refere o título de Nossa Senhora da Assunção. Será que temos aqui o caso de um erro muitas vezes repetido se faz valer como verdade? É certo que entre as várias pinturas do retábulo maneirista, ao alto, se encontra uma evocação da Assunção da Senhora, mas é irrelevante como resposta à questão.
Não sei por que bulas, quais as razões e em que tempo do século passado, a imagem de Santa Maria do Castelo pediu abrigo à Casa Episcopal, onde se encontra à espera de regressar a sua casa. Além disso, em Portugal, se há várias catedrais dedicadas a Nossa Senhora da Assunção, são mais as dedicadas a Santa Maria. Conclusão para sossego de todos: desse as voltas que se der, a única certeza que temos é que é sempre a mesma Senhora, a Mãe de Deus e Mãe nossa. O que ela tem é um amplo e riquíssimo guarda-roupa, com uma gama imensa de vestidos, todos diferentes e bonitos, de vários tecidos, tons, cores e cortes, sempre na moda, ao gosto da ternura e devoção do povo e da sensibilidade crente dos artistas.
O Papa Leão XIII, em 11 de maio de 1896, constituiu Santo António de Lisboa, como Padroeiro da Cidade de Portalegre e de toda a Diocese.
Em 23 de maio do ano de 1550, no ano seguinte à criação da Diocese, o rei D. João III, que já colaborara na criação da Diocese, elevou Portalegre a cidade, a qual se tornou capital de Distrito em 18 de julho de 1835, aquando da divisão do território de Portugal em distritos. Em 23 de maio de 2025, a cidade perfaz 475 anos de existência.
Não sendo duas dioceses, esta celebração é de toda a Diocese de Portalegre-Castelo Branco. No entanto, é de prever que, mesmo com toda a criatividade que possa haver pela área diocesana, a incidência maior venha a ser em Portalegre e nas terras deste Alto Alentejo.

D. Antonino Dias - Bispo Diocesano
Portalegre-Castelo Branco, 26-01-2024.

O amor pode tudo!


“Amados, amemo-nos uns aos outros; porque o amor é de Deus; e qualquer que ama é nascido de Deus e conhece a Deus. Aquele que não ama não conhece a Deus; porque Deus é amor.”

1 João 4,7,8

O amor alimenta o que somos e o que temos. É com amor que sustentámos as nossas relações e o sentido da nossa existência. No amor e com amor somos capazes de compreender o outro através do olhar. No amor e com amor somos capazes de curar com a nossa presença. No amor e com amor somos capazes de dar esperança com as nossas palavras. No amor e com amor somos capazes de esperar por quem já não sabe como regressar a casa.

E é no amor que vamos dando a conhecer este Deus. No amor com que uma avó espera todos os dias pela chegada do seu neto. No amor com que um pai abraça a sua filha. No amor com que um casal se olha prolongadamente. No amor com que os amigos se amparam no momento da dor. No amor com que alguém cuida de quem já não tem autonomia ou forças para se cuidar. No amor com que uma família comemora a existência dos seus ascendentes. No amor com que uma criança conta os seus sonhos e as suas fantasias. No amor com que voluntários servem refeições aos mais desfavoráveis. No amor com que alguém escuta as preocupações e as angústias de quem se sente perdido. No amor com que uma pessoa é capaz de perdoar para que alguém possa recomeçar.

São João define Deus no amor. Um Deus que habita o mais puro que existe no ser humano. Um Deus que habita no que pode fazer a diferença quando o impossível parece ser uma certeza. Um Deus que habita no que nos faz mover quando parece que já nada nos levanta. Um Deus que habita no silêncio capaz de traduzir o que somos. Um Deus que aviva o que parece condenado a ser finalizado.

Amados. Nós, cristãos, somos os amados. Teremos consciência disto? Como poderemoster fé se não nos sentimos amado? Como poderemos ter fé se não amamos o outro? Como quereremos que outros tenham fé se não testemunhamos o amor? Como quereremos que outros tenham fé se não permitimos que o outro seja amado?

Se Deus é amor e nos considerámos seus seguidores, então porque não vivemos como amados que vivem para amar? Porque é que não vivemos obcecados em fazer com que todos se sintam amados?

Viver a fé na certeza do amor é arriscar no incerto e no concreto da nossa vida. Viver a fé na certeza do amor é encontrar Deus em tudo e em todos. Viver a fé na certeza do amor é reconhecer que não há nada em nós que não esteja inscrito em Deus.

Deus é amor, por isso Deus pode o que o amor pode. E nós, bem sabemos, que o amor pode tudo!

Emanuel António Dias,

quinta-feira, 25 de janeiro de 2024

O perdão é tarefa para uma vida inteira



Falamos sobre o perdão como se fosse simples. Como se pudéssemos carregar num botão e ativar essa funcionalidade que nos mudaria a vida e nos tornaria numa espécie de cúmulo do altruísmo. Não é assim que funciona.

Há alguns dias que esta ideia tem dançado na minha cabeça: o perdão é trabalho para a vida inteira. A verdade é que perdoar é difícil. Pode tornar-se, até, insuportável. Dependendo do que nos tenha sido feito, podemos demorar até conseguir, sequer, equacionar esta possibilidade. Entendemos o perdão como um presente que vamos oferecer a quem nos ofendeu. Uma espécie de livre-trânsito para continuarem por aí a magoar-nos ou a ferir outros.

Mas, na realidade, o perdão é um presente que nos oferecemos a nós próprios. É um bálsamo para colocar na ferida triste e velha que, às vezes, carregamos durante tantas décadas. Ainda assim, é-nos difícil assimilar esta perspetiva. Sentimo-nos também culpados por termos deixado (ou por termos permitido) que nos magoassem. E talvez seja por isso tão difícil oferecer-nos o perdão ou encontrar lugar para este presente nas nossas vidas.

O perdão é trabalho para uma vida. E, para algumas mágoas, talvez fossem necessárias duas vidas. Ou mais.

Mas mais do que conseguir encontrar espaço para o perdão, é preciso ter coragem para o querer. Ter vontade de perdoar pode ser tão corajoso como o próprio ato de o conseguir, efetivamente, fazer.

Neste início de ano, e imersos num mês de janeiro tão comprido, que possamos encontrar tempo para perceber que partes de nós precisamos de perdoar. Deixar cair essa vontade (ou ilusão) de que poderíamos ter feito diferente e aceitar que foi como foi. E aceitar que é como é. Depois, e numa tentativa séria de perscrutar o que nos habita a alma, tentar lembrar cada um daqueles que nos deram razões para chorar ou que nos tornaram a vida num lugar pior. Perceber que, muitas vezes, quem magoa também foi magoado. Perceber que quem magoa precisa de aprender a dar amor de outra maneira.

Não nos deixemos iludir. O que escrevo é dificílimo. Quase tremendo de estivermos a falar de pessoas que nos destruíram a vida, por exemplo. Mas… queremos dar-lhes o direito de o continuar a fazer?


Marta Arrais

quarta-feira, 24 de janeiro de 2024

O lugar do outro...



O lugar do outro ...

É um caminho que exige um coração disponível e humilde, para compreender que apenas chegamos na mesma medida de aceitação e vontade de quem nos espera.

O que cada um sente, pensa e experiência é individual, único e precioso.
Entre o meu lugar e o lugar do outro existe um espaço e um tempo de respeito, tolerância e entrega.

Caminhar para o lugar do outro é darmo-nos na medida daquilo que o outro precisa e não na medida daquilo que nos parece fazer sentido. Oferecer a ajuda que é desejada, independentemente daquilo que "eu" gostaria de dar.

Caminhar para o lugar do outro, não poderá ser nunca retirar-lhe poder. Poder de escolha, de pensar, de sentir, de experienciar a sua vida e evoluir com ela.
O caminho para o lugar do outro é dar-lhe liberdade e não torná-lo dependente da nossa perspetiva. É aceitarmos, lembrando-nos que cada um de nós se conhece com e pelo outro.

Caminhar para o lugar do outro, é reconhecer que quando alguém vem até nós nos permite ser um dom para quem chega.

Caminhar para o lugar do outro é proteger, preservar, respeitar e promover a dignidade de cada um.
Será só nesta condição de atenção, cuidado e amor ao próximo que a consciência da humanidade se pode elevar.

