quinta-feira, 27 de novembro de 2025

🌾 Ouvir a voz do vento



Em África, quando alguém chega com um problema, não se corre a dar-lhe uma resposta. Primeiro escuta-se. Escutam-se os anciãos, escuta-se o coração… e depois escuta-se o vento.
Chamam-lhe o tempo de mastigar palavras com Deus. É o tempo de deixar que o Espírito sussurre por entre as folhas, que a poeira assente, que a alma encontre o seu próprio passo. Ali, não se procuram soluções apressadas — procura-se sentido. Porque há dores que não se resolvem, apenas se atravessam. E no fim, não há uma conclusão, há uma estrada.
Aqui, no nosso mundo apressado, perdemos essa arte antiga.
Queremos respostas imediatas, curas instantâneas, atalhos para tudo.
Corremos a resolver o que mal compreendemos. Tomamos decisões no calor da pressa e, depois, admiramo-nos com o frio que fica. Esquecemo-nos de que um problema mal escutado renasce noutro lugar,
e que fingir que nada se passa não é sabedoria — é cegueira.
Os africanos dizem: “Os problemas não apodrecem com o tempo.”
E têm razão.
O que não se enfrenta, enraíza-se.
O que não se nomeia, apodrece por dentro.
O que não se escuta, transforma-se em ruído, e o ruído faz-nos surdos à voz do vento.
Talvez o que nos falta seja isto:
parar.
Parar, não para desistir, mas para discernir.
Para permitir que as nossas almas nos alcancem.
Para que Deus tenha tempo de nos dizer alguma coisa antes de falarmos nós.
A voz do vento não grita — sussurra.
E só quem abranda a consegue ouvir.
Ela sopra sobre as nossas confusões, sobre as dores e as escolhas,
e ensina-nos que nem tudo tem de ser decidido já.
Que há decisões que nascem do silêncio, e não da pressa.
Vivemos como se tivéssemos de chegar sempre a algum lado,
mas esquecemo-nos de perguntar se é lá que o coração quer ir.
Corremos — porque todos correm.
Produzimos — porque é o que se espera.
E, no meio da pressa, deixamos o coração para trás.
Mas quem ouve o vento, a Voz de Deus sabe:
há um tempo para agir e um tempo para escutar.
Um tempo para decidir e um tempo para deixar que a vida fale primeiro.
Talvez Deus fale assim — não em trovões nem em respostas prontas,
mas no rumor suave que passa quando paramos para O ouvir.
E é aí, nesse instante de calma,
que tudo começa a fazer sentido.


Padre João Torres


Sem comentários:

Enviar um comentário

Este é um espaço moderado, o que poderá atrasar a publicação dos seus comentários. Obrigado