domingo, 30 de março de 2014

Para dar, é preciso ter recebido antes




Nossa vocação é ser fontes, mas para isso precisamos buscar o poço que as alimenta


É difícil passar sede. É duro viver continuamente com sede. A sede do deserto. A sede da solidão. A sede do pecado, da angústia. Cristo, do alto da cruz, diz: “Tenho sede”. Mas a sede de Jesus é sede de amor, do nosso amor sincero. Ele tem sede de nós, que muitas vezes lhe fechamos a porta. Tem sede da nossa vida, que com frequência desperdiçamos.

O homem de hoje também tem muita sede. Sede de uma água pura, sede de verdade, de justiça, de amor, de paz. Sede de uma família na qual descansar, de um lar no qual enraizar-se. Sede de um Deus que acalme sua necessidade de infinito. Sede de perdão, de misericórdia, de uma mão que o socorra e o tire de sua dor. Sede de saúde, de vida plena, de alegria.

Muitas vezes, caminhamos com sede. Só quem tem sede deseja beber. Só quem experimentou a seca pode, cansado, suplicar por água. Às vezes, nem percebemos essa nossa sede: vivemos os dias automaticamente e não olhamos para o nosso interior.

A Quaresma é esse momento de deserto, de olhar para dentro de nós, de parar um pouco, de ver nossa sede, nossa inquietude. Tempo de pedir a Deus e ao próximo que nos dê de beber, que nos dê a água que nos falta.

É verdade que, se não sabemos de que temos sede, não podemos pedir nada. E se não conhecemos a sede do próximo, não podemos dar nada. Mas às vezes vivemos assim, cada um com a sua água, desconhecendo a água do outro, a sede do outro, a minha sede, a minha água.

Qual é a minha sede? Aquilo por que eu anseio, o que me inquieta, o que me acontece e não me deixa repousar, isso que me queima por dentro. E qual é a água que eu posso dar? Meus dons, qualidades, minha capacidade de amar.

E qual é a sede do meu próximo? Qual é a água que os outros têm e que me falta? Sei pedi-la?

Precisamos voltar aos poços dos quais é possível tirar água pura. Abbé Pierre disse: “Para que haja fontes no deserto, é preciso haver poços escondidos na montanha”. Da fonte mana a água que vem das profundezas do poço.

Nós temos a vocação de ser fontes, mas para isso precisamos buscar o poço que as alimenta, o poço do qual podemos tirar a água da qual necessitamos.

Segundo S. Alberto Magno, “existem três tipos de plenitude: a do vaso, que retém e não dá; a do canal, que dá e não retém; e a da fonte, que cria, retém e dá”. Queremos dar a água que recebemos, queremos nos abrir para que muitos possam beber. Não queremos ser como o vaso nem como o canal. Isso não nos basta. Nossa vocação é ser fontes.

Mas, para isso, o poço precisa ter água. Se a fonte está seca, é porque o poço também está. O poço precisa ser profundo, para que a água nunca se acabe. Para isso, precisamos votar sempre novamente a esses lugares nos quais podemos nos encher de água e de vida.

Quais são as fontes das quais bebemos? Como enchemos de água nosso próprio poço? Os lugares nos quais abastecemos nosso poço podem ser lugares santos, nos quais o coração vibra, se enamora, descansa e sonha.


Mas também podem ser pessoas santas que nos enchem de Deus, aquelas pessoas de cuja autenticidade e verdade podemos beber, nas quais podemos descansar. São lares nos quais somos o que temos de ser, sem medo de ser rejeitados.

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