segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

«Que as armas se calem», pede Francisco, recordando guerra na Ucrânia e noutras partes do mundo

Papa renova convite a fazer de 2 de março um dia de oração e jejum pela paz

Foto: Vatican Media



Cidade do Vaticano, 27 fev 2022 (Ecclesia) – O Papa condenou hoje no Vaticano a guerra na Ucrânia e noutras partes do mundo, renovando o seu convite a fazer do dia 2 de março uma jornada de oração e jejum pela paz.

“Com o coração despedaçado pelo que acontece na Ucrânia – e não nos esqueçamos das guerras noutras partes do mundo, como o Iémen, a Síria ou a Etiópia -, repito: que as armas se calem!”, declarou, desde a janela do apartamento pontifício, após a recitação do ângelus.

Francisco disse ser urgente abrir “corredores humanitários” para as populações em fuga, sustentando que estas devem “ser acolhidas”.

“Penso nos idosos, nos que procuram refúgio, nestas horas; nas mães em fuga, com os seus filhos. São irmãos e irmãs”, realçou.

O Papa afirmou que o mundo foi “sacudidos por algo trágico, a guerra”, convidando à oração pelo fim do conflito.

“Muitas vezes rezamos para que este caminho não fosse seguido. Não deixemos de rezar, pelo contrário, supliquemos ainda mais intensamente a Deus”, acrescentou.

Francisco reforçou o pedido que deixou na última quarta-feira, para um tempo especial de intercessão pela paz, na próxima semana.


Renovo a todos o convite a fazer do dia 2 de março, Quarta-feira de Cinzas, uma jornada de oração e de jejum pela paz na Ucrânia”.

O Papa explicou que esta jornada especial quer ajudar os participantes a “estar próximo dos sofrimentos do povo ucraniano, para que todos se sintam irmãos, implorando a Deus o fim da guerra”.

“Quem faz a guerra, esquece-se da humanidade, não parte das pessoas, não olhar para a sua vida concreta, mas coloca acima de tudo interesses particulares de poder, entrega-se à lógica diabólica e perversa das armas, a mais distante da vontade de Deus”, criticou.

Francisco destacou que a “gente comum” quer a paz e, em qualquer conflito, é “a verdadeira vítima, pagando na própria pele a loucura da guerra”.

“Deus está com os operadores de paz, não com quem usa a violência. Quem ama a paz, como recita a Constituição Italiana, repudia a guerra como instrumento de ofensa à liberdade dos outros povos e como meio de resolução de controvérsias internacionais”, prosseguiu, antes de fazer um momento de silêncio.

Nas saudações finais, o Papa aludiu à presença de muitas bandeiras da Ucrânia na Praça de São Pedro.

“Glória a Jesus Cristo”, disse, em ucraniano.



A Rússia lançou na quinta-feira de madrugada uma ofensiva militar na Ucrânia, com forças terrestres e bombardeamento de alvos em várias cidades.

A invasão russa foi condenada pela maior parte da comunidade internacional.

Este sábado, o Papa conversou ao telefone com o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelenskyi, informou o porta-voz do Vaticano, Matteo Bruni.

A Embaixada da Ucrânia no Vaticano adiantou, numa nota divulgada através do Twitter, que Francisco manifestou a sua “mais profunda dor perante os trágicos eventos” que acontecem no país do leste europeu.

Na noite desta sexta-feira, o Papa telefonara ao arcebispo-mor de Kiev, D. Sviatoslav Shevchuk, líder da Igreja Greco-Católica Ucraniana, para se informar sobre a situação do país.

Horas antes, o Papa tinha visitado a Embaixada da Rússia junto da Santa Sé para manifestar a sua “preocupação” com o conflito na Ucrânia.

OC

domingo, 27 de fevereiro de 2022

A Palavra mostra o coração do homem



O tema central da liturgia deste domingo convida-nos a refletir sobre esta questão: aquilo que nos enche o coração e que nós testemunhamos é a verdade de Jesus, ou são os nossos interesses e os nossos critérios egoístas?O Evangelho dá-nos os critérios para discernir o verdadeiro do falso “mestre”: o verdadeiro “mestre” é aquele que apenas apresenta a proposta de Jesus gerando, com o seu testemunho, comunhão, união, fraternidade, amor; o falso “mestre”, ao contrário, é aquele que manifesta intolerância, hipocrisia, autoritarismo e cujo testemunho gera divisões e confusões: o seu anúncio não tem nada a ver com o de Jesus.
A história da trave e do cisco convida-nos a refletir sobre a hipocrisia... É fácil reparar nas falhas dos outros e enveredar pela crítica fácil que, tantas vezes, afeta a reputação e fere a dignidade das pessoas; é difícil utilizar os mesmos critérios de exigência quando estão em causa as nossas pequenas e grandes falhas... Somos tão exigentes connosco como somos com os outros? Temos consciência da nossa necessidade permanente de conversão e de transformação?

A primeira leitura, na mesma linha, dá um conselho muito prático, mas muito útil: não julguemos as pessoas pela primeira impressão ou por atitudes mais ou menos teatrais: deixemo-las falar, pois as palavras revelam a verdade ou a mentira que há em cada coração.
Quantas vezes temos de reformular as nossas impressões acerca de uma pessoa depois de a conhecermos bem... Não podemos, pois, deixar-nos condicionar pela primeira impressão. Um juízo apressado pode levar-nos a ser tremendamente injustos e a marginalizar pessoas muito válidas e com um grande potencial; também pode, ao contrário, levar-nos a confiar totalmente em pessoas que, investidas de cargos de responsabilidade, acabam por destruir coisas que levaram muito tempo a ser edificadas...

A segunda leitura não tem, aparentemente, muito a ver com esta temática: é a conclusão da catequese de Paulo aos coríntios sobre a ressurreição. No entanto, podemos dizer que viver e testemunhar com verdade, sinceridade e coerência a proposta de Jesus é o caminho necessário para essa vida plena que Deus nos reserva. Do nosso anúncio sincero de Jesus, nasce essa comunidade de Homens Novos que é anúncio do tempo escatológico e da vida que nos espera.
A ressurreição de Cristo garante-nos que o nosso Deus é o Senhor da vida. Assim, percorremos o nosso caminho neste mundo com total serenidade e confiança: sabemos que Deus está ao nosso lado sempre, vigiando – como uma mãe que cuida do seu bebé; e que, quando chegar a última fronteira, o nosso último fechar de olhos, a nossa saída deste mundo ou entrada no outro, também então podemos estar tranquilos, porque o nosso Deus/mãe continua vigilante. Ele é o Deus da vida, que nos garante a plenitude da vida.


https://www.dehonianos.org/


sábado, 26 de fevereiro de 2022

Ucrânia: «A paz depende de cada um de nós» – D. José Tolentino Mendonça

Cardeal português reforça apelo do Papa, que convocou jornada mundial de jejum pelo fim da guerra

 



Lisboa, 24 fev 2022 (Ecclesia) – O cardeal português D. José Tolentino Mendonça reforçou hoje o apelo do Papa à oração pela paz.

“Neste contexto dramático, em que estamos a viver, é muito importante cada um sentir que a paz depende de si, a paz depende de cada um de nós”, disse à Agência ECCLESIA o arquivista e bibliotecário da Santa Sé.

O responsável católico defende uma nova atitude, que precisa de “gestos concretos, simbólicos, existencialmente fortes”.

Francisco convidou crentes e não-crentes a fazer do próximo dia 2 de março, Quarta-feira de Cinzas no calendário católico, uma “jornada de jejum pela paz”.

“Jesus ensinou-nos que, à insensatez diabólica da violência, se responde com as armas de Deus, com a oração e o jejum”, explicou, falando na audiência pública desta quarta-feira, no Vaticano.

Foto: Lusa/EPA



O Papa encorajou de forma especial os crentes, para que, neste dia, “se dediquem intensamente à oração e ao jejum”.

“Que a Rainha da Paz preserve o mundo da loucura da guerra”, concluiu.

Para D. José Tolentino Mendonça, “é fundamental reforçar o apelo do Santo Padre em fazer da próxima quarta-feira uma ocasião de comunhão entre todos os homens”.

O responsável destaca que o jejum “é uma prática transversal a várias religiões e a várias culturas”, falando numa “espécie de distanciamento crítico”, em relação aos próprios direitos e necessidades, que promove um “esvaziamento de si para poder dar lugar aos outros, escutar a voz de Deus”.

O cardeal convida a “dar lugar à ponderação das necessidades dos irmãos”.

A Rússia invadiu a Ucrânia na madrugada desta quinta-feira, alegando a necessidade de proteger os habitantes das províncias separatistas ucranianas, que reconheceu como independentes.

ONU, NATO, Estados Unidos, Reino Unido e União Europeia, entre outros, condenaram a decisão russa.