Caminhar para o outro é o Amor de Deus em expressão.


Carla Correia

terça-feira, 23 de janeiro de 2024

Um ano bonito



Um ano bonito é o teu abraço. O teu abraço a abrigar, a ser casa. Sem desacolher.

Um ano bonito é a tua mão. A tua mão a confortar, a acompanhar. Sem desenlaçar.

Um ano bonito é o teu olhar. O teu olhar a olhar mais fundo, a tocar almas. Sem frieza.

Um ano bonito é o teu sorriso. O teu sorriso a abraçar, a iluminar. Sem acinzentar dias, vidas, corações.

Um ano bonito é a tua ternura. A tua ternura a serenar, a curar. Sem sobressaltar.

Um ano bonito é o teu colo. O teu colo a segurar, a cuidar. Sem desamparar.

Um ano bonito é a tua palavra. A tua palavra a falar do coração, ao coração. Sem ferir.

Um ano bonito é o teu silêncio. O teu silêncio a escutar corações, a compreender. Sem desalentar.

Um ano bonito é o teu gesto. O teu gesto feito de amor, a salvar. Sem tirar o chão.

Um ano bonito é o teu coração. O teu coração a inspirar bondade, a ser de verdade. Sem atormentar.

Um ano bonito é a tua vida. A tua vida a tatuar amor por aí, todos os dias. Sem desamor.

Um ano bonito é o teu amor. O teu amor a mudar o mundo.

Um ano bonito és tu. És tu a ser, sempre, amor.


Daniela Barreira

segunda-feira, 22 de janeiro de 2024

Diz-me Senhor, que queres que eu faça?


Querida amiga, já te sentiste numa espécie de encruzilhada com decisões para tomar, mas com tantas condicionantes que não te ajudam a decidir?

Volta e meia surge um projeto, uma decisão, uma mudança possível que te obriga a parar e refletir e pensar em todas as possibilidades. Umas vezes somos obrigados a mudar, não temos escolha, nem alternativa. Aquele processo acabou e pronto temos de mudar. Pode custar, mas qual era a alternativa? Siga!

Os maiores dilemas podem surgir, quando estás num caminho e pensas que poderias escolher outro. Pode ser um curso, um emprego, um projeto social, algo que te obrigue a sair do comodismo que já está instalado e que às vezes é tudo o que precisamos: a rotina. Mas, lá está, de vez em quando somos sobressaltados por ventos de mudança, por sonhos que nos inquietam e perspetivas que nos desafiam e que nos põem desconfortáveis e à procura de algo mais. E depois de sentires isso…não há volta a dar, não há como voltar atrás.

Parece que, até à tomada da decisão, estamos constantemente à procura de prós e contras e a sofrer de angústia para discernir o que realmente temos de fazer.

Ora isso pode ser continuar no mesmo caminho, e esperar outras oportunidades, e aceitas isso com normalidade. Noutras alturas, pode apenas significar que segues o mesmo caminho, mas carregas mais pesos.

Pode ser mais uma formação que te esgota o tempo livre, mais um trabalho que te ocupa as noites…um sei lá de tarefas que poderias ter optado não aceitar, mas aceitas-te numa expectativa muito pessoal.

Outras vezes, a decisão, implica uma mudança de caminho. Mudar de emprego, mudar de casa, mudar de país…essas decisões são tão difíceis!

Em qualquer uma delas devemos perguntar: Senhor, que queres que eu faça? E esperar…o silêncio de quem aguarda as palavras daqueles a quem humildemente pedimos conselho, e a voz da nossa intuição, pois em cada uma delas se revela a voz de Deus.

Depois, depois é seguir caminho e caminhar com a melhor postura possível, mesmo que a escolha não tenha sido, aparentemente, a melhor.

E tu amiga, consegues ouvir o que o Senhor quer que tu faças?


Raquel Rodrigues

domingo, 21 de janeiro de 2024

O Apelo â conversão

 




A liturgia do 3.º Domingo do Tempo Comum lembra-nos que Deus conta connosco para sermos arautos, no mundo, da sua Vida e da sua salvação; e desafia-nos a acolher de braços abertos o chamamento que, nesse sentido, Deus nos dirige.

A primeira leitura diz-nos – através da história do envio do profeta Jonas a pregar a conversão aos habitantes de Nínive – que Deus ama todos os homens e a todos chama à salvação. Jonas, mesmo contra vontade, vai ser o instrumento de Deus para que os ninivitas repensem o caminho que estão a seguir e deem um novo sentido às suas vidas.

Jonas, o homem que Deus chamou, mas que procurou evitar comprometer-se na missão, convida-nos a reflectir sobre a resposta que temos dado ao chamamento de Deus. O nosso comodismo, o nosso bem-estar, os nossos medos, o nosso egoísmo, a nossa miopia, alguma vez nos impediram de acolher o chamamento de Deus e de abraçar a missão que Deus nos entregou? E temos consciência de que ignorar os desafios de Deus é, em boa parte, falhar o sentido da nossa vida?

No Evangelho, Marcos descreve-nos os primeiros passos de Jesus no anúncio do Reino de Deus; e, na sequência, mostra-nos o convite que Jesus deixa a alguns discípulos no sentido de colaborarem com Ele na construção do Reino.

Para que o “Reino de Deus” se torne uma realidade cada vez mais impactante, o que é necessário fazer? Na perspetiva de Jesus, o “Reino de Deus” exige, antes de mais, a “conversão”. Converter-se implica alterar as nossas atitudes de egoísmo, de orgulho, de autossuficiência, de comodismo e de voltar a escutar Deus e as suas propostas, para que aconteça, na nossa vida e à nossa volta, uma transformação radical – uma transformação no sentido do amor, da justiça e da paz. Pessoalmente, o que devo mudar na minha maneira de pensar e de agir para que o Reino de Deus seja uma realidade mais presente na minha vida e na vida dos que me rodeiam? E, no que diz respeito aos valores que a sociedade de que faço parte cultiva, quais favorecem e quais impedem a construção do Reino de Deus?

A segunda leitura convida o cristão a ter consciência de que “o tempo é breve” – isto é, que as realidades e valores deste mundo são passageiros e não devem ser absolutizados. Deus convida cada cristão, em marcha pela história, a viver de olhos postos no mundo futuro – quer dizer, a dar prioridade aos valores eternos, a converter-se aos valores do “Reino”.

Na verdade, o cristão deve viver com a consciência de que “o tempo é breve”. Ele sabe que a sua vida não encontra sentido pleno e absoluto nesta terra e que a sua passagem por este mundo é uma peregrinação ao encontro dessa vida verdadeira e definitiva que só se encontra na comunhão plena com Deus. Para chegar a atingir esse objetivo último, o cristão deve converter-se a Cristo e segui-l’O no caminho do amor, da entrega, do serviço aos irmãos. Tudo aquilo que deixa um espaço maior para essa adesão a Cristo e ao seu caminho deve ser valorizado e potenciado. É aí que deve ser colocada a nossa aposta.

www.dehonianos.org.

