terça-feira, 10 de outubro de 2023
A minha casa é o meu coração
Não sabemos cuidar do que é nosso. Ou melhor, sabemos cuidar dos nossos. Do que está fora de nós. Colecionamos sacrifícios e malabarismos em prol dos outros. Dos filhos, dos pais, dos irmãos, dos amigos, dos que nos são mais ou menos sangue.
No entanto, quando chega a hora de olharmos para a casa de dentro tudo se descompõe. O que estava desarrumado, desarrumado fica. O que está por amar, por amar fica. O que precisa de ser intervencionado, amputado fica.
Vivemos uma vida profundamente incompleta e nem nos apercebemos. Dedicamo-nos a uma causa com as entranhas acesas e nem duvidamos. Apostamos as fichas todas no cuidado de quem mora connosco, mas não sabemos cuidar da nossa casa. Do nosso coração. Da nossa alma.
De vez em quando, e porque o corpo é sábio, lá vem uma onda desgovernada em forma de calafrio. De gripe. De depressão. De pânico. De pedra na vesícula. De descomando físico. E surpreendemo-nos muito porque até somos vegan. E até fazemos exercício físico. E até bebemos 2 litros de água por dia. Mas deixámo-nos secar por dentro. A nossa criança interior morre à sede. As nossas necessidades espirituais e emocionais pedem esmola. O nosso coração já nem sabe se é órgão ou contorno e esqueleto.
Não vale passar a vida a cuidar dos outros se não soubermos olhar para o que precisamos. Às vezes só precisamos de um copo de água. Ou da alma lavada com a água fria de quem sabe ver e olhar para dentro. Outras vezes precisamos de não estar sozinhos. De ser amados. De ser vistos. De ser respeitados. De que nos digam que estamos no caminho certo. De que nos digam que estamos a fazer o melhor que podemos. Mas a primeira pessoa que deve dizer todas essas palavras-consolo somos nós próprios. Porque enquanto formos órfãos de nós, nunca teremos paz ou pão.
Que nos seja cada vez mais fácil olhar para nós como olhamos para os outros. Que a esperança que depositamos naquilo em que acreditamos nos seja estendida. Que o amor que dedicamos aos nossos seja alargado ao que mora, tantas vezes errante, dentro de nós.
Não te esqueças de ti.
Marta Arrais
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