OC



sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

QUARESMA 2022 - A HORA DA FERIDA É A HORA DA GRAÇA




Pai, nas vossas mãos entrego o Meu Espírito, é uma das mais fortes palavras de Cristo na cruz. Todos os anos nos é oferecido um tempo para que, com o coração em construção, melhor nos preparemos para a Páscoa. É a Quaresma, tempo favorável porque tem ritmo batismal. Tempo de graça porque é dom do Espírito. Tempo de purificação porque ocasião de reconstrução e fortalecimento da nossa relação com Deus, com os outros, com a vida, connosco próprios.
A Páscoa, mistério da morte e ressurreição de Cristo, não se resume ao final feliz de uma história dramática. E se é verdade que existem feridas que dão origem a vidas completamente novas, insuspeitadamente novas e não apenas cicatrizadas, então a Páscoa é a evidência subversiva da graça de Deus que se entranha na humanidade.
No meio de uma humanidade dilacerada por solidões, incompreensões, invejas, divisões e discórdias, feridas diversas, reconhecem-se os sinais da graça e da misericórdia de Deus quando a dureza do coração humano se dobra e se prepara para a reconciliação e para a alegria. Reconhecem-se os sinais da graça quando, movidos os corações por ação do Espírito Santo, os inimigos procuram entender-se, os adversários se dão as mãos, os povos se encontram na paz e na concórdia. Reconhece-se a evidência subversiva da graça quando o desejo da paz põe fim à guerra, o amor vence o ódio e a vingança dá lugar ao perdão (Cf. Oração Eucarística da Reconciliação II).
Não há Páscoa sem Cristo e não é imaginável pensar Cristo sem o mistério pascal. É a vida de Cristo agarrada à Cruz e superando-a, que é a grande escola da humanidade subvertida por uma ferida de amor. Em Cristo, a hora da ferida e a hora da graça coincidem. É a desproporção do amor paciente, bondoso e partilhado, sem arrogância e sem soberba, sem irritação e sem ressentimento ou rancor. É o amor justo que se regozija com a verdade, que tudo desculpa e tudo crê, que tudo espera e tudo suporta (cf. 1Cor 13, 4 s). A ferida não é para ficar a chorar, é para abrir o coração e reaprender a confiar. E, assim, fazem-se novas todas as coisas. A Páscoa não é apenas uma experiência fugaz, um momento. É dom de Deus. E tão forte que se acolhe como vocação; tão profundo que se erige como identidade; tão inteiro que unifica toda a vida. Páscoa é um modo de ser. O de Cristo. O dos cristãos.
A Quaresma surge precisamente porque, em Igreja e seguindo Cristo, é necessário aprender o seu modo pascal de ser e de viver. Como poderíamos saborear e viver em pleno a sua Páscoa se não nos exercitássemos no seu modo de amar e de se dar!?
Vivemos, por muitas razões e vicissitudes históricas, num mundo ferido. A Igreja, a nível local e universal, defronta-se com imensos desafios, questionamentos e fraquezas. O Sínodo é um desafio, como o são as Jornadas Mundiais da Juventude, mas a Igreja confronta-se também com a sua história e a sua credibilidade pastoral e evangélica. A pandemia feriu o tecido social e afetou pessoas e instituições. A mesma pandemia alterou o acesso aos cuidados de saúde de tantos pacientes, desvaneceu projetos económicos familiares, empobreceu agregados familiares, deixou muitos no desemprego, levou à rutura de imensas possibilidades. A insegurança e a incerteza, aliadas ao receio, alteraram os estilos de vida. As desigualdades sociais e continentais aumentaram. A dimensão relacional das nossas comunidades ressentiu-se. Os ritmos da socialização e até do luto foram alterados. Enfim, e sem ser exaustivo, o mundo, próximo e longínquo, desorganizou-se. Além da dor da ferida, pessoas e comunidades cederam à tentação da comiseração e da lamentação que fez emergir outras dores e abrir outras feridas. São feridas de todos nós.
Na Cruz de Cristo, a hora da maior dor foi também a hora do maior amor: “A minha vida sou Eu que a dou” (Jo 10, 18). O aparente abandono de Deus naquele momento revelou-se, sim, o abandono de Jesus nas mãos de Deus. Cristo faz da sua morte um ato de confiança e de abandono absolutos nas mãos de um Deus em quem se pode confiar: “Tudo vem de Ti e não oferecemos senão o que temos recebido da tua mão” (1 Cro 29,14).
É assim que a confiança se inscreve na história dos homens: “Pai, em Tuas mãos entrego o meu espírito” (Lc 23, 46). Na palavra de Cristo que Se entrega totalmente nas mãos do Pai podemos perceber o dinamismo de vida e de amor que está inscrito como confiança no mais íntimo da autêntica existência humana. É o amor mais radical porque diz que não nos bastamos a nós próprios e nos coloca em despojamento. Então, a ferida tornou-se o lugar insuspeitado da revelação de Deus e do seu amor. A ferida deu lugar à leitura retrospetiva da vida. E purificou o projeto seguinte. A ferida tornou-se a lente que permitiu ver a vida com maior verdade. A ferida revelou a sua autêntica dimensão e dispensou vaidades. A ferida, mais do que apenas uma cicatrização indolor e estética, esperou e ansiou a cura. E isso é caminho.
Caminho é também a Quaresma que, preparando a Páscoa, pode ser bem a experiência de abrirmos e expormos as nossas feridas a Deus e, assim, nos aproximarmos das feridas dos outros e do mundo. É legítimo imaginar um mundo sem feridas, mas é também uma ilusão pressupor uma vida e uma história sem feridas. Se percebermos melhor as nossas feridas estaremos mais preparados para valer aos outros nas suas. Olhando para as feridas existentes à nossa volta, a Renúncia Quaresmal deste ano voltará a ser partilhada com a Arquidiocese de Kananga, República Democrática do Congo, nos derradeiros esforços para a conclusão da construção do Centro de Acolhimento e Saúde, já conhecido da nossa Diocese.
Pela oração, pela partilha e misericórdia, pelo jejum, das nossas feridas pode brotar uma vida nova para nós e para os que vivem ao nosso lado. Todos podemos comprometer-nos mais na consecução do bem comum, na dignificação da pessoa humana. Todos podemos partilhar o que temos e o que nos falta. Todos podemos libertar-nos de dependências e de vaidades. Todos podemos superar-nos no acesso à verdade. Todos podemos empreender caminhos em conjunto, escutando-nos, falando do que nos vai na alma. Todos podemos exercitar e viver o abandono e a confiança nas mãos de Deus. A hora da ferida é a hora da graça. É a Páscoa!
D. Antonino Dias - Bispo Diocesano
Portalegre-Castelo Branco, 25-02-2022.

Portugal: Conferência Episcopal manifesta solidariedade à Ucrânia

Bispos associam-se a jornada de jejum pela paz, convocada pelo Papa para 2 de março

 

Foto: Lusa/EPA



Lisboa, 24 fev 2022 (Ecclesia) – A Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) manifestou hoje a sua solidariedade ao povo da Ucrânia, apelando à solidariedade da população e ao restabelecimento da paz na região.

“A Conferência Episcopal manifesta a sua solidariedade para com a população da Ucrânia e, em particular, para com a numerosa Comunidade Ucraniana em Portugal, desejando que este tempo de angústia, sofrimento e guerra seja rapidamente ultrapassado e se restabeleça a paz e a prática do bem para todos”, indica o comunicado ‘Pela Paz na Ucrânia’.

Os bispos católicos apelam a todos, para que “haja uma partilha efetiva para com a Igreja na Ucrânia, nomeadamente através das Cáritas e de outras instituições”.

A Cáritas Portuguesa, através do seu Fundo de Emergências Internacionais, vai comprometer-se com uma doação de 20 mil euros, diretamente para a Cáritas da Ucrânia, para contribuir que as pessoas sejam cuidadas e protegidas, informa uma nota da instituição.

A CEP associa-se ainda à jornada de jejum pela paz, convocada esta quarta-feira pelo Papa para 2 de março.

“Face à iminência da guerra na Ucrânia, o Papa Francisco apelava a que se fizessem todos os esforços para que se encontrem caminhos de paz. Convidava-nos também à oração pela paz, propondo que o dia 2 de março fosse assumido por todos como um Dia de Jejum pela Paz e, para os crentes, um dia de jejum e oração”, recordam os bispos.

“Infelizmente, a guerra teve início esta madrugada, com a invasão da Ucrânia pela Rússia”, acrescenta o comunicado.



A Conferência Episcopal Portuguesa cita ainda o apelo pela Paz das Conferências Episcopais da Europa, condenando “veementemente” a guerra na Ucrânia.

Os bispos católicos propõem que “todas as pessoas, comunidades e instituições da Igreja rezem pela paz na região, assumindo o dia 2 de março, Quarta-feira de Cinzas, como um Dia de Jejum e Oração pela Paz na Ucrânia”.