sábado, 20 de janeiro de 2024

RODEAR-SE-ÃO DE MESTRES A SEU BEL-PRAZER



Vamos viver um novo Domingo da Palavra, da Palavra de Deus. As pessoas de bem, conscientes das consequências funestas que as palavras podem ter, sabem usá-las com prudência, e, muitas vezes, como excelente meio para tocar a mente e o coração das pessoas, para lhes potenciar respostas e ações positivas, para lhes provocar mudança de rumo. Com a palavra, partilham-se e expressam-se ideias e sentimentos, conhecimentos e preocupações, provocam-se atitudes e bons comportamentos, transforma-se o mundo. Usada como instrumento ao serviço da paz e do bem fazer, a boa palavra marca a diferença e produz efeito: ‘onde há ódio, leva o amor, onde há ofensa, leva o perdão, onde há discórdia, leva a união, onde há dúvida, leva a fé, onde há erro leva a verdade, onde há desespero, leva a esperança, onde há tristeza, leva a alegria, onde há trevas, leva a luz’.
A atitude de quem usa a palavra para difamar, caluniar, ofender, minimizar, manipular, dividir, destruir pessoas e famílias tem consequências terríveis. Semeia ventos e tempestades, colhe a satisfação de sentir os outros a sofrer pelo mal que lhes faz, um mal, do qual, não raro, jamais se conseguem libertar. São Paulo adverte: “exorto-vos a que tenhais cautela com os que provocam divisões e escândalos...; desviai-vos deles...com palavras lindas e lisonjeiras enganam os corações dos ingénuos” (Rm 16, 17-18).
Deus também se quis comunicar connosco, por amor. Ele próprio fez-se Palavra e boa notícia. Na sua bondade e sabedoria, depois de ter comunicado muitas vezes e de muitos modos, pela criação, pelos profetas, pela história da salvação vivida pelo povo de Israel, falou-nos através de Seu Filho, o verbo eterno, que nos revelou o Pai e deu a conhecer o mistério da sua bondade e misericórdia. Deus falou e continua a falar aos homens como amigo. A todos e a cada um Ele fala na sua própria língua e circunstâncias, na sua história e cultura, em todos os tempos. Assim como o Verbo de Deus se assemelhou aos homens, fazendo-se homem pela encarnação, assim a linguagem de Deus se torna intimamente semelhante à linguagem humana (cf. DV13...).
À luz da razão, o homem pode chegar a ter algum conhecimento de Deus. No entanto, através da revelação de si mesmo, Deus quis transformar esse conhecimento, pela fé e pelo Espírito Santo, numa relação de amor. Por meio de palavras, obras, sinais e prodígios, intimamente relacionados entre si, o Filho de Deus quis viver e conviver com os homens. Caminhando com eles, fazendo-se companheiro de viagem, convidou-os à comunhão com Ele e entre si, manifestou-lhes a vida íntima de Deus - quem o vê, vê o Pai -, consumou a obra de salvação em obediência ao Pai. N’Ele, em Jesus, tudo fala de Deus. A sua humanidade torna visível o mistério de Deus invisível, é o Deus connosco. Com a sua doação na cruz e gloriosa ressurreição venceu a morte, deu-nos a vida, libertou-nos das trevas do pecado e da morte, ressuscitou. Como Ele e por Ele, também nós haveremos de ressuscitar para a vida eterna. Pelos tempos fora, o dom do Espírito Santo que Ele nos enviou, ajuda-nos a entender o mistério de Deus por Ele revelado e o sentido da nossa vida, para que possamos viver como seus irmãos e filhos de Deus, herdeiros dos bens do Pai, agradecidos e fiéis.
Somos criados pela Palavra e destinatários da mesma, à qual devemos abrir o nosso coração. Não nos podemos compreender nem perceber a nossa missão sem a escuta da palavra divina que precisa da nossa resposta livre para que Deus entre na nossa vida.
Por isso, a Palavra de Deus é indispensável na liturgia, na catequese, na oração pessoal e comunitária, na dinâmica da conversão, em toda a ação eclesial e pastoral. É uma fonte inesgotável de crescimento espiritual e de encontro com Deus. “É viva e eficaz, mais afiada que uma espada de dois gumes; penetra até à divisão da alma e do corpo, das articulações e das medulas, e discerne os sentimentos e intenções do coração” (Hb 4,12). Torna-nos verdadeiramente livres, levando-nos a fazer o bem que queremos e a evitar o mal que não queremos (cf. Rm 7,19-20). Quando acompanhada de oração, do diálogo entre Deus e o homem, a Palavra de Deus aperfeiçoa, liberta, limpa a mente, a alma e o coração, purifica, santifica, ajuda a discernir o que é bom, o que é perfeito. “É adequada para ensinar, refutar, corrigir e educar na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e esteja preparado para toda a obra boa” (2Tim 3, 14-17). Por isso, a forte exortação de São Paulo a Timóteo continua atual para todos: “proclama a palavra, insiste em tempo propício e fora dele, convence, repreende, exorta com toda a compreensão e competência. Virão tempos em que o ensinamento salutar não será aceite, mas as pessoas acumularão mestres que lhes encham os ouvidos de acordo com os próprios desejos. Desviarão os ouvidos da verdade e divagarão aos sabor das fábulas. Quanto a ti, sê sóbrio em tudo, suporta o sofrimento, faz o trabalho de um anunciador do Evangelho, realiza plenamente o teu ministério” (2Tim 4, 1-5).

D. Antonino Dias - Bispo Diocesano
Portalegre-Castelo Branco, 19-01-2024.

A Era do descartável.


Querida amiga, sinto que nos desapegamos muito rápido das coisas ou melhor das pessoas. Confesso que também sou um pouco assim! Aceito que na minha vida surgem pessoas, e outras desaparecem, ou seja, reconheço que algumas pessoas não vão estar na minha vida de modo permanente. Não quer dizer que não são, ou foram, importantes apenas que estiveram mais próximas num certo momento da minha vida e por certos períodos se afastam, pelas mais diversas razões, mas que isso não implica deixarem de ser importantes. Mas não são todas! Algumas pessoas são mesmo insubstituíveis, incomparáveis e fazem-nos falta… SEMPRE!

No entanto, assombra-me uma outra ideia mais triste: é sermos descartáveis. Que apenas servimos para cumprir uma certa missão e depois… vem outra pessoa.

Somos muito facilmente substituídos, e ainda bem que somos, mas não seria melhor disfarçar este facilitismo e dar valor a quem sai. Não falo em hipocrisia mas em cortesia, simpatia e educação. Quando me envolvo em projetos gosto de dar o meu melhor e não estou habituada a desistir de nada, mas recentemente fiz isso e senti-me muito mal... mas fez-me bem.

Por um lado tinha de libertar pesos e tive a coragem de reconhecer que não sou tão forte como achava.

Por outro, foi uma lição de humildade pois reconheci que “não conseguia” e senti-me julgada e avaliada pelos outros, ou seja, numa posição que, por norma era eu que estava. E se achava que as pessoas reconheciam o meu trabalho, passei a sentir que na prática isso não é assim tão importante até porque” o espetáculo tem de continuar”. Afinal, não és assim tão importante nem digna de melhores considerações!

Sair de algo, abdicar de uma tarefa, não é um processo fácil e acho que as pessoas não cultivam a empatia de se esforçar por tecer algumas palavras simpáticas para, pelo menos, atenuar o desconforto que quem assume que não consegue. (Somos prontos a criticar e pobres a reconhecer.)

E o resultado? No meu, senti-me descartada!

Senti que todo o meu empenho, esforço e dedicação foi abafada pelo “desistiu”, "que pena vem outro” ou “vemo-nos por aí”.

E é assim que ficamos, e se calhar é assim que tem de ser, sem honras de estado, nem grandes despedidas. Se calhar sim, mas sabe tão mal.

E tu amiga, já alguma vez te sentiste descartada?


Raquel Rodrigues

sexta-feira, 19 de janeiro de 2024

Qual a novidade do Cristianismo?



Qual a novidade do Cristianismo? Num tempo onde tudo passa cada vez mais depressa e onde as pessoas, apesar da busca e da sede espiritual, não se conseguem sentir acolhidas nas suas inquietações, nas suas preocupações e dores, talvez tenha chegado o tempo de nos questionarmos: qual a novidade do Cristianismo?

A resposta a esta pergunta pode ser dada com a vivência e a relação que cada um de nós tem com Deus. Pode também ser dada a partir da figura de Jesus, o Nazareno, que é mestre em continuidades e descontinuidades e, por isso, é Ele a representação da novidade. Ou podemos ainda, de forma mais desafiante, criar perguntas para, desta forma, não cairmos na monotonia de tudo saber e de tudo compreender.

Qual a novidade do Cristianismo? Talvez a grande novidade continue a ser a possibilidade de todos poderem ser. Sim, constatamos que, na vivência e na relação, o Espírito Santo continua a soprar em tudo e em todos. Verificamos, através da diversidade, quanta novidade pode surgir na história de cada um de nós. Ao podermos ser estaremos mais pertos de poder vivenciar a presença de Deus na nossa vida. Ao podermos ser estaremos mais pertos de poder vivenciar a presença de Deus nos outros. Ao podermos ser estaremos mais pertos de concretizar o Reino de Deus.

