O mundo que os nossos pés pisam convenceu-nos das coisas mais extraordinárias. Convenceu-nos a acreditar que a igualdade se conquista e se alcança. Fez-nos crentes numa paz bonita e florida que só existe nos filmes. Levou-nos a crer nas boas intenções, na bondade, no autêntico, no verdadeiro e no simples. Abraçou-nos com palavras de fazer tremer qualquer um. Com essas palavras construiu frases capazes de nos fazer baixar todas as guardas e de nos fazer suspender todas as defesas. Disse-nos que só vencemos se estivermos juntos. Que o bem compensa. Que a guerra acaba (um dia). Que os amigos são para sempre. Que a vida dá mais do que tira. Que o sol é para todos. Que vale a pena cuidar do que está perto e de quem está perto. Ou longe. Que havemos de ser felizes (um dia). Que a vitória é sempre menos interessante que o simples facto de participar ou fazer parte.
O mundo que as nossas mãos agarram convenceu-nos das coisas mais extraordinárias. E absurdas, também. Não nos contou que nunca seremos todos iguais e que isso não será, necessariamente, terrível. Não nos disse que, mesmo juntos, nem sempre vencemos. Que escolher o bem também pode fazer doer. Que a guerra acaba mas que nada fica como estava antes. Que os amigos também se ausentam e chegam a esquecer-se do caminho de volta. Que a vida não sabe nada de pesos e medidas. Que o sol não é para todos. Que cuidar traz cansaço e mágoas. Que não seremos felizes todos os dias. Que ninguém gosta de perder.
O mundo que os nossos olhos recebem convenceu-nos das coisas mais extraordinárias. E mais bonitas, também. Que o pão sabe melhor se estiver quente. Que quando um dia nasce há um mistério por viver que ainda não pertence a ninguém. Que quando o dia segura a porta para a noite passar, tudo se acalma. Que quando o mar nos beija os dedos dos pés vale a pena sentir frio. Que voltamos a nascer quando poisam em nós as asas dos que amamos. Que chorar lava e limpa o que a vida não leva. Que os olhos contam histórias mais bonitas do que as bocas ou as vozes. Que não somos iguais nas vontades e nos sonhos. E ainda bem.
Não acredites só no que o mundo tem para contar. Agarra na tua história e conta-lhe o que ainda ninguém sabe.
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