A Rússia invadiu a Ucrânia na madrugada desta quinta-feira, alegando a necessidade de proteger os habitantes das províncias separatistas ucranianas, que reconheceu como independentes.

ONU, NATO, Estados Unidos, Reino Unido e União Europeia, entre outros, condenaram a decisão russa.

Em Portugal, o presidente da República, em consonância com o Governo, condenou “veementemente a flagrante violação do Direito Internacional pela Federação Russa” e apoiou a declaração do secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, “expressando total solidariedade com o Estado e o Povo da Ucrânia”.

Já o secretário de Estado do Vaticano, cardeal Pietro Parolin, apelou ao regresso das negociações entre todas as partes.

OC

terça-feira, 22 de fevereiro de 2022

Andamos fugidos da morte




Há muito tempo que não me dirigia a um cemitério. Andava afastado deste local, no entanto, neste último fim de semana, acabei por ir visitar os meus entes queridos. É sempre um momento marcante, nostálgico e reflexivo, mas a verdade é que esta minha ida ao cemitério marcou-me por um pormenor delicioso.

Ao entrar no cemitério reparei que numa das campas estava uma avó com a sua neta. Muito pequena. A menina deveria ter os seus 5/6 anos. No entanto, a sua energia e a sua vontade de querer ajudar a avó nas tarefas da limpeza e de embelezamento da campa davam um brilho diferente àquele local.

A presença daquela criança marcou-me. Marcou-me porque me fez recordar as minhas idas ao cemitério com a minha avó e do quanto isso fez parte da minha vivência de perto com a morte. E, por outro lado, a presença daquela criança fez-me perceber o quão afastados andamos da morte. Fez-me pensar sobre a forma como a sociedade vai fugindo de algo que é tão natural e certo na nossa humanidade.

A avó desta criança se calhar não tem noção ou não se apercebe do impacto que estas idas ao cemitério da sua neta podem ter, mas a verdade é que estes momentos terão um impacto na forma como, no futuro, a sua neta lidará com as idas ao cemitério: desde o ir visitar os seus entes queridos até ao zelar pelo espaço daqueles que já partiram passando até pela forma como ela irá olhar para a morte como algo tão presente na sua e a nas nossas vidas.

É fácil falar da morte às crianças? É claro que não.

Poderão estas pequenas idas ajudar a crescer com noção da realidade da nossa finitude? Acredito que sim. Acredito que estas idas serão tempo para, na inocência de cada criança, descobrirem de forma leviana o ciclo natural da vida.

Precisamos de falar da morte. Precisamos de expressar as dores, os medos e as angústias que a morte nos causa ou nos poderá causar.

E, por último, não deixa de ser belo que a presença de uma criança, símbolo de nova vida, num cemitério possa ser sinal de Deus demonstrando que em cada fim há sempre um recomeço.

Andamos afastados da morte. Por medo. Por ceguez. Por pressas. Por vidas que nos eliminam a possibilidade de vivermos a nossa humanidade.

Por isso, hoje, antes de fugires ao pensamento sobre a tua finitude, pergunta-te: quando foi a última vez que pensaste sobre a morte? O que sentiste?



Emanuel António Dias


segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022

Os adultos que não somos



Os adultos que não somos não cresceram. Deixaram cair a aparência de crianças e de miúdos com ténis por apertar e transformaram-se em pessoas aparentemente capazes de conviver civilizadamente. Tornaram-se condutores, professores, empregados de balcão, funcionários de atendimento ao público, jornalistas, escritores, apresentadores de televisão, presidentes disto ou daquilo, diretores, advogados e tantas outras coisas que, às vezes, não cabem nas etiquetas desta ou daquela ocupação.

Os adultos que não somos tornaram-se adultos na casca do que são por fora, mas não foram capazes de se deixar evoluir internamente. Interiormente. Ali naquele lugar a que muitos chamam a alma. Obrigámo-nos a fazer o que nos disseram que seria útil, tornámo-nos arrogantes e deixámos de precisar de quem quer que fosse. Chegámos até ao degrau da vida adulta e da vida profissional, mas não somos suficientes. Não fazemos o que devíamos. Não somos o que nos prometeram que seríamos. Temos uma casa, mas, do lado de dentro, incendeiam-se ruínas. Temos um carro, mas, na essência do que somos, vamos a pé. Coxos e sem bengalas. Temos um trabalho, mas, dentro da alma que dorme debaixo da nossa pele, não fazemos a mínima ideia do que andamos a fazer.

Os adultos que não somos são os que estacionam em segunda fila e ainda ficam ofendidos se alguém ousar bater-lhes no vidro, implorando um desvio ténue do seu egoísmo triste.

São os que fazem questão de ofender, de gritar e de ferir quem ousar contrariar as suas vontades mais vincadas. São os que manipulam, agarram pelo pescoço, distorcem verdades e assustam os que não cumprem os seus desejos mais urgentes.

São os que mentem para salvar a pele. Os que pisam o sucesso dos que lhes fazem sombra. Os que dormem à sombra de um iminente fracasso alheio.

Os adultos que não somos têm ainda muito que aprender se quiserem chegar aos calcanhares de uma criança qualquer.


Marta Arrais




domingo, 20 de fevereiro de 2022

Amor sem limites

 

https://www.youtube.com/watch?v=tz60kSF56lA


A liturgia deste domingo exige-nos o amor total, o amor sem limites, mesmo para com os nossos inimigos. Convida-nos a pôr de lado a lógica da violência e a substituí-la pela lógica do amor.
A primeira leitura apresenta-nos o exemplo concreto de um homem de coração magnânimo (David) que, tendo a possibilidade de eliminar o seu inimigo, escolhe o perdão.
A lógica da violência tem feito parte da história humana. Nos últimos cem anos conhecemos duas guerras mundiais e um sem número de conflitos resultantes dessa lógica. Como resultado, foram mortos muitos milhões de seres humanos e o mundo conheceu sofrimentos inqualificáveis. Depois disso, o medo de um holocausto nuclear traz-nos em suspenso e a violência quotidiana atinge, todos os dias, um número significativo de pessoas inocentes. Onde nos leva esta lógica? Ela não provou já os seus limites? Ainda acreditamos que a violência seja o princípio de um mundo melhor?

O Evangelho reforça esta proposta. Exige dos seguidores de Jesus um coração sempre disponível para perdoar, para acolher, para dar a mão, independentemente de quem esteja do outro lado. Não se trata de amar apenas os membros do próprio grupo social, da própria raça, do próprio povo, da própria classe, partido, igreja ou clube de futebol; trata-se de um amor sem discriminações, que nos leve a ver em cada homem – mesmo no inimigo – um nosso irmão.


A lógica de Jesus – a lógica dos seguidores de Jesus – é precisamente a única que é capaz de pôr um travão à violência e ao ódio. A violência gera sempre mais violência; só o amor desarma a agressividade e transforma os corações dos maus e dos violentos.

Isto não significa ter uma atitude passiva e conivente diante das injustiças e das arbitrariedades; significa estar sempre disposto a dar o primeiro passo para o reencontro, para acolher o que falhou; significa ter gestos de bondade e de compreensão, mesmo para quem nos fez mal. Também não significa, obrigatoriamente, esquecer (felizmente, ou infelizmente, temos memória e não a podemos desligar quando nos apetece); mas significa não deixar que as falhas dos outros nos afastem irremediavelmente; significa ter o coração aberto ao nosso próximo – mesmo quando Ele é ou foi um “inimigo”.A segunda leitura continua a catequese iniciada há uns domingos atrás sobre a ressurreição. Podemos ligá-la com o tema central da Palavra de Deus deste domingo – o amor aos inimigos – dizendo que é na lógica do amor que preparamos essa vida plena que Deus nos reserva; e que o amor vivido com radicalidade e sem limitações é um anúncio desse mundo novo que nos espera para além desta terra.
Mais uma vez convém recordar que ver a morte e a ressurreição na perspetiva da fé é libertarmo-nos do medo: medo de agir, medo de atuar, medo de denunciar as forças de morte que oprimem os homens e desfeiam o mundo… Que temos a perder, quando nos espera a vida plena, o mergulho no horizonte infinito de Deus – onde nem o ódio, nem a injustiça, nem a morte podem pôr fim a essa vida total que Deus reserva aos que percorreram, neste mundo, os caminhos do amor e da paz


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sábado, 19 de fevereiro de 2022

Lugar dos sacerdotes é «no meio das pessoas», diz o Papa

Francisco inaugura simpósio internacional sobre o sacerdócio, sublinhando importância da proximidade e rejeitando «fugas» ideológicas



17 fev 2022 (Ecclesia) – O Papa alertou hoje no Vaticano contra o “funcionalismo” dos sacerdotes, pedindo “proximidade compassiva e terna” com a realidade concreta.

“O lugar de cada sacerdote é no meio das pessoas, numa relação de proximidade com o povo”, disse, na abertura de um simpósio internacional de três dias, sobre o tema ‘Para uma Teologia Fundamental do Sacerdócio’.