Uma outra possibilidade de resposta para a questão “Qual a novidade do Cristianismo?” passa pela sua figura principal: Jesus, o Nazareno, o Cristo. N’Ele reconhecemos a importância do toque para podermos ressuscitar. N’Ele reconhecemos a importância do olhar para amar. N’Ele reconhecemos a importância da palavra para podermos recomeçar. Jesus Cristo, não se esgota e é para sempre novidade, porque não permite que nada seja finalizado. Jesus Cristo permite, isso sim, que seja encontrada a finalidade. Vezes sem fim. Compadecendo-se. Reerguendo. Amando. Jesus Cristo representa a novidade do Cristianismo, porque é Ele que continua a oferecer a possibilidade de encontrarmos sempre o novo, o que nunca foi visto e o que nunca foi feito.

No entanto, bem sabemos que as perguntas da nossa vida nem sempre são respondidas com afirmações. E sabemos ainda que os caminhos da fé e da espiritualidade não são cimentados por respostas, mas sim por questões que nos permitem viver a nossa busca e a nossa sede. E que grande novidade nos continua a oferecer o Cristianismo: perguntar, questionar, fazer caminho. O Cristianismo continua-nos a desafiar questionando-nos todos os dias: de que vale viver a vida se não for para recomeçar? De que vale viver a vida se não permitir que outros possam recomeçar? De que vale viver a vida se não alimento e demonstro a alegria de me saber amado/a por Deus? De que vale viver a vida se não procuro Aquele que é Caminho, Verdade e Vida?

Nos dias de hoje, o Cristianismo continua a ser uma novidade mesmo que aos nossos olhos e na sua representação institucional aparente estar envelhecida, perdida e com cheiro a mofo. O Cristianismo continua a ser uma novidade porque não se fecha em ninguém, nem em nenhuma instituição. O Cristianismo continua a ser uma novidade sempre que alguém se desafie a viver a diversidade e a procura pelo sentido da vida, através da radicalidade apresentada por Jesus, o Nazareno.

Emanuel António Dias

quinta-feira, 18 de janeiro de 2024

Cada passo é um salto!


Não é muito importante se estás longe ou perto. Importa a direção, não se estás a ver resultados ou não. Não deixes que o desânimo inocente tome conta da tua alma. A vida já te deve ter ensinado que uma frustração pode ser apenas uma forma de impaciência.

Não é muito importante se vais depressa ou devagar. Importa mesmo é se queres ou não cumprir o rumo que segues.

Não é muito importante se é algo que te está a atrair para diante ou se é algo que te empurra a partir de trás. Importa a direção, a rota, a orientação.

Insiste face às dificuldades e resiste às tentações. Os caminhos errados são sempre mais fáceis e a descer…

Não desistas de acreditar. Não desistas de recomeçar. Não desistas.

Cuidado. A teimosia é a persistência na estupidez. Os teimosos parecem gente determinada, quando na verdade lhes faltam três qualidades essenciais: saber para onde ir, por onde ir e valorizarem-se a si mesmos ao ponto de se orgulharem dos seus erros e chamarem fidelidade ao seu ódio de aprender com humildade.

É muito importante mantermo-nos atentos aos sinais e às lições que a vida nos vai dando a cada dia. Não é natural aprender com a história. Há quem cometa o mesmo erro vezes sem conta, sem nunca se questionar qual a razão pela qual o erro acontece, nem pensar alguma vez em mudar de estratégia.

O caminho certo é composto por muitas curvas. O mapa não está feito, faz-se, dia a dia, através das nossas escolhas e dos seus resultados a longo prazo. Manter o dia de amanhã em aberto é sinónimo de sucesso, porque significa que estamos e estaremos atentos às mudanças nas nossas circunstâncias.

Mantém-te atento e lembra-te de que cada passo é um salto.

Não esperes que a lógica te ajude a justificar o sentido da tua vida. Faz o que tens a fazer, mas sem esperar compreender bem por que razões o deves fazer.

Segue adiante, porque enquanto estiveres a avançar, estás a ganhar.



José Luís Nunes Martins

quarta-feira, 17 de janeiro de 2024

Só nos falta beber...


Nem sempre fazer o bem ao próximo faz com que sintamos a presença de Deus nas nossas vidas e é por isso que é necessário um combustível extra, um catalizador para o nosso fogo interior e que seja a fonte inesgotável de vida: O Espírito Santo!

Todos nós desejamos que a nossa vida seja o melhor possível, justa e serena, uma vida que não seja ameaçada pela morte, mas que possa amadurecer e crescer até à sua plenitude. No fundo somos viajantes que durante a travessia destes desertos da vida, temos sede, não de uma água qualquer mas de uma água que nos sacie verdadeiramente. E Jesus doa-nos esta água viva: o Espírito Santo, que procede do Pai e que Jesus derrama nos nossos corações.

«Vim para que tenhais vida e vida em abundância», diz-nos Jesus (Jo 10, 10).

Esta foi a promessa de Jesus feita à Samaritana que dará a «água viva», em abundância e para sempre, a todos aqueles que o reconhecerem como o Filho enviado pelo Pai para nos salvar (cf. Jo 4, 5-26). Jesus veio para nos dar esta «água viva» que é o Espírito Santo, para que a nossa vida seja guiada, animada e alimentada por Deus. Reconhecermo-nos como cristãos seria pensar e agir em conformidade com Deus e claro, segundo o Espírito Santo.

E nós, pensamos segundo Deus? Agimos em conformidade com Deus? Ou deixamo-nos guiar por muitas outras coisas que não são propriamente Deus?

É do conhecimento de todos nós que a água sacia, purifica e é abosolutamente essencial para a vida pois sem ela morreriamos rapidamente. A «água viva», o Espírito Santo, o Dom do Ressuscitado que passa a habitar em nós, purifica-nos, ilumina-nos, renova-nos e transforma-nos porque nos torna partícipes da própria vida de Deus que é Amor. Paulo afirma que a vida do cristão é animada pelo Espírito e pelos seus frutos, que são «caridade, alegria, paz, paciência, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, temperança» (Gl 5, 22-23).

E qual é o dom precioso que o Espírito Santo derrama nos nossos corações? A própria vida de Deus, a vida de filhos verdadeiros, uma relação de intimidade, liberdade e confiança no amor e na misericórdia de Deus, que tem como efeito uma nova forma de os outros, os próximos e os últimos, serem respeitados e amados. O Espírito Santo ensina-nos a ver com os olhos de Cristo, a viver e a compreender a vida como Ele o fez e exultar como Paulo: já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim (Gal 2, 20)

Esta é a razão pela qual a água viva que é o Espírito Santo, sacia a sede que invade a nossa vida, porque nos diz que somos amados por Deus como filhos, que podemos amar Deus como seus filhos e que podemos viver como filhos de Deus, ou seja, como o próprio Jesus.

A fonte já sabemos onde está, agora só nos falta beber...

Copi

terça-feira, 16 de janeiro de 2024

Conheces a tua raiz?


Debaixo do mar imenso de tudo o que somos mora a nossa raiz. Ali. Pequenina e enterrada num canto sem nome. Dentro do coração. Ou da alma. Ou do sangue que nos corre por dentro sem disso tomarmos consciência.

Somos mais do que aquilo que julgamos. Somos de uma profundidade quase assustadora. Mas reveladora. Esse “mais” é o nosso centro. A nossa vida crua. Nua de expectativas, de máscaras, de cuidados, de sorrisos mais ou menos falsos. A nossa vida não é nada do que mostramos. Pelo contrário: é exatamente aquilo que dorme nas camadas inferiores do que está à vista.

Estamos profundamente desconectados da nossa raiz. Das nossas emoções. De todas as pessoas que nos deram a vida e nos permitiram ter chegado onde agora estamos. Não falamos só dos nossos pais. Mas também dos nossos avós. Dos nossos bisavós. Dos que vieram antes deles. Dos que dormem agora na ponta de alguma estrela ou no resquício de alguma galáxia. Somos tudo isso. Somos o que viveram, o que sonharam. O que perderam. O que imaginaram. Os lutos que viveram. As dores que engoliram. O sofrimento que viveram ou que causaram. A alegria do que conquistaram. A vida que se cumpriu. Somos tudo isso. Somos todos estes. E vivemos como se tivéssemos caído aqui numa rajada de sorte ou de despropósito.

Julgo que a maior fonte de não realização de todos nós é este ignorar do mundo dos nossos que nos antecedeu. Precisamos de tornar o coração um aspersor de compaixão e de bondade e de o derramar sobre estas histórias que nunca ninguém nos contou.

