Aproximamo-nos da quadra natalícia e, por vezes, sinto que esta época quer empurrar, com a barriga grande do Pai-Natal, as coisas difíceis que a vida traz e tem. Somos obrigados a viver de luzes, árvores de Natal, enfeites mais ou menos ridículos e palavras mais ou menos bonitas. A verdade é que essa imposição de viver um tempo (obrigatoriamente) feliz ignora duramente todas as dores, mágoas e saudades que chegam atreladas ao trenó que parecemos ser obrigados a carregar.
É uma altura mais nostálgica do que mágica. E quem não está pronto para viver este acender de luzes, onde fica? E quem não tem ânimo (ou dinheiro!) para comprar presentes de Natal, onde fica? E quem não sabe que comida vai poder colocar na mesa, onde fica? E quem tem um luto para fazer, onde fica? E quem vive de coração carcomido pelas saudades, onde fica?
Fica lá atrás. Numa espécie de bastidores onde ninguém quer ir. Numa espécie de camarim cheio de teias de aranha onde ninguém quer entrar.
Enquanto isso, a “maioria” atua no palco dos felizes e dos que, tantas vezes, vivem simplesmente uma mentira.
É preciso encontrar espaço, neste Natal, para os que estão doridos. Para os que não sabem como lidar com a solidão, com o luto, com as zangas que nunca se resolveram, com a falta de paz, com a escassez de alimento ou de calor.
E, sem querer estragar o espírito natalício, quantos lutos temos adiado para viver de luzes que só acendemos para os outros? Quantas palavras precisamos ainda de deixar arder? Quantas mágoas precisamos, ainda, de deixar ir? Quantas pessoas deixámos fugir? Quantas não conseguimos perdoar?
O Natal não é sobre luzes. É sobre ser pequeno.
Não é sobre árvores com estrelas douradas que tocam nos tetos. É sobre A Luz que não se apaga.
Não é sobre sacos carregados de coisas. É sobre o coração cheio do que não passa nem se gasta com o tempo.
Que Natal vem a ser este, afinal?!
Marta Arrais
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