Francisco assinalou a importância de conhecer e interpretar a realidade onde se vive, para que os padres não sejam“clérigos de Estado” nem “profissionais do sagrado”.

“Tenho a certeza de que hoje, para se compreender de novo a identidade do sacerdócio, é importante viver em estreita ligação com a vida real das pessoas, ao lado delas, sem qualquer via de fuga”, precisou.

A intervenção, que durou cerca de uma hora, partiu da experiência pessoal do Papa, com mais de 50 anos de sacerdócio, alertando para a tentação de procurar respostas na “ideologia do momento” ou de se fechar no passado.

“Não sei se estas reflexões são o ‘canto do cisne’ da minha vida sacerdotal, mas posso certamente assegurar que provêm da minha experiência. Nada de teoria, aqui, falo do que vivi”, começou por referir.

O Papa falou da crise vocacional que preocupa, em várias partes do mundo, as comunidades católicas, muitas vezes “funcionais”, mas sem “entusiasmo”.

“Onde houver vida, fervor, anseio de levar Cristo aos outros, surgem vocações genuínas”, afirmou.

O discurso apresentou aos participantes as “quatro colunas constitutivas da vida sacerdotal”, a proximidade com Deus, o povo, o bispo e os outros padres.

“Sem uma relação significativa com o Senhor, o nosso ministério tende a tornar-se estéril”, realçou Francisco.


Muitas crises sacerdotais têm origem precisamente numa escassa vida de oração, numa falta de intimidade com o Senhor, numa redução da vida espiritual a mera prática religiosa”.

Foto: Lusa/EPA

Numa intervenção em que elogiou os “santos” que trabalham na Cúria Romana, o Papa convidou todos a promover espaços de silêncio ao longo do dia, rejeitando a “fuga” do ativismo”.



“É justamente aceitando a desolação que vem do silêncio, do jejum de atividades e palavras, da coragem de nos examinarmos com sinceridade, que tudo ganha uma luz e uma paz que já não assentam sobre as nossas forças e capacidades”, indicou.

O Papa destacou que a proximidade com Deus abre espaço para todas as pessoas, permitindo ao sacerdote reconhecer “as feridas do seu povo, o sofrimento vivido em silêncio, a abnegação e os sacrifícios de tantos pais e mães para manter as suas famílias, e também as consequências da violência, da corrupção e da indiferença”.

Francisco defendeu a centralidade da dimensão comunitária, como resposta ao “sentimento de orfandade”, que abunda nas sociedades em rede, com ligações mas sem pertença, e advertiu para a “perversão” do clericalismo.

O simpósio promovido pelo cardeal Marc Ouellet, prefeito da Congregação para os Bispos, tem organização do Centro de Investigação em Antropologia e Vocações, organismo independente da Santa Sé.

OC

“Vendo a tentação de nos fecharmos em discursos e discussões intermináveis acerca da teologia do sacerdócio ou sobre as teorias do que deveria ser, o Senhor olha com ternura e compaixão para os sacerdotes, oferecendo-lhes as coordenadas a partir das quais hão de reconhecer e manter vivo o ardor pela missão: proximidade com Deus, com o bispo, com os irmãos presbíteros e com o povo que lhes foi confiado. Uma proximidade com o estilo de Deus, que Se aproxima com compaixão e ternura”.

(Papa Francisco)


sexta-feira, 18 de fevereiro de 2022

JOVENS, HÁ LÁ TRÊS DEDOS A FALAR POR VÓS!....



Desde as lonjuras do tempo que o desconforto de quem menos se pensa faz tocar os sinos a rebate perante as labaredas do fogo juvenil. Sentados à escrivaninha com os pés na escalfeta e manta pelas costas, os craques de certas escavações sociológicas, sofistas a seu jeito, esgotam-se na cata de argumentos para se lamuriarem e zurzirem na juventude. Esta espécie de ursos de turma não está em risco de extinção, antes pelo contrário, ahahahahah... William Shakespeare dizia que “os velhos desconfiam da juventude porque foram jovens”. Com este pensar, é de crer que alguns jovens de hoje, quando tiverem a experiência duma vida longa e dura, quando já se tiveram esquecido que também foram jovens e cederem à tentação da inveja ou de ciúmes de quem nessa altura o for, vão puxar pela mesma cartilha para classificarem, de igual modo, ou pior, os jovens que ao tempo hão de viver e conviver com eles. Hoje, até o que parece ser um rasgado elogio à juventude dos jovens arrasta consigo uma forte dúvida sobre se, de facto, o será! Há uma reiterada usurpação do vigor e da beleza juvenil. Não só, mas mesmo aqueles que desdenham os jovens anseiam ardentemente a sua juventude. Por mais que olhem e saltitem para a adquirir, não chegam lá, satisfazem-se em dizer que os jovens ainda estão muitíssimo verdes. É a fábula da raposa e das uvas no seu melhor. Dá-se aso à imaginação por não se querer aceitar as próprias limitações, por não se querer aceitar o desgaste pelo privilégio de se ter vivido e pela graça de se continuar a viver. Não estou a defender o desleixo, nem a falta de autoestima, nem a falta de brio na apresentação pessoal. Estou a dizer que se repudia a velhice mas pretende-se uma longevidade jovem, sem as marcas do tempo, mesmo que seja preciso meter o colchão no toucado como satirizava Nicolau Tolentino no século XVIII. É a ditadura da moda que oprime e explora, que leva as pessoas a recusarem os seus limites, preferindo cinzelarem-se com produtos e serviços que a publicidade, servindo-se de jovens, promove e vende na miragem da perfeita recauchutagem de quem compra. Culturas há em que as marcas da velhice são tidas como uma bênção, pois o idoso é considerado como realizado, mais próximo dos seus que já partiram e do divino. Desde a antiguidade que o padrão de beleza se vai alterando. Hoje, por cá, os guardas fatos, os roupeiros, as balanças e os espelhos não são capazes de dar um ar da sua graça aos mais exigentes. Sempre lhes fazem crer que estão a anos-luz do padrão de beleza em vigor. De facto, isto de querer morrer com saúda, idoso e jovem, dá muito, muito trabalho! Consta que vários milionários já dispuseram de cerca de três biliões de dólares para estudar a biologia do envelhecimento, não para se envelhecer jovem, isso já é pouco para eles. Trata-se de quererem derrotar a própria morte com uma “tecnologia da imortalidade”. Tenhamos esperança, ainda vamos chegar ao tempo em que as galinhas terão dentes e as cobras andarão de pé! Estar ‘in’, faz sofrer muita gente, arrasta muita canseira e sacrifício, faz com que muitos estejam nas lonas e vivam de aparências, mas tudo isso, como vemos, acaba por ser bom, faz acontecer, aguça a imaginação, o engenho e a arte. Quem corre por gosto não se cansa nem fraqueja. E o mais importante de tudo isso é que ninguém tem nada com isso, apenas desejamos que todos, no uso da sua liberdade, sejam felizes, muito felizes, e o progresso aconteça!
É verdade que a maneira de ser e de estar de muitos jovens nem sempre lhes será o mais útil para alicerçar a sua vida sobre a rocha e não sobre a areia movediça. De facto, o deixa correr, o qualquer coisa serve, a opção pelo mais fácil e certas filosofias de vida nem sempre são o melhor, o que convém. Todos estamos conscientes disso, os jovens também, mesmo que o não pareça. A Igreja, ainda que no seu seio também tenha dessas aves de mal agoiro, diz-nos que a clarividência de quem educa ou lida com os jovens deve ter a capacidade de não apagar a chama que ainda fumega nem quebrar a cana rachada que ainda não partiu. Acreditar na transformação da realidade e na conversão dos corações é o caminho a perseguir. É preciso ter a capacidade de, com esperança, individualizar percursos onde outros só veem muros, saber reconhecer possibilidades onde outros só veem perigos, ter a capacidade de valorizar e alimentar as sementes de bem semeadas no coração de cada um, um coração que deve ser considerado ‘terra santa’ e diante da qual nos devemos ‘descalçar’ para nos podermos aproximar (cf. CV67).
Mas voltemos à vaca das cordas, como se diz lá para o norte quando se perde o fio à meada e se tenta retomar. Quando se apontam os jovens com o dedo em riste, há três dedos da mão que ficam voltados para trás, para quem aponta, são mais notados que gato escondido com rabo de fora. Experimente lá, se faz favor, aprecie e magique sobre o sentido dessa sinalética!... E que tal?... Que lhe parece?!... Não sei quem seria o primeiro a chamar a atenção para esse ‘epifenómeno’, mas que é importante e de saudáveis consequências lá isso é. Ele coloca a nu uma outra lista que os jovens, de forma bem mais certeira, apresentam aos adultos muito senhores das suas análises e dos seus juízos sobre as patologias juvenis, coisa com que alguns muito se deleitam. E sirvo-me do Documento conclusivo do Sínodo dos jovens para referir algumas parcelas, não todas, dessa fatura que os jovens nos apresentam. É por causa dos adultos que «muitos jovens vivem em contextos de guerra e padecem a violência numa variedade incontável de formas: raptos, extorsões, criminalidade organizada, tráfico de seres humanos, escravidão e exploração sexual, estupros de guerra... Outros jovens, por causa da sua fé, têm dificuldade em encontrar um lugar nas suas sociedades e sofrem vários tipos de perseguição, que vai até à morte. Numerosos são os jovens que, por constrangimento ou falta de alternativas, vivem perpetrando crimes e violências: crianças-soldado, gangues armados e criminosos, tráfico de droga, terrorismo... Esta violência destroça muitas vidas jovens. Abusos e dependências, bem como violência e extravio contam-se entre as razões que levam os jovens à prisão, com incidência particular nalguns grupos étnicos e sociais. Muitos jovens são ideologizados, instrumentalizados e utilizados como carne de canhão ou como força de choque para destruir, intimidar ou ridicularizar outros. E o pior é que muitos se transformam em sujeitos individualistas, inimigos e desconfiados para com todos, tornando-se assim presa fácil de propostas desumanizadoras e dos planos destrutivos elaborados por grupos políticos ou poderes económicos. Ainda mais numerosos no mundo são os jovens que padecem formas de marginalização e exclusão social, por razões religiosas, étnicas ou económicas. Lembramos a difícil situação de adolescentes e jovens que ficam grávidas e a praga do aborto, bem como a propagação do SIDA/HIV, as várias formas de dependência (drogas, jogos de azar, pornografia, etc.) e a situação dos meninos e adolescentes de rua, que carecem de casa, família e recursos económicos». E quando se trata de mulheres, estas situações de marginalização tornam-se duplamente dolorosas e difíceis. Por vezes, o sofrimento dalguns jovens é lacerante, um sofrimento que não se pode expressar com palavras, um sofrimento que nos fere como um soco. E se é verdade que países mais ricos e poderosos e alguns organismos internacionais prestam alguma ajuda, muitas vezes fazem-no por um alto preço. Como refere o documento citado, em muitos países pobres, esta ajuda costuma estar vinculada à aceitação de certas exigências, verdadeira colonização ideológica a prejudicar de forma especial os jovens. Muitos jovens, também trazem gravados na alma «as feridas das derrotas da sua própria história, dos desejos frustrados, das discriminações e injustiças sofridas, de não se ter sentido amado ou reconhecido», além das «feridas morais, o peso dos próprios erros, o sentido de culpa por ter errado». E isto sem citar o fenómeno migratório, as suas causas, os seus sonhos e consequências, etc. (cf. CV72-85).
Caro jovem, apesar de tudo, a Igreja, pela voz do Papa Francisco, apela-te a que “não deixes que te roubem a esperança e a alegria, que te narcotizem para te usar como escravo dos seus interesses. Ousa ser mais, porque o teu ser é mais importante do que qualquer outra coisa; não precisas de ter nem de parecer. Podes chegar a ser aquilo que Deus, teu Criador, sabe que tu és, se reconheceres o muito a que estás chamado. Invoca o Espírito Santo e caminha, confiante, para a grande meta: a santidade. Assim, não serás uma fotocópia; serás plenamente tu mesmo” (cf. CV107).
D. Antonino Dias . Bispo Diocesao
Portalegre-Castelo Branco, 18-02-2022.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2022