Não estamos cá sozinhos. E estamos sempre a ser preparados para algo maior do que nós ou, quando muito, para algo digno do nosso tamanho. Assim tivéssemos capacidade para o reconhecer.

Neste novo ano em que queremos estrear coisas novas; em que queremos fazer a vida rimar com folhas em branco; em que teimamos em inaugurar uma vida diferente da antiga… que tenhamos também a coragem de olhar para trás. De ver quem veio para nos dar o que hoje temos. Ou para nos ajudar a construí-lo.

A nossa raiz não somos só nós. São todos aqueles rostos iluminados que fazem sombra atrás de nós. E que bom é saber que nunca estaremos sozinhos.

Marta Arrais

segunda-feira, 15 de janeiro de 2024

Um céu estrelado



Há em cada um de nós a vontade de olhar o céu e ver as estrelas.


Quantas vezes já permanecemos a desfrutar e olhar para elas?
Cada vez mais se vive na superficialidade do dia a dia, sem tempo de mergulhar no essência da vida.
Quantas vezes permanecemos mais tempo presos ao virtual do ecrã, dos pensamentos, das emoções, das "circunstâncias" da vida e nos distanciamos do que verdadeiramente alimenta quem somos, do que verdadeiramente engrandece e acrescenta o nosso ser?
O que é para mim, pode não ser para o outro, é certo...
Mas quantas vezes nos permitimos ao silêncio? Escutar o tanto que existe dentro de nós, que é real e concreto e onde, certamente, cada um encontra o que precisa.
Esse é o nosso maior tesouro, esse é o nosso maior dom.
Escutar-nos é um lugar maior, é sagrado, é dar a oportunidade de nos religarmos ao Pai.

Que a cada dia possas encontrar um céu estrelado e aí permanecer com amor e fé. E, mesmo que esse céu seja visto do deserto, acredita sempre, com confiança total e plena, na aprendizagem que traz seguir as estrelas.


Carla Correia


domingo, 14 de janeiro de 2024

O Chamamento

 




A liturgia do 2.º Domingo do Tempo Comum convida-nos a descobrir que Deus conta connosco para concretizar, no mundo e na história, o seu projeto; e propõe-nos acolher, com disponibilidade e generosidade, os desafios de Deus.

A primeira leitura traz-nos a história do chamamento do profeta Samuel. Diz-nos que o chamamento é sempre uma iniciativa de Deus: é Ele que vem ao encontro do homem, chama-o pelo nome, desafia-o a ser sinal e testemunho do projeto de Deus no mundo. A resposta do jovem Samuel pode constituir a paradigma da nossa resposta ao Deus que chama. epois de identificar essa “voz” misteriosa que se lhe dirigia, Samuel respondeu: “fala, Senhor; o teu servo escuta”. É a expressão de uma total disponibilidade, abertura e entrega face aos desafios e aos apelos de Deus. É evidente que, na figura de Samuel, o catequista bíblico propõe a atitude paradigmática que devem assumir todos aqueles a quem Deus chama. Como é que me situo face aos apelos e aos desafios de Deus? Com uma obstinada recusa, com um “sim” reticente, ou com total disponibilidade e entrega?

O Evangelho descreve o encontro de Jesus com os seus primeiros discípulos e esboça o caminho que o discípulo deve percorrer depois desse primeiro encontro: deve ir atrás de Jesus, estabelecer contato com Ele, perceber que Ele é fonte de Vida verdadeira, aceitar viver em comunhão com Ele, tornar-se testemunha dele junto dos outros irmãos. Começamos há poucos dias um novo ano. Que programa temos para o caminho? O autor do Quarto Evangelho tem uma proposta irrecusável a fazer-nos para este ano… Convida-nos a redescobrir Jesus que passa, a ir atrás dele, a entrar na casa dele, a partilhar a sua vida e o seu projeto, a interiorizar as suas atitudes fundamentais… Se aceitarmos, espera-nos uma aventura inolvidável, uma experiência profundamente libertadora, um percurso que nos conduzirá a uma Vida de plena realização. Aceitamos o convite?

Na segunda leitura, Paulo convida os cristãos de Corinto a viverem de forma coerente com o chamamento que Deus lhes fez. No crente que vive em comunhão com Cristo e que é Templo do Espírito deve manifestar-se sempre a vida nova de Deus. Todos os baptizados são chamados a dar testemunho do Homem Novo, do Homem que vive de Jesus e que caminha com Jesus. Pelo Batismo, o cristão torna-se membro de Cristo e forma com ele um único corpo. A partir desse momento, os pensamentos, as palavras, as atitudes do cristão devem ser os de Cristo e devem testemunhar, diante do mundo, o próprio Cristo. No “corpo” do cristão manifesta-se, portanto, a realidade do “corpo” de Cristo. Somos todos chamados a integrar o “corpo” de Cristo. No dia do nosso Batismo respondemos positivamente ao convite que, nesse sentido, nos foi feito; e depois, ao longo do caminho, reiterámos vezes sem conta esse compromisso… Vivemos conscientes disso? Essa opção fundamental é uma realidade que temos sempre presente em todos os passos do nosso percurso de vida? Qual é o verdadeiro “culto” que Deus pede? Como é que traduzimos, em gestos concretos, a nossa adesão a Deus? Paulo sugere que o verdadeiro culto, o culto que Deus espera, é uma vida coerente com os compromissos que assumimos com Ele, traduzida em gestos concretos de amor, de entrega, de doação, de respeito pelo outro e pela sua dignidade.


https://www.dehonianos.org/

sábado, 13 de janeiro de 2024

Bem-Aventurados os Idosos

 


«Bem-aventurados os que me olham com simpatia.

Bem-aventurados os que usam de compreensão para o meu lento caminhar.

Bem-aventurados os que falam em voz alta para superar a minha surdez.

Bem-aventurados os que apertam com ternura as minhas mãos trémulas.

Bem-aventurados os que se interessam pela minha longínqua juventude.

Bem-aventurados os que não se cansam de ouvir as minhas histórias tantas vezes repetidas.

Bem-aventurados os que compreendem a minha necessidade de carinho.

Bem-aventurados os que me dedicam parte do seu tempo.

Bem-aventurados os que se lembram da minha solidão.

Bem-aventurados os que me acompanham no meu sofrimento.

Bem-aventurados os que alegram os últimos dias da minha vida.

Bem-aventurados os que me acompanharem no momento da morte.

Quando entrar na minha Vida sem fim, recordar-me-ei sempre deles!»

                                                                            As Bem-Aventuranças do Idoso




No exercício da profissão gosto de privilegiar, estimular e desenvolver as relações intergeracionais. Ou seja, que os meus alunos se relacionem com os adultos e com os idosos, além de, sempre que possível, desenvolver atividades com outras crianças diferentes. Acabamos o primeiro período com um Concerto de Natal e iniciamos o segundo com O Cantar os Reis. Visitamos dois Centros de Dia e um Lar.

Que experiências tão enriquecedoras!

É preocupante a solidão em que muitos idosos se encontram. Não são todos, nem pretendo generalizar porque muitos idosos são cuidados por familiares ou acolhidos em estruturas dignas que os cuidam com atenção e preocupação.

Infelizmente, porém, a situação de haver cada vez mais idosos na nossa sociedade, onde a taxa de natalidade está no nível mais baixo de todos os tempos, representa um grande desafio.

Os jovens casais, muitas vezes apenas com um filho e com problemas de trabalho, não conseguem assumir a assistência aos pais idosos e delegam-no a cuidadores ou lares. Por esta razão, muitas vezes, os idosos já não são vistos como uma dádiva, mas como um fardo, especialmente quando já não são autossuficientes e necessitam de assistência.

Além disso, hoje mais do que nunca, há o mito muito forte do ser jovem eternamente e ninguém quer envelhecer. É cada vez mais difícil defender ou acreditar que o idoso tem valor por si mesmo e não pelo que produz.

É esta cultura da produtividade e do desperdício, cada vez mais difusa e agreste, que contribui para a marginalização de quem não produz, ou não cumpre os critérios de eficiência, competitividade... Diz-nos o Papa Francisco que “A velhice, impõe ritmos mais lentos, que não são tempos de inércia, mas espaços de sentido da vida desconhecidos pela obsessão da velocidade e da produtividade”.

