Vamos viver o II Dia Mundial dos Avós e idosos. Desde há tempos que, em alguns países, o celebrávamos em 26 de julho, na memória litúrgica de Santa Ana e São Joaquim, avós de Jesus. Doravante, por iniciativa do Papa Francisco para toda a Igreja e para facilitar uma maior participação e festa, embora perto daquela memória, e a seu pretexto, celebrá-lo-emos no quarto domingo de julho de cada ano. A durabilidade das pessoas aumenta, facto que não devemos ver como problema, mas como oportunidade para agradecer e investir cada vez mais na solidariedade intergeracional, fundamento do desenvolvimento sustentável. A família é o principal centro de coesão social, onde as pessoas mais velhas “são agentes essenciais para a construção de sociedades pluralistas em que a dignidade humana e a liberdade são valorizadas e respeitadas”.
Apoiado num versículo do Salmo 92, o Papa Francisco, desta vez, quer falar ao mundo dos idosos como aquelas pessoas que “dão fruto mesmo na velhice”. Coisa que exige remar contra a maré em relação àquilo que o mundo pensa desta idade e contra o comportamento resignado de alguns idosos que, deixando cair os braços após a vida ativa, vivem sem nada mais esperar e fazer. É certo que, por um lado, muitas pessoas “têm medo da velhice. Consideram-na uma espécie de doença, com a qual é melhor evitar qualquer tipo de contacto: os idosos não nos dizem respeito – pensam elas – e é conveniente que estejam o mais longe possível, talvez juntos uns com os outros, em estruturas que cuidem deles e nos livrem da obrigação de nos ocuparmos das suas penas. É a «cultura do descarte»: aquela mentalidade que, enquanto nos faz sentir diversos dos mais frágeis e alheios à sua fragilidade, permite-nos imaginar caminhos separados entre «nós» e «eles». Por outro lado, a velhice “constitui uma estação que não é fácil de entender, mesmo para nós que já a vivemos. Embora chegue depois dum longo caminho, ninguém nos preparou para a enfrentar; parece quase apanhar-nos de surpresa (...) Por um lado, somos tentados a exorcizar a velhice, escondendo as rugas e fingindo ser sempre jovens, por outro parece que nada mais se possa fazer senão viver desiludidos, resignados a não ter mais «frutos para dar».
Mas não deve, não pode ser assim. A sociedade deve desmilitarizar o coração e ver o outro como um irmão e amigo para caminharem juntos, os idosos devem ensinar a contemplar cada pessoa com o mesmo olhar compreensivo com que olham os seus netos. Este Dia Mundial, segundo Francisco, é mais uma oportunidade para dizer ao mundo que a Igreja quer fazer festa, uma festa conjunta com aqueles que o Senhor “saciou com longos dias”, pois uma vida longa é uma bênção, é um sinal vivo da benevolência de Deus, fonte da vida. Bendita “a casa que guarda um ancião! Bendita a família que honra os seus avós!”, lemos na Mensagem do Papa da qual aqui realço alguns pensamentos mas convido a ler pois nos desafia e provoca a celebrar a festa conjuntamente, com alegria: “Celebremo-la juntos! “Convido-vos a anunciar este Dia nas vossas paróquias e comunidades, a visitar os idosos mais abandonados, em casa ou nas residências onde estão hospedados. Procuremos que ninguém viva este dia na solidão. Ter alguém para cuidar pode mudar a orientação dos dias de quem já não espera nada de bom do futuro; e dum primeiro encontro pode nascer uma nova amizade. A visita aos idosos abandonados é uma obra de misericórdia do nosso tempo!”.
A velhice “não é um tempo inútil, no qual a pessoa deva pôr-se de lado recolhendo os remos para dentro do barco, mas uma estação para continuar a dar fruto: há uma nova missão, que nos espera, convidando-nos a voltar os olhos para o futuro”. É verdade que a aposentação com a perda da vida ativa, os filhos já autónomos, a consciência de que as forças declinam, o aparecimento duma doença, a dificuldade em acompanhar os ritmos acelerados do mundo, tudo pode levar os idosos a crises pessoais, a interiorizar a ideia de mal-amados e do descarte, a pensar que se é um peso, um estorvo. E se isto pode fazer sofrer os idosos, também faz sofrer muitas famílias que, por circunstâncias várias a que a vida as obriga, os têm de colocar, contra vontade sua e deles, em estruturas que as ajudem a cuidar dos seus idosos com amor e ternura. Se, porventura, muitos o fazem para se verem livres deles e de possíveis trabalhos e nunca lá aparecem a visitá-los, outros há que, sofridos, se sentem obrigados a isso, mas permanecem sempre preocupados e presentes, não é tudo farinha do mesmo saco!
Sabemos que as sociedades mais desenvolvidas “gastam muito para esta idade da vida, mas não ajudam a interpretá-la: proporcionam planos de assistência, mas não projetos de existência”. Na esperança de que essas dimensões sejam sempre repensadas em busca do melhor bem comum, Francisco também convida todos os avós e idosos a serem protagonistas daquela “revolução da ternura, uma revolução espiritual e desarmada” conseguida através da oração, tornando-se “um pouco poetas da oração”. A oração confiante “pode fazer muito: é capaz de acompanhar o grito de dor de quem sofre e pode contribuir para mudar os corações. Podemos ser «o “grupo coral” permanente dum grande santuário espiritual, onde a oração de súplica e o canto de louvor sustentam a comunidade que trabalha e luta no campo da vida» . Importante é lutar por uma velhice ativa, “inclusive do ponto de vista espiritual, cultivando a nossa vida interior através da leitura assídua da Palavra de Deus, da oração diária, do recurso habitual aos Sacramentos e da participação na Liturgia”, sem esquecer, a par, as boas relações com a família, com os pobres e atribulados, com a ajuda concreta e a oração por todos. Tudo isso ajudará a que ninguém se sinta mero espetador no teatro do mundo, a olhar da sacada, a ficar à janela. Cada um poderá ser como uma «oliveira verdejante na casa de Deus», como uma bênção para quem vive junto de si, encontrará mais força para multiplicar o louvor, descobrirá que “envelhecer não é apenas a deterioração natural do corpo ou a passagem inevitável do tempo, mas também o dom duma vida longa. Envelhecer não é uma condenação, mas uma bênção!”.
D. Antonino Dias - Bispo Diocesano
Portalegre-castelo Branco, 22-07-2022.
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