De que jejum estamos a precisar?



Ultimamente, ouvimos falar muito da palavra jejum. Mais associada ao mundo das dietas e da perda de peso, mas, na verdade, parece que o conceito se tem “alastrado” a outras áreas.

A verdade é que vamos ouvindo a palavra e parece que esta se vai instalando, também, nos nossos pensamentos e na nossa consciência. Ao ouvi-la e ao lê-la, em que pensamos? Que ecos terá, em nós, esta ideia de jejuar?

Sem querer interferir nas opções de cada um, penso que o jejum pode ser-nos muito útil. Precisamos de jejum de intolerância. De ideias pré-concebidas. De jejum de julgamentos. De más palavras. De más intenções. De não sonhar.

Precisamos de nos retirar dos cenários que não nos fazem bem. Que nos retiram a energia positiva e que nos fazem encolher a luz que trazemos dentro. Precisamos de deixar cair as teias de tudo o que é velho, triste e magoado para dar lugar à novidade do tanto que pode chegar para nós.

O jejum de que mais precisamos talvez não seja o que nos retira o alimento, mas sim aquele que nos retira as distrações, as manobras de entretenimento para não ver o que é necessário.

É quando (nos) limpamos por dentro e quando jejuamos do lixo interior que não interessa que conseguimos ver aquilo que realmente nos contorna, nos abraça e nos ergue. Se é fácil olhar para o que somos por dentro? Não é.

Se somos bonitos todos os dias? Não somos.

Se somos simpáticos a toda a hora? E queridos e altruístas? Não somos. Nem podemos.

Não somos perfeitos nesta aventura de existir. Vamos a caminho. Prometeram-nos uma viagem inesquecível e é isso que a vida nos quer dar.

Fica a pergunta:

Será que estamos preparados para deixar todas as mochilas, todas as máscaras, todas as lutas e todas as marés negras para embarcar numa viagem que, ainda que não tenha volta, possa fazer valer tudo a pena?


Marta Arrais


quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022

Arriscar com medo



O medo transforma. O que somos. O que fazemos. E a forma como vemos os outros e a vida.

O medo torna toda a nossa história monocromática não permitindo que possamos percorrer todo o arco-íris da nossa existência. Com o medo refugiamo-nos entre o "Sim" e o "Não". Com o medo refugiamo-nos no "digno" e "indigno". Com o medo surge a necessidade de um padrão para que as incertezas e o desconhecido não nos inquiete.

O medo transforma. Molda a nossa forma de pensar e muitas vezes nem permite que nos foquemos no pensamento sincero, genuíno. O medo exige de nós um dispensar de energia em busca de um refúgio. Não deixa sequer a possibilidade de um arriscar na incerteza, na dúvida.

O medo transforma. Penso que não temos dúvidas em relação a isso, no entanto há algo ainda mais transformador em nós: arriscar no medo. Arriscar com medo. Arriscar "cheio de miaúfa".

E porque é transformador? Porque permite viver. Ninguém consegue viver com medo, por isso arriscando mesmo com medo permite um nascer de novo. É como sair da total sombra e encarar de uma vez por todas com a Luz.

Arriscar com medo permite abraçar as dúvidas. Permite aceitar que não há certezas. Permite mergulhar na diversidade e na complexidade das histórias de tantos homens e mulheres. Permite sentir a autenticidade de uma vida.

Arriscar com medo permite descobrir os caminhos da fé. Da verdadeira fé desprendida de falsas imagens de Deus.

Parece belo e realmente pode sê-lo quando temos as forças e a coragem para o fazer, mas a verdade é que nem sempre o conseguimos. E, por isso, como em tudo na nossa existência, é um caminho a fazer-se. Um caminho a ser realizado no tempo e no passo de cada um e de cada uma.

Arriscar com medo para que a não seja uma vida sofrida, mas vivida. Arriscar com medo para que a novidade e a incerteza sejam a certeza de uma vida plena.

Hoje, antes de te renderes ao medo, pergunta-te: quantas vezes arriscaste com medo? Quantas?


Emanuel António Dias

terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

«Querer…»



Queres mesmo ser feliz?
Parece que andas perdido e sem rumo.
No campo da Felicidade há tanto para descobrir e discernir.
O que me faz feliz… fará de ti um ser sorridente?

Não sei…
Sei que Deus quer-te…
Sei que Te ama tanto (a ti e a mim)
que nos dá o Filho e O ressuscita para proclamarmos (juntos) a vitória sobre a morte!!
Não temas a aridez do deserto.
Confia no Senhor que te dá a vida, hoje e para todo o sempre.

 No Evangelho do 6º Domingo do Tempo Comum, do Ano C,
S. Lucas coloca o Mestre no mesmo plano que eu e tu: «deteve-Se num sítio plano».
O Cristo Ressuscitado fala-nos abertamente de tudo o que a Felicidade Divina nos pode dar:
«Bem-aventurados vós…»
… e de tudo o que o mundo nos dá:
«Ai de vós…»
A mim e a ti só resta decidir!

O mundo enche-nos com falsos desejos e com utopias sem fim.
Enganamo-nos quando pensamos que esta terra é o melhor que temos.
Aqui há encontros e desencontros. Há momentos efémeros de felicidade.
Precisamos de mais certezas… precisamos de estabilidade e precisão.
Desejamos sonhos edificados.
Ser como as crianças que sorriem com pureza duradoira.
Ver que onde há Amor, nascem gestos!