Mas como falar de paciência? Como explicar a fragilidade? Como aceitar os limites? Como viver a resiliência? Não são os nossos idosos os maiores mestres em sabedoria que é fruto de uma experiência de vida que passou pelo sofrimento como uma prova de obstáculos? Quanta aprendizagem surge da escuta da vida de pais idosos que, apesar das suas limitações, conseguiram construir uma casa e uma família!...

A sociedade não deve apenas ajudar as pessoas a envelhecer bem, mas também fazer deste tempo uma oportunidade para crescer nas relações, no cuidado e na solidariedade.

Temos, devemos olhar para a terceira idade com outros olhos! Se queremos uma sociedade melhor, que respeite todos, todos, todos, cada um de nós, no seu quotidiano deve fazer o que está ao seu alcance!

É necessária uma nova cultura política sobre a velhice, um salto moral. A velhice pode representar uma reserva de memória histórica e de vida espiritual, mas não só. Ela é oxigénio, pois pode ser pulmão que nos alerta para um futuro que deve ser trabalhado no presente.


Paulo Victória

sexta-feira, 12 de janeiro de 2024

A PRÁTICA MAIS PRÁTICA É UMA BOA TEORIA



Sempre que ouvi esta frase em título, a ouvi atribuída a D. António Ferreira Gomes, Bispo do Porto, que, antes, também fora Bispo de Portalegre-Castelo Branco.
Presumo, porém, que, com esporas de roseta giratória no estribo, já Eva a tivesse martelado, vezes sem conta, na bigorna dos ouvidos de Adão, sobretudo quando este se esquecia de separar o lixo, de fechar as torneiras da cozinha ou de apagar a televisão, chateado por ver a lástima de jogo do seu clube de eleição, ainda por cima ajudado pela arbitragem. Não atesto nem consigo provar, é verdade, mas também não contesto nem protesto. Pode acontecer que os dedicados estudiosos de pergaminhos e papéis amarelecidos por essas bibliotecas adentro, por quem, aliás, nutro elevado apreço e respeito até por eu não ter unhas para tocar viola, pode acontecer que eles descubram a paternidade da frase, e, ao encontrá-la, gritem entusiasmados: ‘Eureka! E corram céleres a narrar a descoberta, tal como fez Arquimedes quando, ao tomar banho, descobriu um argumento capaz de dissipar as suspeitas do rei de Siracusa, e não só. Este pensava que o artesão contratado para lhe fazer uma coroa - uma coroa à altura da sua vaidade e cabeça -, pensava que o artesão lhe tinha surripiado parte do ouro que lhe tinha dado para isso. Arquimedes, a partir da teoria arrancada à sua banheira, mergulhou a referida coroa num balde de água, provando assim ao rei que o artesão era mesmo sério..., talvez mais do que ele...! Nascida da realidade e da experiência, a teoria levou Arquimedes à boa prática... E, acreditem, não estou a mangar, nem encharcado em alvarinho. Sentado na sua cadeira e olhando o movimento dos lábios de Ana, Heli, sem ao menos se entreter a fazer o sudoku, é que pensou, injustamente, que Ana estava bêbada, quando ela, amargurada e lacrimosa, sabendo bem onde lhe apertava o sapato, confiante e sinceramente bichanava os seus sentimentos e propósitos ao Senhor (cf. 1Sam 1, 9-20).
Mesmo na oração, uma boa teoria, entendida, assumida e vivida, ajuda à sua prática, dando frutos, como aconteceu com Ana. Se assim não for, não quer dizer que aconteça, pois os simples e humildes têm uma sabedoria de Deus que são lições de vida para todos, mas pode acontecer que, noutros, a oração degenere em pieguice, em sentimentalismo estéril, em tentativa de negócio com Deus, em busca de méritos e de direitos diante d’Ele e dos outros. O que seria de nós se Deus não se risse com tudo isso e não fosse indulgente e rico em misericórdia!...
Noutras situações da vida, sem teoria, sem formação, a prática pode ser uma aventura a fazer marrar com a cabeça na parede. É certo que uns têm mais facilidade em aprender conteúdos, em produzir mais conhecimento, em partilhar e fazer cultura, mas têm mais dificuldade na sua aplicação. Com outros passa-se o contrário, cada um é como é e como se consegue construir. A prática mais prática, porém, é, de facto, uma boa teoria, coisa que nos obriga a uma constante atualização e aprofundamento, quer da teoria quer da prática. Valorizar a prática e desvalorizar a teoria pode ter penas curtas, pode conduzir à frustração. Ceder à tentação de assumir que, na prática, a teoria é outra, também é esquisito, não estará muito certo. A teoria sem a prática também pode vir a degenerar em snobismo, em intelectualismo sem sabedoria, em teorias desencarnados, em gente teórica, em ditadores que pensam e agem como se a ideia fosse superior à realidade. Ou teoria ou prática será, igualmente, mau princípio, pois, teoria e prática são complementares. As duas devem olhar-se olhos nos olhos, em diálogo permanente, como ensinam e fazem os bons mestres. A teoria desafia a prática, a prática estimula a teoria. É desta combinação equilibrada que se produzem bons frutos. Só ensina bem a teoria quem experimentou a sua prática, assim como, quem não conhece a teoria, mesmo que tenha uma panóplia de técnicas sofisticadas e habilidade sem fim, dificilmente ensinará bem o que se deve saber fazer. Até pode acontecer que, com pena de a não conhecer, assuma uma atitude igual à da raposa em relação às uvas: estão verdes! a teoria não me interessa!
Na pastoral, a prática mais prática também é uma boa teoria. Sem formação, a pastoral poderá ser qualquer coisa menos isso. E essa formação é humana, intelectual e espiritual, com tudo aquilo que cada dimensão dessas implica. É mais do que saber e saber fazer, é vida e paixão que convencem e geram empatia e proveito nos destinatários, ao ponto de os envolver com alegria e os tornar protagonistas da evangelização, por amor aos outros, em fidelidade a Cristo. Quando, ao longo dos tempos, se esquece, deturpa ou se adapta e deixa de viver o Evangelho, agindo, na prática, como dá na real gana, até se invoca Deus para discriminar, racial e religiosamente, para incitar ao ódio e à violência, para invadir, destruir, matar e fazer guerras, desprezando os outros. Jesus foi claro quando lhe perguntaram qual era o maior mandamento da Lei: “Amarás ao Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todo o teu entendimento. Este é o maior e o primeiro mandamento. O segundo é igual a este: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo” (Mt 22, 34-40). A palavra de Jesus foi sempre a mesma, amar a Deus e ao próximo como Ele nos amou. Ele não fez aceção de pessoas. A sua palavra foi e é para todos. Ir até aos confins do mundo para anunciar a Boa Nova foi o mandato que Ele deixou à sua Igreja. A Igreja está, vai e acolhe a todos e a todos anuncia o amor de Jesus por cada um, dizendo-lhes também que amor com amor se paga, o que implica fazer caminhada em direção a Ele, com Ele e a sua Igreja, pois nem tudo é igual a tudo. Todos, todos, todos não é igual a tudo, tudo, tudo, como é evidente, foi por isso que o Filho de Deus encarnou e se entregou por nós.

D. Antonino Dias - Bispo Diocesano
Portalegre-Castelo Branco, 11-01-2024.

Desce de ti abaixo!



Ao admirar o mar ou o céu podemos espantar-nos com a imensidão que representam, mas também é possível que a contemplação desses quase infinitos faça nascer em nós a verdade a respeito da nossa pequenez.

Somos ínfimos quando comparados com o mundo onde vivemos e o universo que nos envolve. No entanto, a liberdade permite-nos ser muito mais do que aquilo que se vê, desde que nunca nos esqueçamos de que não há virtude alguma que não parta da constatação de que, na verdade, nenhum de nós é extraordinário à partida.

Não somos importantes, mas podemos sê-lo.

Devemos ter consciência da nossa quase insignificância, mesmo quando tudo nos corre mal. É mais fácil quando estamos bem, mas dói fundo quando, depois de cairmos, temos de aceitar que as quedas são parte do caminho e não uma injustiça de que somos vítimas.

A verdade é que o caminho de cada um de nós é duro, por vezes mais duro do que aquilo que gostaríamos de ter de suportar.

