terça-feira, 4 de março de 2014

Mensagem Quaresmal de D. Antonino Dias

QUARESMA EM FAMÍLIA
EM FAVOR DAS FAMÍLIAS















A festa faz parte da natureza do homem como ser de relação e de comunhão. Muito antes de ela acontecer, a festa já anima as pessoas e gera expectativas, na esperança de se vir a participar e a usufruir dela. Mais proximamente, cuida-se do visual e do vestuário e saímos ao encontro uns dos outros para todos fazermos festa. O entusiasmo e a alegria que colocamos nos preparativos contagiam e animam outros a fazerem o mesmo. Ora, a festa por excelência dos cristãos é a Páscoa e a Páscoa já se encontra a caminho. Por isso mesmo, vimos convidar todas as pessoas de boa vontade desta nossa Diocese de Portalegre-Castelo Branco, a que se insiram nesta caminhada de preparação, com empenho e entusiasmo, para que todos possamos viver dignamente a Festa da Páscoa. A esta preparação chamamos Quaresma e a Quaresma lembra-nos que somos pó, pede que nos convertamos, que nos revistamos do homem novo, que perfumemos a cabeça e andemos de rosto lavado, sem réstias de “cara de vinagre”, de “cara de funeral” ou de “cara de sexta-feira santa”. Por sua vez, a festa, se faz parte da natureza humana, é necessariamente comunitária. Ninguém faz festa sozinho. A festa exige pessoas envolvidas pela alegria de estarem umas com as outras para gozarem tal acontecimento e se enriquecerem com a participação de tantos. Ora, se a festa é comunitária, a preparação também o pode ou deve ser. Por isso, atrevemo-nos a sugerir que vivamos a preparação desta grande festa da Páscoa em comunidade. Na comunidade cristã, sim, mas, uma vez que estamos envolvidos em tantos acontecimentos relacionados com a família a nível internacional e local, propomos que esta festa da comunidade cristã se faça a partir da preparação em família, para que as famílias, todas as famílias da nossa diocese, se associem e façam festa. Como sabemos, a família merece tudo e tudo quanto se possa fazer em seu favor, a partir de dentro e de fora da própria família, é sempre muito pouco. Na preparação para esta grande festa, porém, são as famílias que têm de assumir esta feliz tarefa. Como comunidade de vida e de amor, a Família cristã procura que todos os seus membros cuidem do bem-estar e da promoção uns dos outros, não só no quotidiano da vida mas também aproveitando os momentos fortes que as circunstâncias e a própria vida vão oferecendo. A Quaresma é um desses momentos fortes que, vivido em família, faz caminhar ao encontro cada um de si próprio e do outro e todos ao encontro do Senhor da vida e da história, ao encontro d’Aquele que deu a vida por cada um de nós, ressuscitou e está connosco. O apelo da Quaresma à conversão e à penitência visa sobretudo o apelo àconversão do coração que se traduz necessariamente em sinais visíveis, gestos e penitência. Entre estes gestos, a Sagrada Escritura e a Tradição insistem sobretudo em três formas: o jejum, a oração e a esmola, que incluem a reconciliação com Deus e o próximo, a preocupação com a salvação dos outros (Tg 5, 20) e a prática da caridade (1Ped 4, 8), esvaziando-nos dos nossos egoísmos. O Pastor de Hermas, obra literária cristã do século II, esclarece-nos: “Eis como deverás praticar o jejum: durante o dia de jejum tu comerás somente pão e água; em seguida, calcularás quanto terias gasto em alimento durante aquele dia e oferecerás esse dinheiro a uma viúva, a um órfão ou a um pobre; assim, privar-te-ás de alguma coisa para que o teu sacrifício seja proveitoso a alguém para se alimentar. Ele rezará por ti ao Senhor. Se tu jejuares desta maneira, o teu sacrifício será agradável a Deus”. Tudo isto vivido e programado em Família, tem, com certeza, outro alcance: evangeliza, santifica, educa, compromete, promove, fortalece a fé que se traduz em obras, faz pensar nos outros e gera alegria contagiante em etapas de desempenho e avaliação. Tal como a comunhão familiar, também a oração em família tem as suas caraterísticas. É uma oração feita em comum, marido e mulher juntos, pais e filhos juntos, como fruto e exigência daquela comunhão que é dada pelos sacramentos do batismo e do matrimónio (cf. FC 59). “Só rezando em conjunto com os filhos, o pai e a mãe, enquanto cumprem o próprio sacerdócio real, entram em profundidade no coração deles, deixando marcas que os acontecimentos futuros da vida não conseguirão fazer desaparecer” (FC, nº 60). Os filhos precisam deste testemunho dos pais e os pais precisam de descobrir constantemente o seu importantíssimo ministério de educadores da fé e dos valores cristãos.
Esta experiência de comunhão confirma e aperfeiçoa a comunhão natural e humana e faz da família uma escola de humanismo que se manifesta no cuidado e no amor para com os mais pequenos, os doentes e os idosos. E se o egoísmo, o desacordo, as tensões e os conflitos agridem esta comunhão, o Deus da paz convida cada família a fazer a experiência alegre e renovadora da reconciliação, ou seja, da comunhão restabelecida, da unidade reencontrada. A participação no sacramento da reconciliação e no banquete do único Corpo de Cristo oferece à família cristã a graça e a responsabilidade de superar todas as divisões e de caminhar para a plena verdade querida por Deus. (cf. FC, nº 21)
O Santo Padre o Papa Francisco, partindo da lógica de Deus que sendo rico se fez pobre para nos enriquecer com a sua pobreza, deu-nos pistas de reflexão e ação para nos despojarmos de nós próprios e trilharmos “o caminho pessoal e comunitário de conversão”. Lembra-nos que somos chamados a ver as misérias dos irmãos, a tocá-las, a ocupar-nos delas e a trabalhar concretamente para as aliviar, enriquecendo a outros com a nossa pobreza. Mas, como ele diz, “a verdadeira pobreza dói: não seria válido um despojamento sem esta dimensão penitencial. Desconfio da esmola que não custa nem dói”.
Confiamos na criatividade das paróquias para estimularem a esta caminhada quaresmal em família, anunciando que a Renúncia Quaresmal deste ano será, dentro do contexto em que vivemos, para as famílias carenciadas da nossa Diocese de Portalegre-Castelo Branco, ficando à responsabilidade da Cáritas Diocesana o bom encaminhamento da mesma.

D.Antonino Eugénio Fernandes Dias
Bispo da Diocese de Portalegre-Castelo Branco
24/02/2014

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