Ser Bem Aventurado é estar ao Serviço.
Nem sempre a disponibilidade total nos traz caminho fácil.
Acreditar que a meta, o cume da vida, esboçará um sorriso sem limites, dá-nos alento e coragem.
É nessa Fé que colocamos o nosso anseio mais forte:
Tocar o Divino e trocar sorrisos com Deus, nosso Pai!


          Senhor, dos Profetas
          escuta a minha humilde oração para hoje:
          Coloca no meu rosto um sorriso que não morre.
          Ressuscita no meu peito a alegria de ser Teu e viver para Ti!
          Reacende a Luz de Jesus que ilumina o meu caminho!
          Faz com que o meu olhar reflita o brilho do Teu Santo Espírito!
          E abre o meu pensamento para que eu anseie ser Bem Aventurado! 


Liliana Dinis

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2022

Papa publica carta sobre Jubileu 2025, pedindo esperança para o pós-pandemia

Francisco assinala importância de associar dimensão espiritual ao cuidado pelos mais frágeis e pela natureza





O Papa publicou sexta- feira, uma carta sobre o Jubileu 2025, pedindo que o próximo Ano Santo na Igreja Católica seja uma mensagem de esperança para o pós-pandemia, associando a dimensão espiritual e a preocupação social.

“Devemos manter acesa a chama da esperança que nos foi dada e fazer todo o possível para que cada um recupere a força e a certeza de olhar para o futuro com espírito aberto, coração confiante e mente clarividente”, escreve Francisco, num texto divulgado pelo Vaticano.

A mensagem justifica a escolha do lema ‘Peregrinos de esperança’ para este Ano Santo, depois da crise provocada pela Covid-19.

“Não houve nação que não tenha sido transtornada pela inesperada epidemia que, além de nos ter feito tocar de perto o drama da morte na solidão, a incerteza e o caráter provisório da existência, modificou o nosso modo de viver”, destaca o Papa.

Francisco recorda que, durante os confinamentos, foram fechadas as igrejas, as escolas, as fábricas, os escritórios, as lojas e os locais dedicados ao tempo livre.

“Todos vimos algumas liberdades limitadas e a pandemia, além do sofrimento, por vezes suscitou no íntimo de nós mesmos a dúvida, o medo, a perplexidade”, apontou.

A carta elogia a “celeridade” no desenvolvimento das vacinas, manifestando confiança de que o mundo “volte a ter os seus ritmos de relações pessoais e de vida social”.


Isto será conseguido mais facilmente se agirmos com solidariedade efetiva de modo que não sejam negligenciadas as populações mais carentes, mas se possa partilhar com todos quer as descobertas da ciência quer os medicamentos necessários”.

O Papa convida a recuperar o “sentido de fraternidade universal”, evocando o “drama da pobreza crescente” e os “inúmeros refugiados forçados a abandonar as suas terras”.

“Que as vozes dos pobres sejam escutadas neste tempo de preparação para o Jubileu que, segundo o mandamento bíblico, restitui a cada um o acesso aos frutos da terra”, deseja.

Francisco desafia a Igreja Católica a associar a dimensão espiritual do Jubileu, “que convida à conversão” com “aspetos fundamentais da vida social, de modo a constituir uma unidade coerente”.

“Não nos desleixemos, ao longo do caminho, de contemplar a beleza da criação e cuidar da nossa casa comum. Almejo que o próximo Ano Jubilar seja celebrado e vivido também com esta intenção”, acrescenta.

Foi o Papa Bonifácio VIII quem, em 1300, instituiu o primeiro Ano Santo – com recorrência centenária, passando depois, segundo o modelo bíblico, cinquentenária e finalmente fixada de 25 em 25 anos.

“Milhões e milhões de peregrinos, ao longo dos séculos, vieram até estes lugares sagrados dando vivo testemunho da fé de sempre”, destaca Francisco.

A carta é dirigida ao arcebispo Rino Fisichella, presidente do Conselho Pontifício para a Promoção da Nova Evangelização, responsável pela preparação do Jubileu de 2025.

“Neste tempo de preparação, desde já me alegra pensar que se poderá dedicar o ano anterior ao evento jubilar, o 2024, a uma grande ‘sinfonia’ de oração”, escreve o Papa.

O último jubileu foi o Ano Santo extraordinário dedicado à Misericórdia, convocado com a Bula ‘Misericordiae Vultus’ do Papa Francisco, cuja coordenação foi também confiada a D. Rino Fisichella.

Esse jubileu decorreu de 29 de novembro de 2015, com a abertura antecipada da Porta Santa em Bangui, na República Centro-Africana – no Vaticano, aconteceu a 8 de dezembro, em São Pedro – a 20 de novembro de 2016.

O Ano Santo de 2025 será o 27.º Jubileu ordinário da história da Igreja.

OC


domingo, 13 de fevereiro de 2022

CAMINHO DE FELICIDADE

 

https://www.youtube.com/watch?v=Yd_k-oZlESs

A Palavra de Deus que nos é proposta neste domingo leva-nos a refletir sobre o protagonismo que Deus e as suas propostas têm na nossa existência.
A primeira leitura põe frente a frente a autossuficiência daqueles que prescindem de Deus e escolhem viver à margem das suas propostas, com a atitude dos que escolhem confiar em Deus e entregar-se nas suas mãos. O profeta Jeremias avisa que prescindir de Deus é percorrer um caminho de morte e renunciar à felicidade e à vida plenas.
Todos conhecemos a desilusão e a frustração que resultam da confiança traída. É uma experiência bem dolorosa confiar/esperar e receber traição/ingratidão. Em certos momentos extremos, parece que tudo se desmorona à nossa volta e que perdemos a vontade de continuar a construir a nossa vida. A leitura de hoje põe-nos de sobreaviso: tudo o que é humano é efémero, limitado, finito; só em Deus encontramos o rochedo seguro que não falha e que não nos dececiona.
Quais são as referências fundamentais à volta das quais se constrói a nossa vida? Onde está a nossa segurança e a nossa esperança? Na conta que temos no banco? Nos amigos influentes? Na importância da nossa posição social ou profissional? Nas conquistas científicas ou técnicas? Ou nesse Deus que se compromete connosco e encontra mil formas de demonstrar, dia a dia, a sua fidelidade?

O Evangelho proclama “felizes” esses que constroem a sua vida à luz dos valores propostos por Deus e infelizes os que preferem o egoísmo, o orgulho e a autossuficiência. Sugere que os preferidos de Deus são os que vivem na simplicidade, na humildade e na debilidade, mesmo que, à luz dos critérios do mundo, eles sejam desgraçados, marginais, incapazes de fazer ouvir a sua voz diante do trono dos poderosos que presidem aos destinos do mundo.
As bem-aventuranças manifestam, numa outra linguagem, o que Jesus já havia dito no início da sua atividade na sinagoga de Nazaré: Ele é enviado pelo Pai ao mundo, com a missão de libertar os oprimidos. Aos pequenos, aos privados de direitos e de dignidade, aos simples e humildes, Jesus diz que Deus os ama de uma forma especial e que quer oferecer-lhes a vida e a liberdade plenas. Por isso eles são “bem-aventurados”.
As advertências aos ricos não significam que Deus não tenha para eles a mesma proposta de salvação que apresenta aos pobres e débeis; mas significam que, se eles persistirem numa lógica de egoísmo, de prepotência, de injustiça, de autossuficiência, não têm lugar nesse “Reino” que Jesus veio propor.

A segunda leitura, falando da nossa ressurreição – consequência da ressurreição de Cristo –, sugere que a nossa vida não pode ser lida exclusivamente à luz dos critérios deste mundo: ela atinge o seu sentido pleno e total quando, pela ressurreição, desabrocharmos para o Homem Novo. Ora, isso só acontecerá se não nos conformarmos com a lógica deste mundo, mas apontarmos a nossa existência para Deus e para a vida plena que Ele tem para nós.
A certeza da ressurreição garante-nos que Deus tem um projeto de salvação e de vida para cada homem; e que esse projeto está a realizar-se continuamente em nós, até à sua concretização plena, quando nos encontrarmos definitivamente com Deus.
Não é possível viver com medo, depois desta descoberta: podemos comprometer-nos na luta pela justiça e pela paz, com a certeza de que a injustiça e a opressão não podem pôr fim à vida que nos anima; e é na medida em que nos comprometemos com esse mundo novo e o construímos com gestos concretos que estamos a anunciar a ressurreição plena do mundo, dos homens e das coisas.


https://www.dehonianos.org/

sábado, 12 de fevereiro de 2022

JOVEM, NÃO TE ESQUEÇAS, ELE VIVE E QUER-TE VIVO!...