Lá no alto do orgulho, da vaidade e de tantas outras ilusões, estamos sempre inquietos e em desequilíbrio. Descer ao chão firme da verdade é dar paz a nós mesmos. Não te enganes. Não gostes mais de ti do que aquilo que fizeste por merecer.

És uma pessoa imperfeita a caminho da perfeição. Se tiveres isto sempre presente, não haverá elogio ou censura que te afetem, porque tu sabes quem és.

Quando desces de ti abaixo, colocas os pés num chão que é comum a muitos, enquanto te obrigas a pensar que não és quem queres ser, mas sim quem consegues, através das obras que concretizas a partir dos sonhos que decidiste sonhar e seguir.

Aceita a tua fragilidade sem rodeios. Aceita-te, até para que, com isso, ensines aos outros quem és… a fim de tornares o teu coração digno de amar e ser amado.


José Luís Nunes Martins

quinta-feira, 11 de janeiro de 2024

Fazer alguma coisa pela primeira vez


Numa vida tão rotineira como a nossa, acho que deveremos fazer um esforço para fazermos coisas “pela primeira vez”. Não sou contra as rotinas, acho até que nos faz bem, pois dá-nos estabilidade e segurança que nos permite reduzir níveis de ansiedade mas, por vezes creio que faz falta arriscar e fazer coisas pela primeira vez. Eu sei que temos medo de falhar, outras vezes até fazemos coisas diferentes e nem temos a perceção dessa novidade. Temos de tentar olhar para as coisas, rotinas e tarefas com um sentido crítico.

E se fizesse assim?

E se em vez de ir por aqui, for por ali?

Temos de experimentar novas perspetivas, sabendo que se até nem gostarmos, não há-de vir nenhum mal ao mundo, apenas abrimos horizontes e aguçamos a criatividade. Se no teu aniversário decidires fazer uma viagem, em vez da tradicional festa que tanto te cansa, deves faze-lo pois são oportunidades que se abrem. O pior que pode acontecer é não gostares e para o ano voltares à tradicional celebração mas com uma grande história para contar.

Ora, se eu hoje me puser a pé às 6 da manhã para fazer algo diferente, como por exemplo uma caminhada, ou um pequeno-almoço mais completo, não estarei já a contribuir para tornar o meu dia uma novidade? O pior que pode acontecer é ficares com sono, ou quiçá, com uma energia interminável.

E tu amiga, hoje já fizeste alguma coisa pela primeira vez?



Raquel Rodrigues

quarta-feira, 10 de janeiro de 2024

Imersos na Vida de Deus?


«A fé não é, antes de mais, uma questão de escolher aquilo em que que se há de acreditar, como se alguém fosse um consumidor num supermercado espiritual, enchendo o carro de artigos religiosos para satisfazer as suas necessidades e preferências pessoais. A fé é a nossa resposta à espantosa descoberta de que fomos escolhidos. Paulo não pesou os argumentos prós e contra do Cristianismo e, em seguida, tomou uma opção amadurecida a favor de Jesus. Deus irrompeu brutalmente na sua vida e atirou-o ao chão.»

Timothy Radcliffe, Imersos na Vida de Deus – Viver o Batismo e a Confirmação



Ultimamente tenho refletido sobre a forma como cada eu e cada um de nós vive a sua fé cristã. Gosto de analisar a forma como falamos sobre a nossa relação com Deus, a forma como entramos na Igreja e realizamos as nossas orações, a forma como falamos dos autores que nos ajudam no discernimento espiritual e, claro, a forma como retratamos a importância e o significado que Deus teve e tem nas nossas vidas.

E, antes de partilhar convosco a minha reflexão, gostava de esclarecer (e realçar) que aquilo que pretendo trazer nesta crónica não é um exercício de julgamento através daquilo que poderá ser, na minha ótica, as boas ou as más práticas da fé, mas sim um convite à reflexão e, acima de tudo, uma oportunidade de conseguir identificar a beleza de se viver em Igreja: a constatação da riqueza de se viver a fé de formas tão diversas!

Este excerto de Timothy Radcliffe veio aprofundar e dirigir o meu olhar para a minha reflexão. Vejo, tantas e tantas vezes, pessoas com imensa fé que dominam, como ninguém, os conhecimentos da Doutrina e da Palavra, mas que parecem desligados de Deus e do sofrimento humano. Como podemos estar imersos na Vida de Deus se as relações se baseiam num automatismo previsível? Como podemos estar imersos na Vida de Deus se a nossa fé apenas nos permite analisar a nossa vida e a dos outros de forma monocromática?

Vejo, tantas e tantas vezes, pessoas com imensa fé que dominam, como ninguém, os rituais e a liturgia, mas que parecem distantes e frios na relação com Deus e com as pessoas. Como podemos estar imersos na Vida de Deus se a nossa fé se alimenta apenas de rotinas programadas? Como podemos estar imersos na Vida de Deus se a nossa fé não percorre a verdadeira humanidade? Como podemos estar imersos na Vida de Deus se a nossa fé se baseia no cumprimento inflexível das normas?

Acredito, mais do que nunca, que precisamos de deixar que Deus nos irrompa e nos atire para o chão. Sim, precisamos que nos atire para o chão para abandonarmos todas as nossas certezas. Sim, precisamos que nos atire para o chão para encontrarmos as raízes da relação que se constrói com proximidade e intimidade. Sim, precisamos que nos atire para o chão para nos desarmarmos dos nossos julgamentos e preconceitos.

Talvez tenha chegado o tempo em que a fé seja para os que “adoram em espírito e verdade” e não os que andam à procura de encher “o carro de artigos religiosos para satisfazer as suas necessidades e preferências pessoais”.

Hoje, antes de te afirmares como pessoa de fé, questiona-te: o que preciso que Deus atire para o chão para que Ele irrompa brutalmente na minha vida? Vivo imerso na Vida de Deus ou ando à tona?


Emanuel António Dias

terça-feira, 9 de janeiro de 2024

Catequeses: «Os vícios e as virtudes». 2. O combate espiritual


Ciclo de catequeses. Os vícios e as virtudes. 2. O combate espiritual



Prezados irmãos e irmãs, bom dia!

Na semana passada introduzimo-nos no tema dos vícios e das virtudes. Ele recorda a luta espiritual do cristão. Com efeito, a vida espiritual do cristão não é pacífica, linear, sem desafios; pelo contrário, a vida cristã exige um combate constante: o combate cristão para conservar a fé, para enriquecer os dons da fé em nós. Não é por acaso que a primeira unção que cada cristão recebe no sacramento do Batismo - a unção catecumenal - é sem perfume algum e anuncia simbolicamente que a vida é uma luta. Sim, na antiguidade os lutadores eram completamente ungidos antes da competição, quer para tonificar os músculos, quer para tornar o corpo esquivo às garras do adversário. A unção dos catecúmenos torna imediatamente claro que ao cristão não é poupada a luta, que o cristão deve lutar: também a sua existência, como a de todos, deverá descer à arena, pois a vida é uma sucessão de provações e tentações.



Uma célebre frase atribuída a Abade António, o primeiro grande padre do monaquismo, reza assim: “Tira as tentações e ninguém se salvará”. Os santos não são homens aos quais foi poupada a tentação, mas pessoas bem conscientes de que as seduções do mal aparecem repetidamente na vida, para ser desmascaradas e rejeitadas. Todos nós experimentamos isto, todos nós: ter um mau pensamento, o desejo de fazer isto ou de falar mal do outro... Todos, todos nós somos tentados, e devemos lutar para não cair nessas tentações. Se algum de vós não tem tentações, que o diga, pois isto seria algo extraordinário! Todos nós temos tentações, e todos devemos aprender a comportar-nos em tais situações.

