segunda-feira, 6 de março de 2017

A arte de perdoar



Quantas vezes já ouvimos a expressão: "Eu perdoo, mas não esqueço"? Eu já lhe perdi a conta e em algumas dessas vezes fui eu mesma que a utilizei. Perdoar as injúrias, as ofensas, as mágoas que outros cravam em nosso coração será, talvez, a obra de misericórdia espiritual mais difícil de concretizar e, no entanto, uma das mais importantes enquanto cristãos.

Jesus, ao longo dos vários episódios relatados nos quatro Evangelhos, mostra-nos que uma das condições do seu discipulado é saber perdoar, "setenta vezes sete", como diz a Pedro (Mt 18, 22), sendo "misericordiosos como o nosso Pai é misericordioso" (cf. Lc 6, 36). Mais do que enunciar as 'regras' para o seu seguimento, Jesus mostra-nos o caminho. Numa coerência ética ímpar, Jesus vai, a cada novo encontro, fazer aquilo que nos exorta a ser.

No seu encontro com a mulher adúltera, por exemplo, ensina-nos que não devemos ser rápidos a julgar e que só deve atirar a primeira pedra aquele que nunca tiver pecado. Neste episódio, o único que o poderia ter feito, por nunca ter pecado, foi também aquele que, não só não a condenou, como soube ir ao encontro do seu sofrimento, perdoando-a. Os restantes homens presentes, nesta passagem do Evangelho segundo São João (Jo 8, 1-11), não atiraram as pedras que traziam porque reconheceram que não estavam isentos de culpa mas, nem por isso, perdoaram aquela mulher. No final deste episódio ficam apenas duas pessoas: Jesus e a mulher. Jesus pergunta-lhe então: «Mulher, onde estão eles? Ninguém te condenou?» Ela respondeu: «Ninguém, Senhor.» Disse-lhe Jesus: «Também Eu não te condeno. Vai e de agora em diante não tornes a pecar» (Jo 8, 10-11). É neste encontro pessoal com Deus, no silêncio do nosso coração, que descobrimos a graça do seu perdão e, mergulhados na sua misericórdia, sentimo-nos impelidos a sermos melhores, a sermos mais, a não querermos voltar a pecar. Se é do perdão amoroso de Deus que bebemos a coragem de recomeçar e de seguirmos em frente renovados, porque temos tanta dificuldade em seguir o seu exemplo quando somos nós os ofendidos?

Pergunto-me quantas vezes já rezámos o Pai Nosso, pedindo a Deus que perdoe as nossas ofensas sem estarmos, no entanto, minimamente dispostos a perdoar quem nos tem ofendido?

Hoje, dia do Senhor, dia em que rezamos em uníssono a oração que Jesus nos ensinou, vale a pena pensar se têm sido vãs as nossas obras como o são, tantas vezes, as nossas palavras..

Raquel Dias (26-02-2017) iMissio

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