É isso mesmo, jovem. Ele quer-te vivo, bem vivo, vivinho da silva. Se a origem da expressão ‘vivinho da silva’ se deve a um qualquer senhor Silva muito reguila e importante, isso não sei. Se se deve àquela planta invasora a que chamamos silva e à qual roubávamos as amoras em tempos do tempo que já lá vai, também não sei. Se se deve às varinas da Póvoa ou da Figueira a apregoar as vivinhas da costa, confesso que também não sei. Seja como for, as vivinhas da costa não me parece que tenham alguma coisa a ver com isto, a não ser para uma boa sardinhada a escorrer pelo pedaço de broa abaixo e regada com um bom vinho branco, alvarinho de preferência. E que dizer da origem da expressão no senhor Silva? Já disse que não sei, mas vós, jovens, sois muitíssimo mais importantes para nós do que qualquer senhor Silva engravatado e de cartola alta ou de smoking com papillon e pingalim. E isto, claro, sem querer desvalorizar ou minimizar os grandes méritos desse tal senhor Silva, possível candidato a condecorações. Como sabeis, o problema não está em receber condecorações, está em merecê-las. Quanto às silvas, se elas têm o poder de rebentar de novo a desafiar o agricultor que não as consegue destruir, vós tendes uma capacidade de renovação interior muito maior e mais forte, uma força sem igual, basta quererdes. Se vós quiserdes, ninguém vos passará a perna, muito menos vos esticarão o braço a puxar para trás. Essa força leva-vos a viver na alegria e na esperança, dizendo a todos, com a vossa vida de entusiasmo contagiante, que estais verdadeiramente vivos e que até quereis ajudar o mundo a dar uma cambalhota monumental sem partir o seu nariz e o vosso. É por isso que Cristo, neste hoje que é o vosso, confia em vós e vos envia por todo o mundo a anunciar a grande alegria da boa nova que Ele é e nos veio trazer! É por isso que a Igreja, também neste hoje que é o vosso, em nome de Cristo e na esteira de tantas e tantos jovens que ao longo dos tempos abraçaram tal desafio, continua a dizer-vos o mesmo e a confiar em vós, entregando-vos a Cruz de Cristo para que a leveis “pelo mundo fora como um símbolo do amor de Cristo pela humanidade” e que anuncieis “a todos que só na morte e ressurreição de Cristo é que poderemos encontrar salvação e redenção”.
É certo que a Cruz das Jornadas Mundiais da Juventude - que este mês temos a graça de a ter entre nós! -, em si mesma não vale muito, é madeira, mesmo que madeira especial. Mas tem uma longa e rica história que a vai valorizando cada vez mais, uma história construída desde 1983 ao serviço da provocação do bem por esse mundo fora. Levada pelo entusiasmo de tantas e tantos jovens, ela peregrina com uma missão bem definida: bater à porta do coração de todos, dos de boa e dos de má vontade, a convidá-los, a sugerir-lhes que oiçam bem e sem preconceitos a feliz notícia que ela representa e significa. Ela representa a vitória de Jesus Cristo sobre o pecado e a morte, mesmo que possa continuar a ser escândalo para uns e loucura para outros. Ela passa pelas nossos lugares e instituições a lembrar a todos a Cruz do Calvário, a Cruz onde o mundo, todos e cada um, fomos redimidos por Cristo. Foi na cruz que o nosso homem velho foi crucificado com Cristo, morrendo para o pecado e ressuscitando para uma vida nova em Cristo Jesus, pelo Batismo, deixando-nos guiar pelo Espírito de Deus em coerência com o Evangelho. Ela chama a atenção de todos para a necessidade de cada um carregar a sua cruz e assumir o único caminho capaz de conduzir à verdadeira Vida, testemunhando ao mundo quão importante é Cristo nascer e crescer em todos e todos diminuírem em presunções e peneiras. Falar da Cruz do Calvário e olhar para ela de forma contemplativa, é centrar a nossa fé e a nossa esperança em Cristo Jesus. Ele morreu na Cruz, sim, mas Ele está vivo, ressuscitou. Como afirma Francisco na Exortação Cristo Vive, “Ele vive e quer-te vivo! Ele está em ti, está contigo e jamais te deixa. Por mais que tu te afastes, lá está o Ressuscitado, chamando-te e esperando-te para recomeçar. Quando te sentires envelhecido pela tristeza, pelos rancores, pelos medos, pelas dúvidas ou pelos fracassos, Ele estará presente para te devolver a força e a esperança”.
Tal como o Pai disse a Jesus no rio Jordão, também cada um de nós deve fazer ecoar essas mesmas palavras dirigidas a si próprio: “tu és o meu filho muito amado”. E és, jovem, mesmo que, porventura, não acreditasses! Avivar a consciência de que Deus te ama verdadeiramente e te quer vivo e ativo levar-te-á apressadamente “a acender estrelas nas noites de outros jovens”. Sois vós, com o vosso entusiasmo, quem pode ajudar a manter a Igreja sempre jovem, “a não cair na corrupção, a não desistir, a não se orgulhar, a não se converter em seita, a ser mais pobre e testemunhal, a estar próxima dos últimos e dos descartados, a lutar pela justiça, a deixar-se interpelar com humildade”.
E junto à Cruz estava Maria, “o grande modelo para uma Igreja jovem, que deseja seguir Cristo com frescor e docilidade”. A força do seu sim e do desejo de servir foram muito mais fortes do que as suas dúvidas e dificuldades. Sem evasões nem miragens, viveu com os olhos iluminados pelo Espírito Santo, contemplava a vida com fé, guardava tudo no seu coração, com naturalidade quotidiana. Acolheu, protegeu, seguiu Jesus, continua a velar “por nós, seus filhos, que muitas vezes caminhamos na vida cansados, carentes, mas desejosos que a luz da esperança não se apague”. Ao longo da história, no bom uso da sua liberdade e comprometidos com o bem comum, muitos jovens de coração e cara lavada, sem se fecharem no seu mundozinho ou casulo asfixiante, sem forjarem histórias da carochinha ou desculpas de mau pagador, «têm feito brilhar os traços da idade juvenil em toda a sua beleza e, na sua época, foram verdadeiros profetas de mudança” (cf. CV1-49). Esta é a vossa época, o vosso hoje, caros jovens, seja na escola, na universidade, na política, no sindicato, na profissão, na família, na sociedade. Mas sempre abertos ao desenvolvimento e à cidadania globais. O exemplo de tantos e de tantas mostra de quanto sois capazes quando vos abris à cultura do encontro com crentes e não crentes para bem fazer e fazer bem, vendo no rosto de cada um o rosto do próprio Cristo, um irmão, um companheiro de viagem. Não desistais, esta é a vossa vez, a vossa hora, uma hora de esperança para todos!
D. Antonino Dias . Bispo Diocesano


Portalegre-Castelo Branco, 11-02-2022.

Como lidar com o que não se compreende?



Podem ser muitos os momentos em que não conseguimos lidar com o que nos acontece. De repente, fogem-nos as seguranças de debaixo dos pés, varrem-se-nos as certezas e julgamos ver uma onda, que rima com tsunami, no horizonte. Atravessam-nos mundos em cacos, telhados de vidro e de dor, paredes de espanto e de amargura.

Como lidamos com o que não compreendemos? Com o que vem sem avisar e sem notícia?

Não lidamos. Nem sempre é possível ter coragem para enfrentar o que aparece. Às vezes é só necessário ter um colo onde poisar, uma presença onde descansar os braços, as guerras, as lutas e todas as tristezas que venham e cheguem.

Nem sempre conseguiremos lidar, de peito feito, com o que nos acontece. Às vezes somos, simplesmente, varridos por este ou aquele acontecimento. Por esta ou aquela onde. O que importa é ter quem nos console. Encontrar, no meio da confusão e do rasto de destruição, aqueles que nos sustentam o coração quando ele nos quer saltar do peito e desaparecer para sempre.

Às vezes só temos que deixar que a onda passe. Que nos varra para, depois, nos recompormos. O importante é ter presente que não estamos sozinhos. Não sofremos sem a companhia dos que sofrem connosco. Não estamos órfãos de colo e de conforto.

Quando não soubermos lidar com o que não compreendemos, resta-nos esperar. Deixar-nos ser frágeis e pequenos. Deixar passar o vento da tempestade. Deixar que os relâmpagos se cansem de rebentar dentro da alma e da pele.

Dizem que tudo passa. Não é verdade. Há dores que não passam. Há marcas que não se apagam. No entanto, somos feitos das vezes em que nos morrem partes para, depois, nascerem outra vez. De outra forma.

Enquanto a tempestade não passa, agarra-te aos que te são tudo. Com unhas. Dentes. E coração inteiro.

Mais à frente é outro dia.


Marta Arrais


sexta-feira, 11 de fevereiro de 2022

Quem é Jesus?



O encontro e a vivência plena da fé em Jesus Cristo é algo que nos inquieta permanentemente.

Falo, obviamente, não da vivência da fé por partilha de ideal ou de herança de família, mas da fé que leva a sermos crentes. Isto é, a vivência total da fé, onde é caracterizada por momentos de luz e de sombra. De dúvidas. De crises e também de um arriscar pleno.