Há muitas pessoas que são egocêntricas, que pensam que estão “bem” – “Não, eu sou bom, sou boa, não tenho estes problemas”. Mas nenhum de nós está bem; se alguém se sente bem, sonha; cada um de nós tem muitas coisas a corrigir, e também devemos estar vigilantes. E às vezes acontece que vamos ao Sacramento da Reconciliação e dizemos, com sinceridade: “Padre, não me lembro, não sei se cometi pecados...”. Mas isto é falta de conhecimento do que acontece no coração. Somos pecadores, todos nós! E um pequeno exame de consciência, um pequeno olhar interior far-nos-á bem. Caso contrário, correremos o risco de viver nas trevas, porque nos habituamos às trevas e já não conseguimos distinguir o bem do mal. Isaac de Nínive dizia que, na Igreja, quem conhece os seus pecados e chora por eles é maior do que aquele que ressuscita um morto. Todos nós devemos pedir a Deus a graça de nos reconhecermos pobres pecadores, necessitados de conversão, guardando no coração a confiança de que nenhum pecado é demasiado grande para a misericórdia infinita de Deus Pai. Esta é a lição inaugural que Jesus nos dá!

Vemo-lo logo nas primeiras páginas dos Evangelhos, em primeiro lugar quando nos falam do batismo do Messias nas águas do rio Jordão. O episódio tem em si algo de desconcertante: por que se submete Jesus a este rito de purificação? Ele é Deus, é perfeito! De que pecado se deve arrepender Jesus? De nenhum! Até o Batista fica escandalizado, a ponto de o texto dizer: João queria impedi-lo, dizendo: «Eu é que tenho necessidade de ser batizado por ti. E tu vens a mim?». Mas Jesus é um Messias muito diferente do que João o tinha apresentado e do modo como as pessoas o imaginavam: não encarna o Deus irado, não convoca para o julgamento mas, pelo contrário, põe-se na fila com os pecadores. Como? Sim, Jesus caminha connosco, com todos nós, pecadores. Não é um pecador, mas está entre nós. E isto é bom! “Padre, cometi tantos pecados!” – “Mas Jesus está contigo: fala deles, Ele ajuda-te a abandoná-los”. Jesus nunca nos deixa sozinhos, nunca! Pensai bem nisto. “Oh, Padre, cometi coisas graves!” – “Mas Jesus compreende-te e acompanha-te: entende o teu pecado e perdoa-o”. Nunca esqueçamos isto! Nos piores momentos, nos momentos em que escorregamos nos pecados, Jesus está ao nosso lado para nos ajudar a levantar. Isto dá-nos consolação. Não podemos perder esta certeza: Jesus está ao nosso lado para nos ajudar, para nos proteger, até para nos levantar depois do pecado. “Mas Padre, é verdade que Jesus perdoa tudo?” – “Tudo. Ele veio para perdoar, para salvar. Mas Jesus quer o teu coração aberto”. Nunca se esquece de perdoar: somos nós, muitas vezes, que perdemos a capacidade de pedir perdão. Recuperemos a capacidade de pedir perdão. Cada um de nós tem muitas coisas das quais pedir perdão: cada um de nós pense nisso dentro de si, e hoje fale com Jesus sobre isto. Fale com Jesus sobre isto: “Senhor, não sei se é verdade ou não, mas tenho a certeza de que Tu não te afastas de mim. Tenho a certeza de que me perdoas. Senhor, sou pecador, pecadora, mas por favor não te afastes”. Esta seria uma bonita oração a Jesus hoje: “Senhor, não te afastes de mim”.

E logo após o episódio do batismo, os Evangelhos narram que Jesus se retira para o deserto, onde é tentado por Satanás. Também aqui se põe a questão: por que o Filho de Deus deve conhecer a tentação? Também neste caso, Jesus se mostra solidário com a nossa frágil natureza humana e torna-se o nosso grande exemplum: as tentações que atravessa e vence no meio das pedras áridas do deserto são a primeira instrução que dá à nossa vida de discípulos. Ele experimentou o que também nós devemos sempre preparar-nos para enfrentar: a vida é feita de desafios, provações, encruzilhadas, visões opostas, seduções ocultas, vozes contraditórias. Algumas vozes são até persuasivas, a ponto que Satanás tenta Jesus recorrendo às palavras da Escritura. Devemos preservar a lucidez interior para escolher o caminho que nos conduz verdadeiramente à felicidade e depois esforçar-nos para não parar ao longo do caminho.

Lembremo-nos de que estamos sempre divididos entre extremos opostos: a soberba desafia a humildade; o ódio opõe-se à caridade; a tristeza impede a verdadeira alegria do Espírito; o empedernimento do coração rejeita a misericórdia. Os cristãos caminham constantemente sobre estes cumes. Por isso é importante refletir sobre os vícios e as virtudes: ajuda-nos a superar a cultura niilista em que os contornos entre o bem e o mal permanecem matizados e, ao mesmo tempo, recorda-nos que o ser humano, ao contrário de qualquer outra criatura, pode sempre transcender-se a si mesmo, abrindo-se a Deus e caminhando rumo à santidade.

Portanto, o combate espiritual leva-nos a olhar mais de perto os vícios que nos agrilhoam e a caminhar, com a graça de Deus, para as virtudes que podem florescer em nós, trazendo a primavera do Espírito à nossa vida.

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segunda-feira, 8 de janeiro de 2024

A novidade não é o calendário. És tu!



É fácil colocar a responsabilidade do sucesso de um novo ano numa folha de calendário. Já quase não usamos calendários em papel, mas é essa a sensação que nos fica: uma passagem breve, rápida. E, de súbito, uma imposição: é suposto mudar. Avançar. Apressar os passos para uma coisa melhor, para uma versão mais bonita nossa. É como se houvesse a obrigação de fazer tudo o que ainda não tínhamos feito até então.

Essa pressão aperta-nos por dentro e deixa-nos com a sensação de estarmos encurralados. De ter de fazer mais do que aquilo que somos capazes. É por isso que é importante perceber que não há nenhuma novidade na passagem de ano. Há uma esperança que se veste para nos visitar, mas não é uma esperança exclusiva desse momento. Somos nós que, de repente, estamos disponíveis para cruzar olhares com ela. A única novidade no Ano Novo somos nós. Somos nós que estamos diferentes do ano passado por tudo o que vivemos até aqui. Pela volta ao sol que nos trouxe lições, bênçãos, dores, esperanças, tristezas e caminhos novos. Somos nós que temos nas mãos a possibilidade de fazer tudo o que quisermos, não é a mudança de ano ou do relógio.

Se conseguirmos dedicar algum tempo a olhar para nós, a contemplar o caminho já percorrido e a perceber a possibilidade de novas direções já é ação suficiente. E, mais ainda, se pudermos simplesmente parar e perceber que também é possível ficar no mesmo sítio até estar pronto para avançar, isso também será igualmente válido.

Que o novo ano seja leve.

Que traga a paz que precisamos e que se faça semente a partir de nós.

Que o caminho seja percorrido com amor, quando nos faltar a compreensão.

Que as ideias e os sonhos rimem sempre com as nossas raízes e não nasçam de superficialidades ou vazios.

Que tudo nos aproxime da nossa melhor versão, ainda que esse processo traga sofrimento.

Que a vida dos nossos continue junto da nossa por muito tempo e que aprendamos a cuidar bem deles. E do que trazemos no coração.

E que a alma se acende sempre na direção do caminho que nos fizer mais felizes.


Marta Arrais, Ano novo

domingo, 7 de janeiro de 2024

Anúncio solene da Páscoa e das festas móveis 2024



Irmãos caríssimos,
a glória do Senhor manifestou-se
e manifestar-se-á sempre no meio de nós,
até à sua vinda no fim dos tempos.

Nos ritmos e nas vicissitudes do tempo
recordamos e vivemos os mistérios da salvação.
O centro de todo o ano litúrgico,
é o Tríduo do Senhor crucificado, sepultado e ressuscitado,
que culminará no Domingo da Páscoa, este ano a 31 de março.

Em cada domingo, Páscoa semanal,
a santa Igreja torna presente este grande acontecimento,
no qual Jesus Cristo venceu o pecado e a morte.
Da Páscoa derivam todos os dias santos:
as Cinzas, início da Quaresma, a 14 de fevereiro a Ascensão do Senhor, a 12 de maio;
o Pentecostes, a 19 de maio;
o primeiro Domingo do Advento, a 01 de dezembro.

Também nas festas da Santa Mãe de Deus,
dos Apóstolos, dos Santos
e na Comemoração dos Fiéis Defuntos,
a Igreja peregrina sobre a terra
proclama a Páscoa do Senhor.

A Cristo, que era, que é e que há de vir,
Senhor do tempo e da história,
louvor e glória pelos séculos dos séculos.



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