sábado, 2 de setembro de 2023

E se a Igreja for um banquete?



“Amigos, quero ser claro convosco, que sois alérgicos à falsidade e às palavras vazias: na Igreja há espaço para todos. Para todos. Na Igreja, ninguém é de sobra. Nenhum está a mais. Há espaço para todos. Assim como somos. Todos. Jesus di-lo claramente. Quando manda os apóstolos chamar para o banquete daquele senhor que o preparara, diz: «Ide e trazei todos», jovens e idosos, sãos, doentes, justos e pecadores. Todos, todos, todos! Na Igreja, há lugar para todos. «Padre, mas para mim que sou um desgraçado, que sou uma desgraçada, também há lugar?» Há espaço para todos! Todos juntos… Peço a cada um que, na própria língua, repita comigo: «Todos, todos, todos». Não se ouve; outra vez! «Todos, todos, todos». E esta é a Igreja, a Mãe de todos. Há lugar para todos. O Senhor não aponta o dedo, mas abre os braços.”

Papa Francisco, Cerimónia de Acolhimento da JMJ 2023 (03/08/2023)

Estas palavras de Papa Francisco marcaram a cerimónia de acolhimento e toda a JMJ realizada em Portugal. Foram palavras simples, mas não simplistas que fizeram abanar tudo e todos. Foram palavras fortes e que não nos deveriam deixar na mesma. Ecoam hoje nos nossos pensamentos, ações, mas acima de tudo no nosso coração.

Mas antes de refletir convosco sobre este «Todos, todos, todos» gostava de olhar para o episódio bíblico que o Papa Francisco escolheu para introduzir a sua visão sobre a Igreja. Francisco recorda o momento em que Jesus conta aos seus discípulos a parábola do grande banquete. Não deixa de ser interessante que, para falar da Igreja, o Papa tenha referido um banquete, que tenha sentido vontade de falar sobre estar-se à volta da mesa. Bem sabemos que nós, cristãos católicos apostólicos romanos, temos, no centro da nossa fé, a Eucaristia: é à volta da mesa que recordamos a vida de Jesus e a nossa própria vida, é no Seu pão repartido que encontramos a nossa vida despedaçada e doada e no Seu vinho que recordamos a alegria de nos sabermos reerguidos. É ali, no banquete, na verdadeira mesa, que alimentamos a nossa fé. Acredito, profundamente, que esta foi uma escolha propositada para nos fazer recordar as primeiras comunidades cristãs, mas acima de tudo para nos relembrar que, não sendo dignos de participar em qualquer banquete organizado por Jesus, somos insistentemente convidados por Ele a entrar como somos. Somos convidados a deixar que a nossa vida seja erguida pelo Seu amor e pela Sua misericórdia.



Assim, olhando para a Igreja como um verdadeiro banquete organizado por Jesus, fica mais simples compreender o «Todos, todos, todos» que Francisco tão insistentemente repetiu. Se a Igreja é um banquete então passa a ser e a estar cheia de tudo e de todos. Passa a ser uma relação entre íntimos. Passa a ser um encontro, onde a alegria e a tristeza se cruzam. Passa a ser uma comunhão onde as dúvidas, os medos e a esperança se abraçam. Se a Igreja é um banquete então passa a não ter limites. Passa a não ter divisões. Passa a ser muito mais do que qualquer um de nós pode imaginar. Passa a ser muito mais divina, porque nela habita o concreto da humanidade.

Mas quem serão estes «Todos, todos, todos»? Que nomes e rostos surgem no nosso pensamento quando ecoam estas palavras no nosso coração? Que histórias e experiências reais dão forma a estas palavras? E o que estamos dispostos a fazer para que venham «Todos, todos, todos»? Conseguiremos aceitar, verdadeiramente, que todos se juntem à volta da mesa? Permitiremos que «Todos, todos, todos», na sua intimidade, na sua busca de espírito e verdade, possam saborear este pão e este vinho?

Na minha sensibilidade e na minha incapacidade de dar resposta a todas estas questões, fica muito difícil negar a presença de quem quer que seja à mesa do Pai. É claro que depois surge o «São todos, mas não se aceita tudo!». Não se trata de aceitar tudo, muito menos de medir quem tem mais ou menos dignidade, porque se assim fosse bem sabemos que nenhum de nós seria digno de fazer parte da Sua mesa. Trata-se, isso sim, de todos poderem provar este alimento, de todos poderem relacionar-se intimamente com este Jesus que um dia mudou as nossas vidas.

Deixemos ecoar estas palavras na nossa vida e na nossa oração para que o Espírito Santo nos vá concedendo algumas respostas…


Emanuel António Dias

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