E, por isso, a grande questão que trago hoje e que me tem acompanhado nos últimos tempos é: quem é Jesus? Quem é este Jesus? Quem é este homem que depois de tantos anos após a sua existência continua a fazer parte da minha vida e a definir muito do que sou?

Reconheço-O como Deus por causa dos milagres? Reconheço-O como Deus porque me dá segurança e conforto?

Reconheço-O como Deus para defender a minha visão do mundo?

Estou inclinado a responder, principalmente a estas últimas questões, que não. Não é por nada disso. Até porque aos milagres eu nunca os assisti. E o Evangelho que Ele me apresenta é reconfortante, mas é também muito mais desafiador e inquietante para a minha vida.

Por isso, a vivência da fé em Jesus penso que deve passar pela sede. Sim, temos de andar sedentos. De nós mesmos e de Deus, porque a fé estará sempre alinhada com este arriscar. Muitas vezes duvidando de tudo. Muitas vezes questionando-nos por inteiro.

A fé não pode é ser uma moda. Não pode ser uma ideologia política. Não pode deixar-nos serenos e cheios de certezas.

Para vivermos a fé temos de aceitar que a nossa vida será uma interna interrogação. Para vivermos a fé temos de aceitar que arriscaremos sempre no mistério e na loucura de acreditar numa pessoa.

Hoje, antes de voltares a professar o Credo, pergunta-te: quem é Jesus? Quem é este Jesus para ti?


Emanuel António Dias


quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

«Pescar…»

 



“Deixar tudo!”
Que expressão tao forte!
Implica coragem, firmeza, decisão sem retorno.
Um Baptizado, que abraça a Fé, deixa tudo com naturalidade.
Só não abandona a rede! Agarra-a com toda a força e vai mais além…
Será Pescador de Homens todo aquele que também for pescado!


Só podemos ser e dar aquilo que somos e temos.
Não basta que ouçam as palavras da nossa boca.
É urgente tomar o barco da Igreja, içar velas e partir…
A viagem pode ser curta… até ao vizinho do outro lado da rua, que vive só e triste.
Mas, também pode ser longa… até ao continente vizinho onde a natureza devasta a humanidade!
Urgente é ser luz no mundo, porque onde há Amor nascem gestos!



 A liturgia do 5º Domingo do Tempo Comum, do Ano C, envia-nos!
Como o Profeta Isaías que tenhamos a coragem de pedir:
«Eis-me aqui: podeis enviar-me».
Como S. Paulo que tenhamos na mente que só transmitimos o que recebemos:
«Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras;
foi sepultado e ressuscitou ao terceiro dia…
»

E com esta Fé forte e firme no Mestre Jesus, saibamos fazer como Simão:
«Tendo conduzido os barcos para terra, eles deixaram tudo e seguiram Jesus.»

A Oração é a rede que nos apanha e nos congrega nesta Igreja que é de Cristo.
O pecado será sempre limpo, se caminharmos na presença dos Anjos… e a pesca será milagrosa!
Durante esta semana rezemos por todos os Baptizados que se esqueceram que devemos caminhar juntos,
sinodalmente…



«Faz-te ao largo e lançai as redes para a pesca».

Vai! Procura, que irás encontrar…

Mas, Senhor a nossa incerteza, a nossa fraqueza humana,
todas as nossas dúvidas e os passos mal andados,
fazem-nos temer e parar…

«Daqui em diante serás pescador de homens»

Porquê a mim, Senhor?

Fraco, incerto e até com umas ideias tresloucadas…

Sim! Eu…

…que ponho os pés pelas mãos…

…que não me sinto um grande exemplo para o meu próximo…

…que sou um pecador!

“Não temas!”

Sim, Senhor, eu sei que estás sempre comigo.

Eu sei que nos momentos mais difíceis estás sempre lá para me ajudares a continuar o caminho,
assim como o cireneu o fez no caminho para o calvário.

Sim, Senhor, és Tu quem me dá o alento,
quem me dá alegria e me incentiva nesta caminhada.

Sei Senhor, que sem Ti serei um ser inanimado e contigo sou a vida
pois, Tu me enches do Teu Espírito, do Teu Amor!


José Emanuel Milhazes Penteeiros no GEJ


Liliana Dinis

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022

Sínodo 2021-2023: Vaticano admite dificuldades e resistências, mas sublinha adesão das Conferências Episcopais

Processo lançado pelo Papa em outubro decorre a nível local, até agosto

Foto: Synod.va


 (Ecclesia) – O Vaticano informou hoje, em comunicado, que 98% das Conferências Episcopais – entre elas a Portuguesa – responderam ao pedido de nomeação de uma pessoa ou equipa de ligação para acompanhar o processo sinodal lançado pelo Papa em outubro.

A informação foi avançada, em comunicado de imprensa, após uma reunião do Conselho Ordinário do Sínodo dos Bispos.

“Cerca de três meses após a abertura do processo sinodal, o Conselho Ordinário expressou grande satisfação com o progresso do processo a nível local. 98% das Conferências Episcopais e sínodos das Igrejas Orientais de todo o mundo nomearam uma pessoa ou uma equipa inteira para implementar o processo sinodal”, pode ler-se na nota, enviada à Agência ECCLESIA.

Os responsáveis da Santa Sé falam numa “miríade de iniciativas” para promover a consulta e o discernimento eclesial, pedidos pelo Papa, com testemunhos e recursos publicados online.

O percurso para a celebração do Sínodo está dividido em três fases, entre outubro de 2021 e outubro de 2023, passando por uma fase diocesana e outra continental, que dará vida a dois instrumentos de trabalho diferentes distintos, antes da fase definitiva, ao nível mundial.

A auscultação das Igrejas locais é uma etapa inédita, desenhada pelo Papa Francisco; a fase diocesana foi prolongada até 15 de agosto de 2022, permitindo mais quatro meses de auscultação e mobilização das comunidades locais.

O Conselho Ordinário do Sínodo dos Bispos admite que, neste momento, “as modalidades de consulta e a participação” variam de uma região do mundo para a outra, com mais “alegria e entusiasmo” em vários países de África, América Latina e Ásia.

O comunicado observa que o processo sinodal é entendido por muitos como “um momento crucial” para a Igreja, apesar de algumas dificuldades e resistências.

“Assinalam-se de facto o medo e a reticência entre alguns grupos de fiéis e entre o clero. Existe também uma certa desconfiança entre os leigos que duvidam que o seu contributo venha realmente a ser tido em conta”, pode ler-se.

A Santa Sé assinala que, além do impacto negativo da pandemia, o processo tem enfrentado desafios ligados à “necessidade de formação”, à autorreferencialidade, à pouca participação de jovens e pessoas que vivem à margem das instituições da Igreja.

A novidade do processo sinodal suscita, certamente, muita alegria e dinamismo, mas também um certo número de incertezas que precisam de ser enfrentadas”.

A Secretaria-Geral do Sínodo está a preparar uma nota para a preparação dos “relatórios” pelas dioceses e conferências episcopais, pedindo que estes sejam “fruto de um processo espiritual e de trabalho de equipa”.

As respostas recolhidas por cada diocese podem ser enviadas para Roma e devem ser entregues à respetiva Conferência Episcopal até agosto de 2022, para uma síntese nacional.

Na Alemanha, o “Caminho Sinodal” da Igreja Católica teve, este sábado, a sua terceira assembleia plenária, que aprovou três documentos: “Fundamentos teológicos do caminho sinodal”, “Poder e separação de poderes na Igreja” e “Envolvimento dos fiéis na nomeação do bispo diocesano”.

Em cima da mesa estão, entre outros, textos sobre o diaconado feminino e o celibato obrigatório para os padres diocesanos.

OC

terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

Portalegre-Castelo Branco: Conselho Diocesano de Pastoral destacou passagem dos símbolos da JMJ pela diocese


(Ecclesia) – O Conselho de Pastoral da Diocese de Portalegre-Castelo Branco reuniu-se este sábado para abordar, entre outros temas, a passagem dos símbolos da Jornada Mundial da Juventude (JMJ), pelas comunidades católicas.

“Que tudo se faça a despertar para a caminhada em direção à JMJ e para a participação na mesma, sem esquecer a sensibilização e informação pelas redes sociais e a própria rádio”, apelam os responsáveis.

A quarta etapa da peregrinação da Cruz e do Ícone mariano nas dioceses portuguesas vai decorrer até 5 de março, na cidade de Castelo Branco, seguindo para a Diocese da Guarda.

A 21 de fevereiro, Cernache do Bonjardim vai acolher entre o Comité Organizativo Local (nacional) e os Comités Diocesanos de todo o país.

Os participantes abordaram ainda o desenrolar do processo do Sínodo 2021-2023, sobre ‘Sinodalidade: comunhão, participação e missão’, e o Ano Jacobeu (Santiago de Compostela), entre outros temas.

OC